Como muitos, também me vi surpreso com o julgamento do STF que manteve a censura ao jornal O Estado de S. Paulo, vez que fundamentado no tecnicismo jurídico deixou de cumprir a missão de manifestar-se sobre o que realmente importa, como alguém um dia já disse “duela a quem duela”… E fiquei pensando, pensando, na verdade procurando justificar, já que o Supremo é um dos três poderes da República, mas aquele cujas decisões não se discute, se cumpre!
Para poder avançar, vi que precisava investigar o que é, afinal, ser “poder” numa República. Pensei, é claro, no Brasil, em cuja história recente os militares foram o poder efetivo nas mais diversas ocasiões, e o exerciam usurpando, tomando de assalto o Poder Executivo. E, ao fazê-lo, subjugavam os demais.
Nessas ocasiões, de nossa não saudosa história recente, desde logo fechava-se um deles, o Legislativo. Era colocado “em recesso”; este não se dominava, tinha que ser fechado, nessas ocasiões – e assim foi muitas vezes feito.
Mas vejam só, o Judiciário, o Supremo Tribunal, não. Curioso, nunca foi fechado por nenhum ditador ou poderoso de plantão no Brasil. O Poder Executivo forte, quando originado de rompimento da ordem legal, comandado por militares ou civis, calava o Legislativo mas não calava a Suprema Corte. Nunca foi preciso.
Lembrei de Vargas, e então do julgamento do habeas corpus impetrado em favor de Olga Benário. A extradição era ilegal, ela estava grávida de filho brasileiro, e sua extradição significaria colocar o filho de um brasileiro sob o poder de um governo estrangeiro, alem do aspecto humanitário da permanência dela aqui, vez que o pedido partia do governo nazista. Mas Vargas era o poderoso ditador, tinha a força de seu lado, queria a extradição. Embora contra a Lei, assim foi feito. Não estou sozinho; em 1998, o então presidente do STF, Celso de Mello, também comentou que a extradição fora um erro.
Em 1955, Café Filho impetrou mandado de segurança para retornar à Presidência da República, então ocupada por Nereu Ramos em razão de licença médica do próprio Café Filho. O ambiente político estava conturbado, os militares da época eram contra, mas o que chama a atenção e me leva a pensar mais ainda é o voto vencedor do então ministro do STF, Nelson Hungria, que declara com todas as letras: “No fundo da atual situação política do Brasil, o que se apresenta, dominante e decisivo, é um pronunciamento militar, que, para fins louváveis ou não, se sobrepôs à ordem constitucional. (…). Jamais o Supremo Tribunal desertou à sua função constitucional, que não é, positivamente, a de debelar insurreições vitoriosas”. E continua: “Contra o fatalismo histórico dos pronunciamentos militares não vale o Poder Judiciário, como não vale o Poder Legislativo. Esta é que é a verdade, que não pode ser obscurecida por aqueles que parecem supor que o Supremo Tribunal, em vez de um arsenal de livros de direito, disponha de um arsenal de “schapnels” e de torpedos”.
Volto aos Poderes da República. Se o Executivo muda de mãos por meios, digamos, heterodoxos, o Legislativo não se curva, é fechado. O Judiciário, ao contrário, o sustenta com seus pronunciamentos, julgamentos e interpretações visando a defender a ordem constitucional vigente, seja ela qual for, mesmo que seja a do AI-5, Deus nos livre.
Surge então a pergunta que queria evitar desde o começo: Se hoje o Supremo não precisa temer “schapnels” e torpedos, qual será o Poder, quais os poderosos deste momento histórico a Suprema Corte atende com seu recente julgamento?
Sei lá porque, não consegui digitar o meu nome completo. Vai aqui o que faltou: “….os
Cruz”
Mas indo ao que interessa, não sabia que o Malufinho tinha também essa qualidade: escrever e publicar artigos.
Melhor pra nós que a tenha, porque ao ACM (do bem) nunca faltaram inteligência, bom senso e serenidade para enfrentar e dizer as coisas. Desde já, me integro ao grupo dos seus leitores.
Boa a idéia a do Sérgio Vaz e da Meire de recuperar para as “letras” este talento que andou meio distanciado.
Abraços,
Salles (….os Cruz).
Poxa, Salles, você não quer pensar na possibilidade de me mandar alguns textos seus para eu colocar no site? Seria uma imensa honra ter seu texto brilhante aqui.
Fico torcendo.
Um grande abraço.
Sérgio
primeiro a bela surpresa do texto mas principalmente do seu conteúdo. É pensamento corrente dúvidas que pairam sobre as decisões do nosso Supremo e o texto do ACM (do bem como já disseram) vem contribuir para nossa reflexão. Parabéns