General sem tropas

Foi-se o tempo em que um simples brado de Lula poderia provocar convulsão no país, tal o seu poder de levar multidões ao delírio. O velho general já não tem tropas para segui-lo até as últimas consequências, a não ser um punhado de militantes suficientes para lotar a quadra de um sindicato, e até criar brigas isoladas, confusão. Mas não para tomar as ruas.

Sua infantaria – CUT, MST, UNE – já não tem a mesma capacidade de combate de tempos outrora. Esvaziaram-se quando se amancebaram. E sua principal força blindada – o Partido dos Trabalhadores – mal resiste ao bombardeio da Operação Lava-Jato; encontra-se atolada no imenso lodaçal criado pelos próprios petistas.

Ao se pintar para a guerra, assumir o papel de cobra traiçoeira e convocar os seus a fazerem o mesmo, Lula realizou um movimento estratégico temerário.

A ameaça de colocar o país em chamas, quase à beira de uma “guerra civil” entre as “elites” e as “forças populares” tem tudo para ser uma nova batalha de Itararé.

Nem na Venezuela este tipo de bravata cola mais, que dirá no Brasil, um país muito mais complexo, com instituições mais consolidadas e economia bem mais diversificada.

Pode até haver escaramuças promovidas por grupos de assalto do lulopetismo, com vistas à intimidação dos brasileiros e para tentar levar a oposição à paralisia. Mas nada que faça de março uma onda vermelha.  O mais provável é um mar de verde, amarelo e azul nas principais cidades do país, no próximo dia 13.

O teatro de operações não é favorável nem à presidente Dilma Rousseff, nem ao projeto Lula -2018, uma miragem cada vez mais impossível.

Há uma contradição insanável entre o clamor das “bases populares” e a política econômica da presidente. Por mais que Lula pressione, Dilma não pode dar um cavalo de pau na economia para não perder, de vez, o quase nada que resta na sua condição de governabilidade. As contradições internas deste bloco de poder impede a capacidade de mobilização de sua própria base de apoio, algo que, de verdade, ela nunca teve.

A batalha pelas ruas ocorre, portanto, em condições extremamente adversas ao governo e ao lulopetismo. A recessão, o desemprego e a inflação fazem uma razia na vida dos brasileiros, espantam e afugentam os investidores. As águas da Lava-Jato se avolumam e não há como o governo reter a correnteza. O cidadão comum não está de bem com a vida. Ao contrário, está furioso com tudo isto e identifica, de forma cristalina, os responsáveis por seus tormentos.

Em vez de dar a ordem para avançar em uma situação adversa, o caudilho deveria ter protegido mais os seus flancos. Como não agiu assim, ele e Dilma podem ter supressas desagradáveis em outra frente: a convenção do PMDB.

Michel Temer e seus fiéis escudeiros recuaram para a segunda trincheira, de onde operam com discrição. Mas a tropa avançada dos peemedebistas rebeldes vai esticar a corda para a ruptura com o Palácio do Planalto. Não deve levar, mas o que pinta como resultado da convenção do dia 12 já está de bom tamanho. Para eles e para a oposição.

O PMDB não largará o osso, continuará com seus ministérios, mas se declarará independente. Há evidência maior do que essa de que o governo está derretendo?

As placas tectônicas se movem. A correlação de forças no Parlamento certamente não será a mesma, após a convenção dos peemedebistas. Há um movimento na direção do reencontro entre o grito das ruas e uma saída institucional, democrática.

Configura-se, assim, o pior dos cenários para o criador e a criatura. Aquele que qualquer estrategista digno do nome sempre procura evitar: ter de travar a luta em diversas frentes, simultaneamente.

Por aí a Alemanha perdeu a guerra.

Lula escolheu o mesmo caminho.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 9/3/2016. 

Um comentário para “General sem tropas”

  1. O Alquéres não explicou que um povo analfabeto é INCAPAZ de identificar “de forma cristalina, os responsáveis por seus tormentos”. Pois a Crise Mundial de 2008 foi cria de Reagan e Thatcher, com a maldita desregulamentação bancária e medidas neoliberais afins – com direito ao gasto estratosférico de US$ 1 tri no Iraque, que potencializou a dívida e o déficit norte-americanos.

    (ao mesmo tempo em que reclamam que o Brasil gasta demais com ministérios)

    O rombo mundial nos derivativos, na casa dos US$ 13 quatrilhões (cerca de mil vezes o PIB mundial), não foi gerado pela gastança petista, mas pela irresponsabilidade generalizada dos governos do G-7 e afins, o qual “hipoteca” o nosso futuro da pior forma (perdão pelo trocadilho, Noblat).

    Um povo amadurecido joga fora o discurso moralista (“a crise vem da corrupção”, etc.) e averigua os verdadeiros inimigos da humanidade: Wall Street, Morgan, Hitler, Rockefeller, Estálin.

    Ao Alquéres, peço maturidade nas opiniões.

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