Na mesa os assuntos são variados. Aí alguém manifesta sua contrariedade com algo que lê nos jornais e vê/ouve na televisão. É o caso da violação dos sigilos dos cidadãos praticada pela Receita Federal e, sabe-se lá, por outros órgãos governamentais. É uma mulher e ela não se manifesta como partidária de qualquer candidatura. O que a incomoda é a ladainha repetitiva de que esse assunto não pode ser compreendido pela maioria da população. Não há assunto que não possa ser entendido. A maneira de explicar é que faz com que um tema seja digerido por muitos ou poucos.
É problema de comunicação. Para isso existem faculdades e profissionais que trabalham para tornar mais evidente o que se quer transmitir. Existem formas de discursos tão obscuros e complicados, pretensamente eruditos ou simplesmente mal feitos, que ninguém capta. O fato mais simples, se não houver coerência no raciocínio e na elaboração da idéia, perde-se no limbo da incompreensão.
Lembro-me de um fato ocorrido em minha casa, em 1989. Cedi minha residência para um encontro entre a classe artística e cultural de Minas com o candidato Lula. Era uma noite de eclipse lunar e, depois de contemplar o fenômeno, nos preparamos para uma conversa com Lula e seu vice. Lula não pôde ficar muito tempo e deixou com seu companheiro de chapa, o senador Bisol, a tarefa de dialogar com os presentes. Abrindo o debate, ressaltei que tínhamos ali craques em comunicação que poderiam sugerir caminhos para a campanha. Bisol respondeu que eles já tinham gente experiente trabalhando e muito bem. Desprezou a oferta e o Brasil continuou assistindo ao baile de comunicabilidade que o candidato que iria se eleger exibia na televisão e no rádio.
Diz a mulher para os que a ouvem: diante de um tema aparentemente difícil de expor para a maioria, a atitude de vê-lo como um muro intransponível não é inteligente. O obstáculo está ali para ser revirado e desvendado, até que se encontre uma maneira de o revelar. Como deslindar para a massa o que é o episódio da quebra do sigilo pelo Imposto de Renda?
É o caso típico de quebra de confiança, de inconfidência. É o que Joaquim Silvério fez com Tiradentes, uma traição: contou o que não podia ter contado. A comparação mais fácil é a do padre e do confessionário. O fiel confessa ao padre suas histórias, ações e pensamentos. Ele tem a certeza, que a religião e a tradição lhe dão, de que nada do que falar será dito para mais ninguém.
O confessor ouve e se cala para sempre. Ele é depositário de informações que não pode passar para frente. Esse é um compromisso moral, religioso e humano. Qual brasileiro não entende isso?
Quando o cidadão entrega seus dados, sua vida, para o Governo, ele espera o mesmo silêncio, sigilo, que encontra no sacerdote e confessor. Sigilo é o segredo que tem de ser guardado. Se o Governo revela os segredos de qualquer brasileiro, é como se o padre saísse pelas ruas a contar o que ouviu no confessionário. É coisa de Judas, de Silvério dos Reis e de todos os traidores que conhecemos na vida e na História.
Esta crônica foi originalmente publicada no Estado de Minas