Ao votar contra as medidas que tentam conter o estouro de gastos públicos com o seguro-desemprego e o abono salarial, o PSDB faz igual ao PT sempre fez quando estava na oposição. Igualzinho. Igualinho que nem.
Fico envergonhado e indignado com isso.
Durante o governo Fernando Henrique Cardoso, o PT votou contra todas as medidas corretas – mudanças na Previdência, Lei de Responsabilidade Fiscal. Tudo, tudo.
Assim que Lula assumiu a presidência, enviou ao Congresso proposta de mudanças na Previdência bem parecida com a que o governo do PSDB havia defendido e contra a qual o PT votou. Perguntado sobre essa incoerência, o petista João Paulo Cunha respondeu com uma franqueza absoluta: é uma questão de “luta política”, disse ele.
Pois agora o PSDB fez igualinho que nem.
Ora. Uma coisa é denunciar que o PT mentiu na campanha eleitoral; lembrar que o PT passou toda a campanha dizendo que a economia brasileira estava indo bem, às mil maravilhas, e, no entanto, assim que Dilma Rousseff foi reeleita, o governo deu um cavalo de pau, uma mudança de 180 graus nos rumos da política econômica.
Uma coisa é denunciar que o PT está fazendo muito do que acusava a oposição de querer fazer, caso Aécio Neves fosse eleito.
Porque todos sabemos que, tivesse Aécio sido eleito, seu governo faria um ajuste fiscal. Muitíssimo provavelmente, faria um ajuste fiscal melhor do que este que o governo petista está tentando fazer; certamente cortaria despesas de forma mais inteligente e eficaz, reduziria o ministério inchadérrimo, cortaria a quantidade absurda de cargos em comissão criados para dar empregos a rodo à companheirada.
Mas faria, é claro, um ajuste fiscal – porque não há outro jeito. Porque, depois da farra do primeiro governo Dilma, dos desajustes todos provocados na economia por uma mistura azeda, podre, de populismo, voluntarismo e simples incompetência, das pedaladas fiscais, dos preços administrados segurados a fórceps, não há outra coisa a fazer senão um ajuste fiscal.
Então, uma coisa é denunciar que o governo mentiu, que o PT mentiu, que a campanha de Dilma mentiu, que Dilma mentiu.
Outra, completamente diferente, é votar contra o ajuste fiscal. Contra duas medidas provisórias que não retiram direitos dos trabalhadores coisa alguma – apenas tentam botar alguma ordem na baderna que vinha sendo o abuso do seguro-desemprego e do abono salarial.
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A despesa do governo federal com seguro-desemprego e abono salarial passou de 0,49% do PIB em 2004 para 0,98% em 2014. Em números, subiu de R$ 9,5 bilhões para R$ 53,8 bilhões.
Repetindo, insistindo: as duas MPs votadas esta semana pela Câmara dos Deputados não acabam com direitos trabalhistas – apenas tentam botar ordem na casa da mãe Joana. Antes, quem trabalhasse meros 6 meses e perdesse o emprego já tinha direito a receber o seguro-desemprego. O Ministério da Fazenda queria ampliar o prazo de carência para o primeiro período de 6 para 18 meses; recuou para 12 meses.
O abono salarial era pago para quem trabalhasse pelo menos 30 dias no período de um ano, recebendo até 2 salários mínimos. O Ministério da Fazenda queria ampliar para 6 meses corridos; depois recuou para um vínculo forma de trabalho de no mínimo 3 meses.
Ou seja: é besteira dizer que essas medidas provisórias extinguem direitos trabalhistas, retiram direitos dos trabalhadores. Isso é balela, é idiotice, é chavão de sindicalista pouco afeito à verdade dos fatos.
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Todos os 51 deputados do PSDB votaram contra essas medidas de ajuste fiscal.
Fizeram exatamente igual ao PT sempre fez na oposição.
Tornaram-se, portanto, incoerentes como os petistas. Pouco sérios como os petistas. Mais interessados na disputa pelo poder do que pelo que importa para o país.
Entre uma jogada política e o respeito ao que deve ser melhor para o país, escolheram a via do mensaleiro de Osasco. É a “luta política”.
Essa coisa me incomodou profundamente.
