Os meninos tinham 12 anos e isso se passou há cem, na cidade que fora inaugurada há apenas quinze. 1912, rua dos Timbiras, entre as ruas da Bahia e Espírito Santo. Queriam fundar um time de futebol para organizar o que faziam informalmente em suas brincadeiras com a bola no pé e o desejo de gols.
Fizeram um sorteio para escolher o nome do clube que nascia. Deu América. Em seguida veio a decisão sobre as cores da camisa: a combinação do verde com o branco foi a vencedora.
A bela história dessa turma ganharia, a partir do quarto ano de existência, um tom de epopéia. Durante dez anos seguidos o América foi campeão mineiro, adquirindo um patamar até hoje não alcançado por nenhum clube de futebol: decacampeão.
Décadas depois, agora sou eu o menino de 12 anos que sai de casa e cruza a cidade, a pé, na direção do estádio do Independência, para assistir a um clássico contra o Atlético. A aventura sempre compensava, pois me lembro mais de ganhar do que de perder. Mesmo as derrotas, eu fui compreendendo aos poucos, podiam ser assimiladas para o futebol e para a vida. O jogo não passa de uma brincadeira, viagem de sonho e fantasia. É diversão e não guerra, repetição organizada do que todos os jovens do Brasil realizam em campos precários onde o que vale é o espírito lúdico.
Nada a ver com os espetáculos de hoje, onde os negócios e mesmo negociatas comandam a partitura. Em que torcidas ditas organizadas não se interessam pelos jogos e mais parecem nazistas na ânsia de agredir, machucar e matar os adversários. Que não passam de, simplesmente, torcedores de um outro time, que se deve tentar vencer na partida e respeitar na arena da existência comum.
Ainda ontem, no belo e novo Independência, uma criança de cerca de três anos, brincando ao lado da cadeira em que eu estava, me disse que sua mãe era atleticana e ela, americana.
E que, apesar disso, mesmo no dia das mães, ela torcera pelo América. E alguma família precisa se chatear por uma singeleza dessas?
O certo é que gosto muito de torcer pelo time que escolhi na minha infância.
E, se me comove a lembrança das grandes alegrias que ele me concedeu, me agrada muito a maneira correta com que o seu destino está sendo traçado e conduzido pelos americanos que hoje o dirigem. Com amor e trabalho, a projeção do América é inevitável.
Meu coração é verde e branco, verde da grama verde, branco da trave branca, da bola branca que beija a rede hímen. Brinco no gramado da infância e lá vem Zuca, e lá vem Guido, e lá vem Gunga. E não há tempo nem polícia que me apague este filme da lembrança. Amor não subtrai, amor soma, multiplica. Amor não se esquece.
Amador, seguidor fiel de tal filosofia, fui acrescentando amores aos meus dias, aos meus sonhos. Sou hoje um homem atento diante de um mundo imenso, mas em mim existe, sempre, um menino que fala e nessa hora quem manda é o Jair Bala. O meu coração é verde e branco. O dos outros pode ser vermelho.
Esta crônica foi originalmente publicada no Estado de Minas, em maio de 2012.