O fígado em recesso

Salvo melhor juízo, o PT resolveu criar juízo, pelo menos provisoriamente, e adiar para Deus sabe quando a divulgação do seu manifesto contra o STF criticando a condenação de algumas de suas eminências pardas no julgamento do mensalão.

Depois de conquistar a jóia da coroa – a prefeitura de São Paulo – numa eleição enfraquecida pela falta de entusiasmo dos eleitores, e de contrabalançar vitórias e derrotas em outros pontos importantes do País, o PT estava prestes a dar um sinal de inaudita arrogância, preparando um manifesto destinado a criticar a mais alta corte de Justiça pela condenação de alguns de seus membros mais históricos e eminentes.

Matéria publicada pela Folha de S. Paulo de quinta-feira, 1ª de novembro, explica a decisão de adiar o manifesto atribuindo a um ministro petista a avaliação de que “a ordem é agir com mais cérebro e menos fígado”.

Na verdade, toda vez que o partido se entusiasma com a falsa ilusão de que finalmente conseguiu a hegemonia política completa no país, a sua direção nacional mexe no embornal de ameaças e acena com manifestos como esse, ou com a iminência de um “controle social da mídia”, eterno sonho de uma noite de verão de uma ala do partido que ainda não aprendeu como é a convivência madura com a democracia.

Para não sair do terreno da própria esquerda e não correr o risco de ser linchado como um neoliberal – o verdadeiro monstro dos tempos modernos – vou buscar no ensaísta gramsciano Luiz Sergio Henriques, em artigo publicado no reacionário Estadão, um conselho sobre o qual os petistas mais ilustrados e letrados poderiam muito bem meditar:

“A esquerda não deveria ‘sofrer’ a democracia como se fosse concessão penosa e temporária aos ‘inimigos do povo’, mas promovê-la, ao lado de outras tendências, inclusive moderadas e conservadoras, como conquista da civilização”.

Em palavras menos acadêmicas, se quisermos usar um pouco de irreverência realista, o que o ensaísta está tentando dizer a seus companheiros de esquerda do PT é “menos, rapaziada”.

Sim, o PT ganhou a Prefeitura que mais lhe interessava – é bem verdade que com um pouco mais de 39% dos votos das pessoas aptas a votar, e menos por grandes méritos seus do que por inadequação plena do adversário – mas perdeu outras em que seu líder máximo empenhou seus bigodes, como BH, Manaus, Recife, Campinas, Salvador (para só citar algumas) e na redistribuição de poder nacional o consórcio progressista/conservador que governa o País ficou mais ou menos do mesmo tamanho.

Nada que justifique ou sustente atos, gestos e bravatas de desprezo à democracia.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 2/11/2012.

2 Comentários para “O fígado em recesso”

  1. O PT ouviu o “menos rapaziada”. Estas eleições mostraram que o partido não está com a bola toda. O PSB e o PSOL mostaram grande avanço e vem recebendo grande parte do eleitorado que não se ilude com os programas e discursos populistas. O PT se equivoca ao vangloriar-se da vitória dirigida na representação do PSDB. Este sim o grande derrotado, deixou de ser oposição por falta de renovação e de conivência programática com o dito partido rivala quem nunca se opôs. A oposição verdadeira foi feita e é crescente por parte dos partidos nanicos de esquerda e com a grata surpresa socialista do PSB. Inteligentemente o PSB, com quadros novos e propostas e reformistas/populistas, ganhou espaço do PSDB e dos desiludidos do PT. Aqui e ali fez alianças que reforçam suas bases eleitorais para 2014. Não hostilizam a presidenta com mensalão, ao contrário acenam com uma composição que viabilize 2018. Pés no chão, o pernambucano agradece desde já a burrice petista. Namora Aécio, namora Dilma e queima o Lula. O PT do Lula que se cuide, FHC o mais esperto dos tucanos, já enxergou o caminho a necessiadade de mudanças.

  2. Eu tenho orgulho de ser descrita como neoliberal. Gramsci esquecido em todos os outros continentes, continua dando as cartas ideológicas na dita esquerda brasileira, que só o leva em conta para aprender como um partido pode dominar toda uma sociedade. É só ler Maquiavel, a Política e o Estado Moderno, que tive o desprazer de ler durante o curso de Economia. O PT odeia democracia.

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