Não sou filiado, mas sempre fui (e jamais escondi isso, muito ao contrário) simpatizante e eleitor do PSDB. Desde 1989 – as primeiras eleições disputadas pelo então novo partido – voto no PSDB, apesar de todos os problemas que há nele.
Não é nada agradável ver o partido em que você vota há uma penca grande de anos agir exatamente da mesma forma que o partido que é o oposto dele.
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O Estadão desta sexta-feira, dia 8, trouxe dois bons textos exatamente sobre este tema – o principal editorial e a coluna de Celso Ming.
Aí vão trechos – primeiro, do editorial:
“Só mesmo a falta de amadurecimento político consegue explicar a incoerência de haver hoje no Brasil um partido que foi eleito para ser governo – o PT –, mas prefere, por conveniências eleitorais colocadas acima do interesse público, agir como oposição; e uma oposição, representada pelo PSDB, que deixa de lado seus princípios programáticos para, pelas mesmíssimas razões, tentar provocar um pouco efetivo desgaste no governo. Esse é o enredo da novela da tramitação no Congresso das medidas propostas pelo Planalto para promover o necessário ajuste fiscal.
“É claro que fazer oposição implica necessariamente explorar as fragilidades do governo. Mas há duas maneiras óbvias de fazer oposição: a responsável e a irresponsável. A oposição é responsável quando capaz de estabelecer, nas situações-limite, o equilíbrio entre seus legítimos interesses partidários e o bem comum – ou o interesse público. No caso do ajuste fiscal, é óbvio que as medidas propostas pelo governo – que significam a admissão de graves erros que cometeu –, embora impopulares, são indispensáveis para o saneamento das contas públicas. E o próprio PSDB, se tivesse vencido a eleição presidencial, estaria hoje propondo ao Congresso providências semelhantes. Assim, sob qualquer ponto de vista, tais medidas correspondem ao interesse público.
“Ao fazer oposição intransigente ao ajuste fiscal proposto pelo Planalto, os tucanos se comportam exatamente como lamentavelmente faziam os petistas antes de chegar ao poder. Na oposição, o PT opôs-se irresponsavelmente à Constituição de 1988, ao Plano Real, à Lei de Responsabilidade Fiscal, às privatizações – inclusive aquelas que colocaram ao alcance da maioria esmagadora dos brasileiros serviços públicos de alguma qualidade. Como não se apresentou ao País um projeto alternativo de ajuste fiscal, o PSDB faria muito melhor figura na atual cena política se tivesse a coerência de se comportar, em relação ao ajuste fiscal, do mesmo modo que faria se fosse governo.”
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Eis aqui trechos do artigo desta sexta-feira, 8, de Celso Ming:
“Desta vez, a atitude oportunista e demagógica foi assumida por boa parte da oposição, especialmente pelo PSDB, que votou contra, ou seja, na contramão de sua pregação política e das bandeiras expostas ao longo de sua campanha eleitoral.
“Até agora, os tucanos vinham criticando o PT pela condução desastrada das contas públicas, no que têm razão, e pela falta de empenho na política de ajuste. Eis que, na hora de decidir pela distribuição de contas para a sociedade, o PSDB fechou questão contra as primeiras medidas da correção de rumos.
“Mostrou que está pouco focado no interesse público e, ao contrário do que espalha, não põe o empenho que lhe cabe no cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal que ajudou a aprovar. Quer mais é ver o governo e o PT sangrando, como já disse o senador paulista Aloysio Nunes Ferreira, do que a economia consertada. E nisso não se comporta de maneira diferente do que se comportou o PT, seu principal alvo de críticas, que também rechaçou os programas de ajuste do governo Fernando Henrique. Quem é que vai agora acreditar na sinceridade dos tucanos quando voltarem a recomendar o equilíbrio das contas públicas?
“Paradoxalmente, outros políticos da base do governo tiveram de lembrar ao PT que eles são governo e não oposição. Trabalho consistente foi desta vez feito pelo líder do PMDB na Câmara, deputado Leonardo Picciani (RJ). Ele enquadrou os deputados do PT, que relutavam em assumir os ônus da política fiscal e não tiveram para isso o apoio do ex-presidente Lula, que se omitiu também oportunisticamente, porque pretendeu parecer favorável às posições de curto prazo dos sindicatos.
