Custou muito ao país a conquista de um sistema nacional de controle das contas públicas, com um mínimo de credibilidade.
Saímos do regime militar com uma herança maldita: a enorme bagunça nas contas.
Naquele período chegamos a ter três orçamentos, o fiscal, o monetário e o das estatais. E, pasmem, gastos do governo que não entravam em nenhuma contabilidade eram chamados de Operações Extra-orçamento e Operações Sem Limite de Orçamento.
Se o governo quisesse realizar uma grande obra ou um novo programa, era a coisa mais fácil do mundo. Bastava rubricar “recursos a definir”.
Existia ainda outro monstrengo, a conta-movimento. Era uma conta conjunta do Banco do Brasil e do Banco Central através da qual se financiava a gastança pública e de setores privados acostumados a mamar nas tetas do Estado.
Com a redemocratização, passo a passo as contas foram sendo reorganizadas e modernizadas; uma obra de vários governos. Deu-se credibilidade e substância ao Orçamento da União e à LDO, criou-se a Secretaria do Tesouro e foi enterrada a famigerada conta-movimento do Banco do Brasil, assim como se impôs disciplina ou foram privatizados a maioria dos bancos estaduais.
O coroamento desse processo veio com a Lei da Responsabilidade Fiscal que, ao lado de outros fundamentos – superávit primário e meta inflacionária -, foi essencial para a estabilização da economia.
Pois bem, essa engenharia vem sendo desconstruída nos seis últimos anos, particularmente no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff.
Em seu lugar, surgiu a irresponsabilidade fiscal, a falta de credibilidade das contas públicas.
Parecer unânime do Tribunal de Contas da União informou a nação que o governo infringiu a Lei da Responsabilidade Fiscal, através das já famosas “pedaladas” no ano de 2014.
Em qualquer país minimamente sério, o governo estaria dando satisfações à sociedade e ao Parlamento.
Mas o Planalto, em vez de se explicar, negaceia. Cria uma cortina de fumaça ao repetir a cansativa cantilena de que é mais uma conspiração da oposição.
Não estamos diante de um fato isolado. A irresponsabilidade – fiscal e gerencial – tem sido uma constante na gestão Dilma.
Já tivemos vários lances de “contabilidade criativa” e se o Congresso não alterasse, na bacia das almas e por estímulo do executivo, a LDO de 2014, o enquadramento da presidente na lei de Responsabilidade Fiscal seria inevitável.
Mesmo com a boca torta, o governo Dilma não largou o cachimbo.
Arrisca-se a pagar um preço alto pelo vício.
Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 22/4/2015.
Sobre a PEC 241 (PEC do Retrocesso Social):
“Caso houvesse mesmo um consenso para se buscar o ajuste sem recorrer ao aumento de impostos, a redução de despesa orçamentária com juros deveria ser a primeira opção de qualquer formulador de política econômica que operasse com um mínimo de racionalidade.
Mas aí deveríamos estar frente a um formulador e líder de equipe econômica que não fosse um representante do sistema financeiro. Também deveríamos estar frente a uma equipe que estivesse preocupada em preservar as conquistas democráticas e cidadãs da Constituição de 1988.”
[http://www.cartacapital.com.br/politica/congelamento-de-gastos-e-retrocesso-social]
Se o Brasil der atenção apenas à “atração de investimentos” e não ao ser humano, talvez as nossas crianças comecem a morrer em maior número. E, além das inversões estrangeiras, será preciso atrair crianças também, dos países vizinhos, para equilibrar a demografia.