A Praia do Rosa é um lugar muito, muito especial. De cara, assim que cheguei, que dei as primeiras olhadas, me lembrei de lugares muito especiais como Visconde de Mauá, Praia do Forte, Trancoso de algum tempo atrás, Tiradentes.
Coisa fina. Finíssima.
Meu cunhado Márcio riu da definição, mas a Praia do Rosa, exatamente como esses outros quatro lugares que citei, é coisa de bicho-grilo chique.
Tem essa saudável, salutar, agradabilíssima mistura de um certo quê de contracultura, de sociedade alternativa, de malucos-beleza, com conforto, alguma sofisticação, boa culinária – e, como é Sul, também com uma visível e sempre bem-vinda preocupação com a preservação do ambiente, o auto-sustentável.
Coisa de bicho-grilo chique e verde – pero sin exageración, no?
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O visual é acachapante. É uma pequena baía, uma enseada, cercada, nos dois lados, por pequenos istmos montanhosos.
Tudo bem, isso aí os 8 mil quilômetros de litoral brasileiro têm às pencas. A questão é que, bem no meio da praia, há uma lagoa belíssima, toda cercada por vegetação nativa, abundante, de um verde luxuriante. E a praia, a pequena enseada, é rodeada por um morro côncavo. O morro abraça a lagoa e a enseada lá embaixo.
E, como ali é Santa Catarina, e não o Guarujá, os camaradas – gaúchos, mineiros, paranaenses, catarinenses – que foram para lá criar os hotéis, pousadas, restaurantes, lojas, tiveram a inteligência, o bom senso de impedir construções altas.
Da praia, se você fica de costas para o mar e olha para o morro que abraça a lagoa e a enseada, vê basicamente o verde. Sim, claro, vê as construções, casas, hotéis – mas nada agressivo, nada que tolde a paisagem.
Você vê um morro verde.
Ah, sim, e os istmos que delimitam a praia, ao Norte e ao Sul, são tombados. Neles ou juntos deles não se poderá construir nada – muito menos aquelas absurdas torres que nas duas ou três últimas décadas arrasaram com o visual dos morros ao Sul da Praia da Enseada do Guarujá.
A Praia do Rosa é assim uma espécie de Visconde de Mauá, de Praia do Forte, de Tiradentes, de Trancoso de algum tempo atrás – bem cuidada e preservada como Juquehy, a praia que talvez seja a mais bela de São Sebastião, o município paulista de dezenas de praias lindas. Exatamente como a comunidade endinheirada de Juquehy, a da Praia do Rosa conseguiu a maravilha que é não permitir a construção de nada de mais de dois andares.
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Para localizar: a Praia do Rosa fica a 90 quilômetros de Florianópolis, no Litoral Sul de de Santa Catarina. Chega-se a ela saindo de Floripa pela BR-101, num trecho pedagiado e portanto bastante bom, todo em boas pista duplas (com a única exceção de um pequeno trecho de serra onde há umas 4 ou 5 famílias de índios que, “protegidas” por umas 17 ONGs, impediram obras no local).
Passa-se, de Floripa até lá, pelos municípios de São José, Palhoça, Pedro não me lembro das quantas e Garopaba. A Praia do Rosa pertence ao município que fica ao Sul de Garopaba, Imbituba.
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O lugar tem um número incrível de bons hotéis e/ou pousadas, restaurantes e lojas.
Várias lojas vendem produtos de Báli. Há ali uma fantástica, estranha, impensável conexão Santa Catarina-Indonésia. Troço mais esquisito.
A mais recente edição do Guia 4 Rodas Santa Catarina traz, ocupando toda a sua página 4, ao lado da Carta ao Leitor, uma foto da Praia do Rosa. O guia se divide em quatro grandes seções – Florianópolis, Litoral Sul, Litoral Norte e Interior. Na seção Litoral Sul, há um capítulo para Garopaba e outro para Imbituba, o município em que se localiza a Praia do Rosa. Mas há um capítulo específico para a Praia do Rosa.
Mais ou menos algo assim como, à parte da cidade de São Paulo, houvesse um capítulo específico sobre a Vila Madalena.
Diz o Guia 4 Rodas Santa Catarina:
“A preservação da natureza dá charme especial a esta praia. A maioria das pousadas segue práticas sustentáveis (muitas ficam em terreno com mata nativa). O centrinho pode ser explorado a pé, e várias trilhas desembocam na areia. Só há dois acessos para carros, o Rosa Norte e o Rosa Sul, ambos lotados no verão. No inverno, chegam as baleias-francas, que podem ser vistas da praia ou em passeios de barco. Traga dinheiro: não há agências bancárias.”
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De fato: não vi um único caixa automático no lugar. Mas loja, pousada e restaurante, há de montão. No Guia 4 Rodas Santa Catarina são apresentados mais de 20 hotéis/pousadas. Restaurantes, são listados e descritos oito – mas há uma baita infinidade.
