A rua da nossa casa, quando nela chegamos, em 1979, era de terra. Estava a poucos quarteirões da praça principal de Guarulhos, mas não passava de um lugar bucólico. Nos sentíamos afastados da civilização. Logo, veio o asfalto. Abriu-se uma avenida, no que era um caminho à frente da rua. O lugar cresceu. A avenida, duas pistas com canteiro central, tornou-se importante.
A porta da casa, recuada dois metros da calçada, abre para a rua. Sempre tivemos plantas altas ali. Ficava um pequeno recanto aconchegante, com dois degraus revestidos de pedra. Um dia roubaram o número da casa, de metal, parafusado na porta. Depois, levaram a arandela, grande, que iluminava toda a frente. Instalei, em cima dos muros, dois spots para melhorar a iluminação. Duraram poucos dias.
A avenida já era a mais importante da cidade. Então percebemos que, enquanto dormíamos, o “recanto” à frente da nossa porta, e os degraus, serviam como motel e ponto para uso de drogas. Não houve jeito. Instalamos a grade. Ela segue o alinhamento do muro, com portão igualmente alto. Isola o “recanto”.
A nossa tranquila rua de bairro ganhou trânsito e carros estacionados. Precisei colocar uma placa na porta da garagem, pedindo para deixarem a frente livre. Um comércio sofisticado, com restaurantes e bares, instalou-se na avenida. Em uma noite dessas, ouvimos um flanelinha na frente de casa. “Estaciona aqui, campeão.” “É aqui, doutor. Só sete reais”. Minha filha diz que vai pedir comissão. O flanelinha, por sua vez, estabeleceu-se.
E há duas semanas, encontramos mais uma novidade. O portão da garagem, de madeira, envernizado, tinha sido pichado. Aquelas garatujas que se vê por toda parte. Estou à espera, agora, de manifestações e bloqueio na avenida, com vandalismo e repressão da tropa de choque. Assim, vou me convencer de que a civilização chegou plenamente ao nosso bairro.
Setembro de 2013
sucumbiremos porque não somos capazes de estar à altura da civilização em que fomos desenvolvendo!