A São Silvestre de Temer

O presidente Michel Temer passa sebo nas canelas para correr sua meia maratona antes mesmo de os fundistas darem a largada na corrida mais tradicional do Brasil. O presidente reza para São Silvestre lhe dar fôlego para ultrapassar a barreira de chegada de uma prova muito mais de fundo: levar a transição em bons termos até 2018.

Temer corre contra o tempo em busca do capital estiolado tão rapidamente.

Quando assumiu o mandato, pintava ser o fator de estabilidade do país, contava com a torcida da multidão que vestiu o verde-amarelo e com a simpatia do mundo empresarial. Inegavelmente, sua equipe econômica transmitiu confiança e credibilidade ao mercado e aos investidores.

Hoje o governo já respira por meio de aparelhos e procura operar em duas frentes. De um lado, toma medidas no campo político para dar mais densidade ao seu time, com a atração do PSDB para o núcleo duro do Palácio do Planalto e, de outro, articula um minipacote de bondades econômicas.

A questão é saber o quanto essas duas medidas serão capazes de reverter expectativas negativas de um quadro em que a crise política afeta a economia e a recessão econômica gera desconfianças, incide sobre o humor da sociedade e agrava, portanto, a crise política. Eis aí o nó górdio de Temer.

A micropolítica, embora necessária, é insuficiente para debelar a crise. Medidas pontuais, como entregar uma Secretaria de Governo turbinada ao PSDB, podem ajudar a arejar o ambiente. Mas também podem turvá-lo. A dúvida hamletiana, se nomeia um tucano agora ou se deixa para quando o carnaval chegar, é mais lenha na fogueira da instabilidade.

A dificuldade é que o presidente e seus assessores são craques no jogo jogado no Congresso, mas são principiantes quando se trata de entender que a velha ordem está em estado terminal e em choque com o Estado moderno em construção ou com o novíssimo “partido das ruas e das redes sociais”.

Não basta apenas ter quem faça a interlocução com o Congresso. É preciso ter também quem faça a interlocução com as ruas.

Na lógica do jogo menor, a nomeação do deputado Antônio Imbassahy pode adicionar contratempos, como acirrar o cabo-de-guerra da disputa da presidência da Câmara. Ou ser entendida por segmentos do PSDB como uma opção preferencial de Michel Temer por Aécio Neves.

Na economia, para sair das cordas e reconstruir um ambiente favorável aos investimentos, o governo lançará um pacote microeconômico. Tudo bem, se não houver contraposição entre o micro e o macro, ou se não se abandonar o objetivo estratégico em nome de movimentos táticos. Se bem administradas, medidas de curto prazo podem contribuir para a superação do sufoco vivido pelos brasileiros. Se mal administradas, podem não surtir efeito e agravar o estado do paciente.

A mudança de ambiente virá mesmo se for obtido êxito nos fundamentos macroeconômicos. E esses começam a apontar para um cenário melhor. A excelente safra agrícola prevista para 2017 –  algo em torno de R$ 194 bilhões a ser injetado na economia, um salto de 36 bilhões na comparação com 2016 – diminui a pressão inflacionária, o que é essencial para uma queda consistente da taxa Selic.

Os juros devem cair não por pressão política, mas porque foram criadas as condições para tal. A mudança significativa de ares virá com a PEC do Teto, finalmente aprovada nesta terça-feira, com a tramitação rápida da reforma previdenciária e com o encaminhamento da reforma trabalhista.

Se a classe política quiser sobreviver ao terremoto, as negociações deveriam se dar à base dessa agenda.

O perigo é Temer adotar uma estratégia de corrida padrão Dilma. No desespero, a ex soberana a toda hora apelava para medidas microeconômicas desconexas e acreditava que arrodearia o toco da crise com a simples troca de ministros.

Como na epístola de Michel Temer para o Procurador Geral da República, a presidente acusava os “vazamentos seletivos de supostas delações premiadas” de prejudicarem a retomada do crescimento econômico, numa clara transferência de responsabilidades

O presidente não é, claro, nenhum Kibii Tergat para ganhar a São Silvestre cinco vezes. Mas pode concluir a sua meia maratona com gás suficiente para chegar a 2018. Conseguirá, porém, contornar o obstáculo Odebrecht?

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 14/12/2016. 

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