“Esta é uma postura equivocada porque o único objetivo da operação que visa ao reequilíbrio das contas públicas é garantir de maneira sustentável a retomada do crescimento econômico, a recuperação do emprego e do poder aquisitivo do assalariado, queimado pela inflação. Desse ponto de vista, votar contra o ajuste é votar contra os interesses mais importantes do trabalhador.”
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O editorial do Estadão e o artigo de Celso Ming no jornalão põem todos os devidos pingos nos is. Mesmo sabendo que seria chover no molhado, quis registrar aqui minha indignação.
É uma imensa tristeza ver o partido em que você vota fazendo o mesmo triste papel que sempre condenou no adversário.
8/5/2015
Foi interessante ver a relutância dos petistas quando têm que parar de jogar para a platéia, parar de fazer demagogia e votar com seriedade. O governo fala agora em represálias contra os outros partidos da base aliada que permitiram muitos votos contrários. Porém, alguns petistas não suportaram a pressão e se ausentaram da votação, enquanto o DEM votou em bloco a favor. Concordo que o PSDB deveria ter mantido a coerência com o seu programa. Mas foi impagável assistir o desconforto dos petistas, vendo, impotentes, o seu tradicional populismo sendo utilizado agora pelo PSDB.
Entendo a indignação exposta, como uma fratura, no texto do SerVaz, assim me senti quando LULA se reuniu com FHC e após emitiu a famosa ‘carta aos brasileiros’. Aquela histórica carta igualou os partidos oponentes e garantiu que os interesses privados se sobrepusessem aos interesses públicos. A incoerência dos partidos, ora de um, ora de outro mostra que os trabalhadores continuarão sustentando com seu trabalho e impostos um congresso de deputados milicianos, governadores truculentos e presidentes omissos e reféns de alianças que lhes garantam a sustentabilidade. Enfim a NOSSA indignação se resume a aceitar passivamente o ajuste fiscal, a redução de direitos sociais duramente conquistados mesmo por conta do populismo.
Mais triste ainda e ver que alguns se alegram com a derrota do adversário político, mesmo a custa de sacrifícios da classe trabalhadora, aquela que garante o PIB e os impostos que irão, em última análise, garantir o faturamento dos empreiteiros e a comissão dos meritórios funcionários de carreira transformados em delatores que garantem espaço na mídia golpista para a demagogia de juristas pagos com os impostos arrecadados. Assistir ao desconforto dos petistas foi impagável! Mas, triste, triste mesmo, e verificar que o interesse público continuará sendo reduzida a briga dos interesses privados dos partidos conduzidos por caciques politiqueiros.
Não sou favorável ao capitalismo, à sociedade o consumo desvairado e devastador do mundo em que vivemos, porém entendo que o capitalismo pode ser mais bem utilizado em favor do interesse público em detrimento do interesse privado. Uma melhor distribuição do capital se faz necessária, não só no Brasil, mas no mundo. Aqui as desigualdades são mais profundas, carecem que a arrecadação dos impostos sejam corretamente empregados em transporte, saúde e educação. Isto bastaria para o contentamento da classe trabalhadora, que hoje se satisfaz com cerveja e futebol. Bom lembrar que os paneleiros gourmets são aqueles que possuem passaportes e que gastam a poupança no exterior e que os que os sustentam são os trabalhadores que formam o PIB. PIB que de 2004 a 2014 elevou-se de 1,938 TRILHOES DE REAIS PARA 5,489 TRILHOES DE REAIS considerando-se verdadeiros os dados fornecidos pelo texto em relação aos gastos com o seguro desemprego, esmola petista e que os tucanos querem restringir para a garantia do lucro das empreiteiras, dos bancos, dos barões da mídia, da indústria automobilística predatória, dos fabricantes de pesticidas, fortalecimento dos cartéis de produtores e distribuidores de narcóticos e seus dependentes.
A votação das medidas de austeridade econômica é castigo aos miseráveis brasileiros e satisfação das classes dominantes, que hoje batem panelas contra um governo petista e sonham com a volta dos tucanos. No fundo conforme o texto demonstra farta e coerentemente, tudo se resume em mesma merda partidária.
Marina neles…vamos caminhar vovô.