Isso é o Guia 4 Rodas, essa veneranda instituição com base em São Paulo que há muitas décadas acompanha viajantes do país inteiro. Um guia turístico catarinense, da editora Letras Brasileiras, chamado Encantos do Sul, traz na capa – o que, senão uma foto da Praia do Rosa? Nela se vê a lagoa, o mar, a montanha que fica ao Sul da praia.
Os catarinenses sabem fazer marketing deles mesmos. Nisso, são tão competentes quanto o PT – com a diferença imensa, é claro, de que eles marqueteiam verdades, enquanto o outro vende sonhos, ilusões, mas chega por aqui de falar em tais recordações, retratos do mal em si.
Quem chega a uma das dezenas e dezenas de hotéis/pousadas da Praia do Rosa é presentado com três publicações: o tal do Encantos do Sul, que tem o mesmo tamanho do Guia 4 Rodas, e mais o Guia do Rosa & Ibiraquera 2014 e a revista Rosa Shock, ambos do mesmo tamanho, um formato grande, maior que as revistas standards – 30 de altura por 21 de largura. São publicações gordas, em papel grosso, caro, fartamente ilustradas, fartissimamente cheias de publicidade.
(Me ocorre aqui que se Gustavo Cubas, o cubano doidão e salafrário que criou a revista Afinal em 1984, tivesse como diretor comercial algum desses barriga-verdes que trabalham para as publicações sobre a Praia do Rosa, eu talvez ainda estivesse editando Cultura na próspera e feliz revista semanal de informação & reportagens imaginada por Fernando Mitre.)
A revista Rosa Shock, edição 2014, tem todo o jeitão de coisa profissa, séria. O oposto de publicação de lugar pequeno, acanhado, provinciano. No editorial – bem escrito –, se diz: “Principalmente devido ao trabalho do Núcleo de Turismo Sustentável, que reúne 33 empresas entre pousadas e restaurantes, a praia hoje está mais limpa, mais sinalizada, segura e preparada para bem receber um turismo de nível internacional.”
E conclui:
“O resultado é que hoje a Praia do Rosa integra o seleto time das praias diferenciadas do litoral brasileiro, como Praia do Forte, Pipa e Jericoacara, que reúnem beleza natural, infra-estrutura turística seleta e cuidados com a preservação ambiental”.
Não conheço Jericoacara nem Pipa – fui dotado de bolas de ferro atadas ao meu tornozelo, que nem os presos de alguns lugares no início do século passado, e então viajo bem menos do que Mary gostaria. Mas os deuses baianos me levaram muitas, muitas vezes à Praia do Forte, assim como também à Trancoso antiga, e então, ao ler o editorial da revista, senti que estava certo ao perceber, desde logo, de cara, que aquele lugar faz lembrar de fato a Praia do Forte – e mais aqueles outros lugares mágicos que citei na abertura deste texto, Visconde de Mauá, Tiradentes.
Tudo lugar de bicho-grilo chique e um tanto verde.
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Passei pouquíssimo tempo nesse lugar abençoado por Deus e bonito por natureza – ridículos cinco dias. E estava com o Modo Descanso ligado: não fui atrás de informações, de descobertas, de muito conhecer. Bem ao contrário. Chegamos num sábado – e, ao olhar bem do alto, do deck do hotel, a vista extraordinária, estupenda, que se tem da praia, da lagoa e do verdume absurdo, não consegui deixar de exclamar algo do tipo: “Maravilha. É tudo de eu gosto: a praia lá embaixo e eu aqui em cima”.
No domingo, fiz minha primeira e única excursão até a praia propriamente dita. Do lugar em que ficamos, o Solar do Mirador, bem no meio do morro côncavo que abraça a enseada, até a praia, há uma trilha baita íngreme, de uns 150 metros, que termina exatamente na lagoa redondinha e linda. Há ali um pequeno trapiche, de onde os hóspedes são levados em uma canoinha, um pequetito, minúsculo barquinho, até a outra extremidade da lagoa, a uns 30 metros do marzão besta.
Não me sinto propriamente à vontade em minúsculo barquinho, mesmo que dentro de minúscula lagoa. Quando a porcaria do barquinho adernava para a esquerda ou para a direita, sentia falta da sensação dos pés tocando no chão. Sou Capricórnio, bicho que precisa ter terra embaixo dos pés.
Mary ainda me provocou, dizendo que eu estava com medo. Claro que eu estava com um pouquinho de medo, mas neguei, disse que na verdade medo eu tive foi quando, numa outra visita a Santa Catarina, muitos, muitos anos atrás, quando Fêzinha era ainda adolescente, pegamos um barquinho desses de motorzinho póc-póc-póc no extremo Sul da ilha e fomos até aquela praia do outro lado da ilha, a primeira diante do mar aberto no extremo Sul, à qual só se chega ou por uma maluca trilha montanha acima montanha abaixo ou então por aqueles barquinhos de motorzinho póc-póc-póc
Na verdade, o maior medo que já tive na vida nesses barquinhos minúsculos movidos a motorzinho a vapor foi, em uma outra encadernação, quando, creio que na nossa primeira visita a Porto Seguro (ou terá sido a segunda?), ainda nos anos 70, Regina e eu fomos até os tais arrecifes de fora.
