Sábado, dez da manhã, vou passear – coisa antiga – no Mercadão, como é chamado, carinhosamente, o Mercado Central.
Nas imediações da fervilhante – ou borbulhante? – 25 de Março, chamada, popularmente, de 25, às margens do Tamanduateí, no caminho da Cantareira, o velho prédio convive com vizinhanças das mais frenéticas e variadas. Com luz própria, sua imponência soberana abarca – ou abafa? – mundos e fundos.
Entrada larga, pé direito alto, de castelo, vitrais restaurados, de catedral, bancas sem fim, de perder de vista, cheiros, cores, vozes, tudo parece me segredar: fui ao lugar certo.
Aquelas imensidões são, sim, lugares pra ser passeados. Tão somente.
Passear, ainda me lembro, é vagar sem propósito, nem despropósito.
Vagar devagar. Divagar. Rodar, rondar. Rodopiar. Às vezes, precisa.
Olhar pra lá, pra cá, pra lá e pra cá. Sondar, sonambular. Sonhar, sempre precisa.
Passear – ah, me lembro – é ir e vir. Como se não fosse, nem viesse. Sem rumo, só prumo. Sem hora, só demora.
Alguma filosofia. Dessa baratinha, corriqueira, contagiosa, quase nada.
Dessa capaz de inundar a alma de encanto, apenas com a visão – mesa próxima -, de um casal aparentemente feliz, sorvendo, olhos nos olhos, o segundo copo de chope, como se nunca mais – quem sabe? – fosse existir outro.
Passear – talvez eu saiba –, é, manhã de sábado, sair com filhos adultos e, Mercadão afora, vagar, contemplar, sonambular. Nem ir nem vir, talvez sonhar.
Filosofar. De jeito corriqueiro, contagioso: olha, não me lembrava, pensei que fosse menor, eu não, pensei que fosse maior, bem maior, a lembrança que eu tinha era de criança, eu não tinha lembrança nenhuma, o sanduíche gigante acho que é lá em cima, a gente divide, vocês dividem um, nós dividimos o outro, tenho um amigo que vem aqui toda semana, conhece tudo, conhecer tudo pra quê, besteira, perde a graça, me avisa quando deixar de ser do contra, do contra é você, que fotos legais, olha, tá tendo um show ali no fundo, tem um salão lá, daqui dá pra ver melhor, essa mesa não, muito no meio, ah, essa tá ótima, todo mundo vai querer chope?
Esta crônica foi originalmente publicada no primeiroprograma.