Black ass

Em vez de apertar a mão a El Chapo, Sean Penn devia era dar beijos a Robert Trivers. El Chapo é barão da droga no México. Deixou-se seduzir por um filme sobre a sua vida e a polícia apanhou-o de mão na mão com Sean Penn. A vaidade tramou El Chapo.

Se Robert Trivers estivesse de mão na mão com Sean Penn, a polícia não o viria prender. Já o prendeu, quando Trivers alinhou a lâmina de um machado pelo pescoço de um de três gatunos que lhe assaltaram uma noite a casa.

Trivers é cientista, o expoente da biologia evolucionista. A posição em que, hoje, homem e mulher se encontram – e seja qual for a posição em que se encontrem – tem um dedo e a concepção de Trivers por trás (ou pela frente). Trivers meteu a biologia, e o irresistível impulso evolucionista dos nossos genes para a sobrevivência, nos nossos namoros românticos, nos nossos protestos de fidelidade, na sumarenta cama das nossas infidelidades. “É a biologia, coração!”, explicou Trivers. Os suecos deram-lhe o equivalente ao Nobel para a Biologia.

2007 Œrs Crafoordspristagare Robert Treivers.

O anti-romântico Sean Penn devia fazer-lhe um filme. Trivers não é um cientista insonso. Tem os punhos de ferro que os treinos de pugilismo lhe deram e levantou pelos colarinhos um cientista que não reconhecia ter mentido sobre os dados científicos num trabalho conjunto.

Bipolar, Trivers viveu uma depressão de caixão à cova. Jurou que se tivesse outra, se matava. Mudou depois de ideias: “Afinal não me mato! Se tiver outra depressão, mato é os dez tipos da lista que trago aqui no bolso”, disse a um cientista amigo. “Importas-te de acrescentar mais três nomes?” perguntou o amigo.

Trivers foi amigo do peito de Huey P. Newton, dirigente dos Black Panther, e foi membro do partido, de que foi expulso “para seu próprio bem”, nas palavras de Newton. A atracção de Trivers pelas causas negras não é só política. A pretexto de estudar o comportamento dos lagartos, foi inebriar-se com o aroma das mulheres jamaicanas. Casou-se com duas, de que teve cinco filhos. Na Jamaica, a comprar droga, chegou a ter duas pistolas apontadas à cabeça.

Trivers dizia a Newton que só tinha pena de não ser ele mesmo um “black ass”. Um cu preto, portanto. O Black Panther sossegou-o: “Até és, Trivers. Vistos de muito perto, todos os cus são pretos.”

Sean Penn tem de lhe fazer um filme. A bem da ciência.

Este artigo foi originalmente publicado no semanário português O Expresso.

manuel.s.phonseca@gmail.com

Manuel S. Fonseca escreve de acordo com a antiga ortografia.

 

2 Comentários para “Black ass”

  1. PINK ASS.
    Discordo de Newton, nem tudo é escuro, assiste o cor de rosa.
    Para ler os textos do Manuel, exige-me queimação de neurônios de meu pequeno estoque.
    O filme proposto remete ao livro The Folly of Fools (“A Loucura dos Loucos”) no qual Trevis oferece exemplos sobre a importância da mentira e o engano para a evolução da espécies.
    O filme, se produzido, poderia ter roteiro assinado por Manuel Fonseca e direção de Clint Eastwood substituindo Sean Penn.
    Ufa, comentários sobre os textos de Manuel exigem atenção, reflexão, inspiração e transpiração. No caso muita transpiração.

  2. Já me fez rir Miltinho. Mas este até é um texto simples: é só sobre a beleza do black ass que faz viajar um biólogo americano branco.
    Obrigado por comentar, amigo.

Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *