Tomando todas

Nada como chegar à velhice para experimentar novas emoções. Não vou mais a bar, são raros os encontros com os amigos, mas estou tomando todas.

Logo cedo são duas branquinhas e uma colorida. Ao almoço, uma grande, cinzenta. À tarde, duas coloridas, e à noite uma compridinha cor de rosa. Com isso, estabilizo a pressão arterial, cuido do coração, previno problemas renais, etc., etc..

A fidelidade ao receituário, no entanto, não bastou para satisfazer meus médicos. O geriatra quer que eu vá à academia de ginástica do meu prédio. Ora, doutor, pondero; não posso chegar e ir levantando ferro. E se o esforço estoura meu coração?

Sabem o que disse? Contrate um personal trainer. Olha aqui, seu palerma, pensei. Mas disse: doutor, sou um brasileiro aposentado, não posso me dar ao luxo.

Se estivéssemos em Londres, ou em Tóquio, eu não teria que gastar uma fortuna com plano de saúde (último aumento do meu, quase 10%) e remédios. O governo devolveria parte dos impostos que paguei em décadas de trabalho, com atendimento à saúde de boa qualidade, e fornecimento dos medicamentos.

(Uma cunhada dekassegui, que foi e ficou, aposentou-se recentemente. Como pagava aluguel, recebeu um apartamento para viver até o último dia de sua vida.)

É verdade que a comparação com nações desenvolvidas não é inteiramente justa. Vivemos em um país colossal, populoso, com graves problemas, até quatro anos atrás em desenvolvimento (sobre hoje, evito comentar que a pressão sobe).

Para acalmar o médico, disse-lhe que ia com frequência a pé à padaria, quatro bons quarteirões. Não gostou. Vai comprar o que?, perguntou apontando um dedo. Ora, legumes é que não haveria de ser. E do pão não abro mão!

Pentelho!

Agosto de 2015

7 Comentários para “Tomando todas”

  1. Tomar todas, na melhor idade, significa todas as pílulas, coloridas, redondas, compridinhas, e aguardar os efeitos colaterais. Ler as bulas é deprimente.

  2. Miltinho, você sacou bem. Em vez de ler Rubem Fonseca, estou lendo bula de remédio. Está certo que me dedico também aos jornais, mas para isso, diante do teor das notícias, é bom tomar um calmantezinho. E toca ler a bula.

  3. Em vez de bulas, melhor seria ler rótulos das novas e boas cervejas, pelo menos esqueceriamos as notícias dos jornais e revistas, a Veja notíciava a fortuna na Suiça do senador Romário. Não sabemos quem mente mais, jornais ou bulas,jornalistas ou médicos. Nos dois casos deve-se preservar as fontes.

  4. Miltinho, fiquei maravilhado, mesmerizado mesmo, ao ler o começo da sua mensagem! Enfim, um comentário do Miltinho bem humorado, pra cima: “Em vez de bulas, melhor seria ler rótulos das novas e boas cervejas”.
    Corri para a cozinha e peguei mais uma geladíssima para comemorar.
    Mas – nada é perfeito! – vejo que logo em seguida você volta com seu petismo que você diz que é ex, mas não é ex coisa nenhuma. Você é o petista mais petista da história. Você é a Velhinha de Taubaté do PT! Você é o último cara a acreditar no PT!
    E vem com esse papo petista anti-Veja. Pô, Miltinho, a Veja errou – e no número seguinte pediu desculpas aos leitores pelo erro.
    O PT cometeu 200 bilhões de erros muito mais graves nos últimos 12 anos e meio, e jamais pediu desculpas.
    Deixe de ser petista, ô Velhinha de Taubaté!
    Grande abraço.
    Sérgio

  5. Miltinho, já no caso do Lula, ele rotula bem. Trocou o da garrafa de outros tempos, onde se via o número 51, para o de hoje, com registros como Romanée-Conti 1997.

  6. Só parte da classe operária atingiu o paraíso. Eu nunca tomei um troço destes, seria rótulo de conhaque?
    VALDIR tá na hora dos meus DIAMICRON MRG0, TRAYENTA DUO 2,5 CITONEURIN 5000, AAS PROTECT, VELLHA60MG, CILOSTAZOL e CLINFAR 40mg.
    Tudo acompanhado de um copo de cerveja, de qualquer rótulo, bem gelada!

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