O PT afônico

O PT nunca amargou desilusão tão profunda: as ruas se abarrotaram de gente sem que o partido as mobilizasse. Gente que, em sua maioria, prefere que a “onda vermelha” convocada, oportunista e extemporaneamente, pelo presidente da sigla Rui Falcão, fique longe.

Golpe duro para quem sempre se vangloriou da sintonia com as massas, de ser o senhor das vozes das ruas. Que se arvorava a ser quase, senão o único, na interlocução com os jovens. Que paga centenas de blogueiros, sabem-se lá quantos tuiteiros e facebuqueiros para falar bem do governo e rechaçar opiniões contrárias. Mas que não foi capaz de nem mesmo sentir o cheiro da mobilização, via redes sociais, que nas duas últimas semanas sacudiu o país de ponta a ponta.

É fato que nenhum partido, pouquíssimos políticos e só alguns analistas conseguiram traduzir, pelo menos parcialmente, o que está se passando. Mas, para o PT, estar divorciado disso, não ser o dono da voz, é quase mortal.

Tanto que se expõe ao rechaço enfiando-se em manifestações que, pelo menos por enquanto, agremiação ou político algum é bem-vindo. Até porque os partidos políticos – mais preocupados com os seus umbigos e com a eleição seguinte – são alvos da grita.

Estar apartado disso é tão letal para o PT que fez seus dirigentes esquecerem os disfarces habituais. No olho do furação, enquanto o prédio da Prefeitura de São Paulo era vandalizada e o prefeito Fernando Haddad deixado nu, lançado à sua própria sorte, a presidente Dilma Rousseff reunia-se com o seu inventor Lula, o marqueteiro João Santana, o ministro Aloizio Mercadante e Rui Falcão.

Na pauta, o PT e a manutenção do poder depois do estouro da boiada – da qual eles se imaginavam donos – falavam mais alto do que o País.

O petista Haddad abrigou-se ao lado do tucano Geraldo Alckmin e, juntos, anunciaram a suspensão do reajuste das tarifas de ônibus, metrô e trens. No dia seguinte, quinta-feira, ambos colheram uma manifestação em paz, que ocupou toda a Avenida Paulista.

Dilma só falou ao País na sexta-feira, um dia depois de a “pequena minoria” – esse pleonasmo que deixou rastros de destruição em dezenas de centros urbanos – fazer estragos diante de seus olhos, importunando-a no Palácio do Planalto, ameaçando o Congresso Nacional, ateando fogo e quebrando os vidros do Palácio do Itamaraty.

Seu pronunciamento foi correto no tom, medido, bem escrito. João Santana teria acertado em tudo, não fosse o deslize costumeiro de, mais uma vez, colocar o PT antes do País; de anunciar um pacto nacional com a pauta da campanha eleitoral já desenhada para 2014. De amenizar, mas não eliminar a soberba.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 23/6/2013. 

3 Comentários para “O PT afônico”

  1. Eu estava muito desanimado. Até me imaginei vivendo fora do Brasil, partindo para o auto-exílio em alguma democracia friorenta, porém mais civilizada. Ao contrário do insistente Sergio Vaz, não tenho vocação para ficar dando murros em ponta de faca. Há pouquíssimo tempo comentei com meu irmão, um ex-petista, que não haveria tempo hábil, até às eleições, para que surgisse algum fato novo que tirasse o País das mãos da petralhada. Ainda mais que agora eles estão assessorados por profissionais, como Collor, Maluf, Lobão, Sarney, Delfim, etc. Lembro-me que chegamos a brincar: eles têm razão, “tá tudo dominado”. Como todo mundo, achávamos que não cairia nenhuma bomba atômica aqui em Brasília, não surgiria nenhum tsunami político capaz de modificar o nosso triste panorama. Agora, pode até ser que eles ganhem as próximas eleições, mas nunca mais poderão se vangloriar de que “tá tudo dominado”. Vão ter que aturar o Ministério Público, vão ter que assistir caladinhos parte da quadrilha indo para a cadeia no próximo semestre. E ainda terão que fingir que são favoráveis aos protestos. E o milhares de companheiros que se arranjaram em empregos bem remunerados no serviço público, sem passar por essa chatice que é ter que estudar para concurso? Devem estar começando a ter pesadelos com a virada do vento. Quem mandou confiarem no vento, quem mandou esquecerem do velho Ulysses: “política é como nuvem: você olha e ela está de um jeito; olha de novo e ela já mudou.”

    PS: Parabéns pelo artigo, Mary Zaidan. Não é à toa que bombou com um dos mais comentados do blog do Noblat.

  2. O vento que venta lá, venta cá. que bons ventos tragam significativas mudanças.

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