Poetas do mundo latino viajavam, de trem, da Cidade do México para Guadalajara. Eu estava no meio dessa festa. Trem, poesia e cerveja são combinação excelente. Pela primeira vez eu passara meu aniversário longe de casa, a bordo de um avião, no rumo da terra dos astecas.
Cheguei sozinho à metrópole, onde fui recebido pelo mexicano Eduardo Lagagne que, diante da poluição do ambiente, me confessou que seu filho dizia que o céu era gris, cinza. Nunca o vira azul como nós, ainda, estamos acostumados a ver.
Ainda na estação, conheço o poeta português Eduardo Guerra Carneiro, que cometera a insensatez de, logo ao chegar à capital mexicana, se embrenhar por bares populares e se encher de tequila e petiscos apimentados. Aquilo lhe custaria idas constantes aos banheiros para se livrar da vingança de Montezuma.
Guardei alguns papéis dessa viagem, com nomes e endereços. Lembro-me que, no dia em que chegamos, foi anunciado o prêmio Nobel de Literatura para Octávio Paz. Nossa América Latina vivia restos dos tempos sombrios das ditaduras. E, para meu espanto, sem considerar a obra do grande poeta e ensaísta mexicano, muitos protestaram contra a escolha. Era a ideologia passando por cima da estética.
O argentino Carlos Patiño, copo na mão, lamentava o fato de que ao chegar aos cinquenta anos se tornara invisível para as mulheres. Um poeta equatoriano afirmava com convicção, sem saber que eu era mineiro, que a obra de Guimarães Rosa não era de invenção. Ele apenas copiava o falar da gente de nossa terra. Assumia um tal ar de autoridade, que nem me interessei em ouvir seus versos.
Já os versos ditos por Juan Gelman me encantaram. E também sua prosa de muito saber, carregada da angústia pela perda, para os militares argentinos, de seu filho e sua nora, mas também plena da alegria de viver e amar. Versos que vim rever alguns anos mais tarde, em edições bilíngues aqui publicadas.
Outros poetas estão nos meus papéis guardados desde 1990. Alberto Perrone, Jorge Boccanera, Roberto Sosa, Evaristo Lopes, Adolfo Casaus. E Tânia Liberdad, cantora de origem peruana que preparou em sua casa para mim e Eduardo Langagne, seu parceiro, peixes com temperos saborosíssimos.
Lembrei-me de tudo isso agora, na véspera de voltar à Cidade do México. No meio da papelada, descubro, já que estava cercado de poetas de todo o mundo latino (tinha até uma vinda das Filipinas, país que me disseram ter um lado ibero-americano) uma anotação que fiz na época. Tem um título (“o dia em que eu fiz 44 anos”) e era dedicada a Roberto Sosa, outro poeta que me impressionou:
“Ontem fiz 44 anos. Penso que agora posso começar a fazer poesia.”
Esta crônica foi originalmente publicada no Estado de Minas, em abril de 2013.
A arte é a auto-expressão lutando para ser absoluta.
Querido Sérgio Vaz ou outro que esteja moderando/atualizando o blog, saudações.
Tenho 28 anos. Moro no interior do estado do RJ e estou em uma busca de quase 1 ano. Quero encontrar algum contato do Fernando Brant. Algum e-mail, endereço, telefone ou qualquer outo veículo de informação que possa me conectar a ele (não imaginava que isto seria tão difícil).
Quero entregá-lo uma carta que fala um pouco de minha trajetória como cantor e compositor, pautada na obra do Fernando. É um sonho muito antigo. Mesmo que não dê em nada, quero entregar a carta a ele.
Esta postagem no seu blog me parece ser o último registro escrito do Fernando e por isso penso que talvez você possa me ajudar.
Agradeço a gentileza e parabenizo-o pelo belo blog.
Saudações,
Chico Brant.