Gastam-se bilhões, cortam-se centavos

O Planalto nega. Talvez não aconteça. Mas parece que após conseguir adiar a votação do novo indicador da dívida dos estados – a primeira vitória de Dilma Rousseff no Congresso depois de reempossada -, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, aventura-se a falar em cortes.

De custeio, de cargos e de ministérios, parte dos 39 que, na campanha, Dilma insistiu em dizer que não pesam nas contas públicas.

Ainda que mais uma vez o governo fique a reboque do PMDB, autor da ideia de reduzir para 20 o número de pastas, Levy admite uma reforma administrativa e o enxugamento na máquina, mesmo que seja apenas pelo caráter simbólico.

Símbolo para lá de necessário. Especialmente quando se pretende aprovar uma proposta de ajuste fiscal que, mesmo imprescindível, joga a conta inteira sobre os ombros dos pagadores de impostos.

Se feita com rigor, pode ser mais do que uma simples alegoria.

Exemplos recentes nos mostram isso. Em 1995, frente a um Estado falido, o então governador Mario Covas renegociou dívidas com terceiros, extinguiu quase três mil cargos de livre nomeação e cortou um terço da execução orçamentária. Quitou dívidas e obteve R$ 2,2 bilhões de economia para os cofres paulistas em menos de seis meses.

Sob a égide do petismo, faz-se o inverso. Os gastos só aumentam ano a ano.

Nada menos de 4,5 mil cargos de livre provimento foram criados nos 12 anos de governo do PT. E, ainda que boa parte seja atribuída a funcionários concursados, engordou-se a folha. E muito.

De acordo com o Boletim Estatístico de Pessoal e Informações Organizacionais do Ministério do Planejamento, o número de servidores da União saltou de 485,7 mil em 2002, último ano de Fernando Henrique Cardoso, para 613,6 mil em 2014.

Nas autarquias e fundações, onde é mais fácil alocar cupinchas, a proporção é ainda mais estarrecedora. Em 2002, o custo de pessoal nas autarquias era de R$ 13 bilhões e de R$ 4,2 bilhões nas fundações. Mais do que triplicaram: foram, respectivamente, para R$ 48 bilhões e R$ 14,9 bilhões.

Traduzindo em reais, a folha Dilma (servidores civis e militares) bateu em R$ 185,8 bilhões em 2014, R$ 126,3 bilhões a mais do que os R$ 59,5 bilhões de 2002.

Mais grave: os gastos maiores e crescentes estão entre os servidores ativos e não com aposentados e pensionistas, como poderia se imaginar. Ou seja: trata-se de multiplicação exponencial da máquina sem que isso se reverta em serviços ao cidadão.

A um governo e uma presidente rejeitada por 64% dos brasileiros, não bastarão gestos tímidos como a retirada do privilégio de aviões da FAB para o ir e vir de ministros aos seus lares. Ou a fala de Levy sobre uma futura e incerta reforma administrativa.

O país que foi às ruas em 15 de março e que se prepara para reocupá-las no próximo domingo quer muito mais do que símbolos.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 5/4/2015. 

3 Comentários para “Gastam-se bilhões, cortam-se centavos”

  1. O crescimento da máquina, que poderia ser feito de modo mais palatável, tornou-se algo lamentável. Mas…

    Eu não me limito a ficar lendo o Noblat ou o Vaia. Busco outras fontes, tais como o Carta Capital:

    [http://www.cartacapital.com.br/revista/920/temer-a-pec-241-e-a-entrega-irrestrita-ao-neoliberalismo]

    “O próprio Fundo Monetário Internacional (FMI) chegou a uma conclusão parecida recentemente. Em maio, três economistas da instituição publicaram um artigo dizendo que políticas neoliberais podem gerar efeitos nocivos para a economia de países em desenvolvimento. Por exemplo, aumentar a desigualdade.

    Ao falar em neoliberalismo, o FMI refere-se às medidas de austeridade. “Os benefícios de algumas políticas que são uma parte importante da agenda neoliberal parecem ter sido um pouco exagerados. Em vez de gerar crescimento, algumas políticas neoliberais aumentaram a desigualdade, colocando em risco uma expansão duradoura”, confessa o Fundo.”

    A verdade, senhores, é a de que aqueles que se animam com a “austeridade” são aqueles que ficam sentados num escritório luxuoso em Pinheiros ou Ipanema, analisando mil gráficos, e que nunca viram um esgoto a céu aberto.

  2. Sobre a PEC 241 (do “controle” de gastos): “A proposta é tão anormal que nenhum economista ou professor universitário com credibilidade se atreveu a defendê-la”, ironizou, em discurso no Plenário, o senador Roberto Requião (PMDB-PR).

    No projeto de LDO de 2017, a pedido do Temer, foram retirados os termos que comprometiam a administração pública federal a assegurar “distribuição de renda”, o “fortalecimento dos programas sociais”, bem como a execução de “políticas sociais redistributivas”.

    Eu não sei como o pessoal do “50anosdetextos” reage a isto. Talvez chamem de “arrumar a casa destruída por 13 anos de desgoverno”.

    Eu chamo isto de governo antipopular, mesmo.

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