No meio da viagem, o tempo fechou, começou uma chuvinha danada de fria – e os tais arrecifes de fora ficam muito, muito longe da terra firme. Isso aconteceu de fato em outra encadernação, eu sequer tinha feito 30 anos, mas foi um dos maiores medos que passei na vida. Lembro dele até hoje.
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A viagem de barquinho pela lagoa até a Praia do Rosa propriamente dita dura uns cinco minutos, e não há nela perigo algum. Até porque o barqueiro do hotel navega juntinho à margem, e, se por um absurdo acaso a canoa virasse, nem sequer seria preciso nadar até a terra firme. Bastaria ficar de pé.
Uma faixa de areia de uns 30 metros separa a lagoa do mar. E, ao lado dela, há um canal que liga as duas águas, quando a maré está alta.
A praia é limpíssima (há cestos de lixo a cada 20 metros), a água, límpida, cristalina.
E, diante do mar, mas já dentro da área coberta pela vegetação, há vários bons bares e restaurantes. Num deles, me encantei com o aviso em um quadro: “Não temos wi-fi. Falem entre vocês!”
Nas extremidades as ondas são fortes, motivo da presença ali de um monte de surfistas.
Segundo conta a Suzana, simpática gaúcha dona do Solar do Mirador, a Praia do Rosa é frequentada o ano inteiro basicamente por catarinenses de Florianópolis e de diversas cidades do interior, mas também por gaúchos, paranaenses, uns tantos paulistas, argentinos (quando a Argentina não está em crise econômica) e gringos das mais diversas nacionalidades.
E Suzana frisou que é o ano inteiro. Não há fim de semana em que o Solar do Mirador não fique com todos os 12 chalés lotados. O mesmo deve seguramente acontecer com várias outras pousadas e hotéis.
Em uns quatro ou cinco restaurantes em que estivemos, há argentinos trabalhando; falamos com uma moça de Buenos Aires, uma de Mendoza, um de Missiones. Segundo Suzana, é uma boa mão de obra, qualificada, estudada: falam espanhol, é claro, e também inglês, o que é ótimo para receber turistas de fora.
Dois detalhinhos.
É uma região cheia de grandes lagoas. A lagoinha no meio da praia é só uma pequena amostra.
A quantidade de mulher bonita e gostosa que se vê é estonteante.
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Jamais tinha ouvido falar da Praia do Rosa até outro dia mesmo. Foi minha cunhada Mílcia, radicada há décadas em Floripa, que escolheu aquele lugar para comemorarmos os 80 anos de Dona Lúcia. Tenho que agradecer a ela sempre por isso.
Taí: gostei demais do lugar. Quem sabe um dia levo Marina lá?
Maio de 2014
Belo texto gostoso de ler. Cheio de informações importantes com fotos maravilhosas de um lugar muito especial.
Parabéns!! Vou ler mais textos seus.
Leva eu também! ;-)
Essas mulheres de capricornianos são engraçadas, Sérgio. Certa vez, num paraíso chamado Pratagy, próximo a Maceió, a minha me obrigou a remar um caiaque em uma lagoa vizinha ao resort, acompanhando uma expedição de uma turma de malucos. Agasalhado em um salva-vidas, consegui remar alguns metros, até que a posição desconfortável, com os pés esticados para a frente, resultou numa insuportável dor na coluna. Até hoje sou acusado de ter ficado com medo, de ser um covarde e de ter simulado a tal dor na coluna. Quanto às bolas de ferro, as minhas eram causadas por medo de avião. Mas, depois de aposentado, soltei a franga e quero viajar o tempo todo.
PS: “Outra encadernação” é ótimo.
Marina e Fernanda vão gostar da praia oo Rosa
assim como Inez gostou da praia do Farol na Ilha do Mel no litoral do Paraná.
Dizem que a do Rosa é uma das 30 mais bonitas
do mundo, porém existem muitas belas e desconhecidas nâo classificadas.
Búzios é linda ficou famosa um dia e hoje é um paraíso tal como Maresias no norte de SP, baía dos Castelhanos em São Sebastião, Morro de São Paulo em Valença – BA, belos locais onde a desigualdade social se expõe.
A praia do Rosa é local de encontro dos privilegiados amantes da beleza e do conforto e que, ainda bem, procuram preservar o ambiente.
Tal como a praia do Forte ao norte de Salvador, a praia do Forte em São Francisco do Sul – SC possui quase intocáveis virtudes reservadas aos militares, que concedem acesso a natureza, magnanimamente.
MARINA deve conhecer, traga o Vovô.
O texto está tão lindo e tao verdadeiro que quem o lê se sente no Rosa.
Quantas delícias essa família me proporcionou pelos meus 80 anos! Lugar maravilhoso, carinho, alegria e muito amor!Quando levar Marina, eu quero voltar,tá?
Beijos
Puxa Sergio,
O seu texto faz o local ficar ainda muito mais atraente… Foi esse truque que vc utilizou para fazer minha irmã ser apaixonada por vc? Parece fácil…
Parabéns,
Bjos,
Marcio