A política quase nunca é o que parece. A semana passada foi exemplar para comprovar o dito. Tinha-se na conta que, ao derrubar mais de uma dezena de vetos presidenciais em uma única sessão, o Congresso Nacional teria imposto uma derrota fragorosa ao governo Lula, que, ao contrário, chegou na sexta-feira sorridente, dividindo vitórias com o Parlamento. Perdeu onde sabia que perderia e ganhou onde precisava. E ainda escreveu na história um feito e tanto: a aprovação de um novo sistema tributário, empacado há quase quatro décadas. Para tal, fez-se política – com “p” maiúsculo e minúsculo.
Sabatina dupla piora o que já é ruim
Na quarta-feira, 13, o Brasil vai assistir a mais uma invencionice política: uma sabatina conjunta dos indicados pelo presidente Lula ao Supremo Tribunal Federal, Flávio Dino, e para a Procuradoria-Geral da República, Paulo Gonet. O formato surreal, dizem, teria sido decidido pelo presidente da Comissão de Constituição e Justiça, senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), para auxiliar o governo, atenuando a pressão da oposição bolsonarista que gosta de Gonet e odeia Dino. Sob todos os aspectos, é mais um absurdo – e não são poucos os absurdos – que subverte o dever e a responsabilidade do Senado. Continue lendo “Sabatina dupla piora o que já é ruim”
Este é um país que vai pra trás
Reestatização de refinaria no Ceará, aprovação do marco legal das usinas eólicas em alto-mar com “jabutis” que obrigam a contratação das super poluentes térmicas a carvão, condicionantes à liberdade de imprensa. Esses são apenas alguns exemplos de retrocessos recentes do Executivo, Legislativo e Judiciário, que se somam aos do setor privado, desde sempre e cada vez mais dependente de incentivos, regalias e privilégios. Ainda que existam avanços aqui e acolá, a exemplo da queda do desmatamento na Amazônia e da reforma tributária, que só será plena em 2032, o Brasil, definitivamente, anda para trás. Continue lendo “Este é um país que vai pra trás”
O Brasil na guerra de Maduro
A diplomacia brasileira e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva têm pela frente um teste de fogo. Nada a ver com as guerras da Rússia na Ucrânia ou de Israel versus Hamas, nas quais Lula tentou, sem sucesso, algum protagonismo. Agora, o perigo mora ao lado. O desafio e a saia justíssima envolvem o companheiro Nicolás Maduro e sua pretensão de “retomar” para a Venezuela a Essequiba, região que ocupa dois terços da Guiana. Sem descartar invasão por terra, ar e mar. Continue lendo “O Brasil na guerra de Maduro”
Gororoba municipal
A um ano da eleição municipal, os partidos dos principais cabos eleitorais do país – o PT do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o PL do ex – não refletem o vigor da disputa do ano passado, quando Lula obteve 50,9% dos votos e Jair Bolsonaro, 49,1%. Ainda que a polarização continue viva no ambiente digital, com lulistas e bolsonaristas se esbofeteando, nas maiores capitais do país os acordos políticos têm falado mais alto do que a gritaria das redes, e os partidos nem de um nem do outro têm, até então, candidatos competitivos. Continue lendo “Gororoba municipal”
Tudo por dinheiro
Como em um passe de mágica, a instrução normativa nº 2, de apenas dois parágrafos, aprovada pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso, autorizou que quase um terço – R$ 4 bilhões dos R$ 12,5 bilhões reservados no orçamento de 2024 para emendas de bancadas dos estados – migrem para o Fundo Eleitoral. Somados aos R$ 961 milhões que o governo havia fixado para esse fim, o financiamento público para as eleições municipais do ano que vem baterá todos os recordes: R$ 5 bilhões. Dinheiro que deveria ir para hospitais, postos de saúde, escolas, obras de infraestrutura… Continue lendo “Tudo por dinheiro”
“Governar é abrir estradas”
O presidente Lula tem sido duramente criticado por governar com olhos no retrovisor, não raro com o fígado. Por não ter novos projetos e insistir na repetição até do que não deu certo. Não é bem verdade. Continue lendo ““Governar é abrir estradas””
Dinheiro pelo ralo
Com 23.818 habitantes, Novo Aripuanã, cidade encravada na mata com orla para o Rio Madeira, é apenas mais um dos frequentes casos de descaso com o dinheiro público. Por lá, o prefeito achou por bem pagar R$ 286 mil em cachês para dois artistas, valor que supera a metade dos R$ 531 mil que a União empenhou emergencialmente para o município devastado pela pior seca já registrada no Amazonas desde 1902, quando as medicões começaram a ser feitas. Continue lendo “Dinheiro pelo ralo”
Nem conservador, nem progressista
Dá-se como certo que o Brasil é majoritariamente conservador e até moralista. Que repudia a descriminalização do aborto, o uso recreativo da maconha ou a união homoafetiva, questões associadas à progressistas. Uma visão distorcida que ganhou mais vigor nos tempos do ex Jair Bolsonaro. A realidade é bem outra. Como na política, há tempos polarizada, também nos costumes o Brasil é um país dividido ao meio. Continue lendo “Nem conservador, nem progressista”
Por trás da crise com o Supremo
Muito se fala – e muito ainda vai se dizer – de crises entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal, contendas que teriam origem na composição mais conservadora do Parlamento versus o progressismo da Corte maior. É mais do que isso. Além dos interesses econômicos, óbvios no caso do marco temporal para delimitação de terras indígenas, por trás do brio ferido da Câmara e do Senado com decisões recentes do STF está a ávida corrida da direita em dar fôlego às pautas de costumes que, com o ex Jair Bolsonaro abatido, teriam o condão de manter a tropa unida. Continue lendo “Por trás da crise com o Supremo”
Salve Rosa!
Pode até ter sido mais um atropelo da Suprema Corte ditado pela inoperância do Legislativo, mas o voto da ministra-presidente do STF Rosa Weber sobre a descriminalização do aborto é absolutamente irrepreensível. Nos argumentos quanto à constitucionalidade, na análise do mérito, no enfrentamento de uma questão que aflige milhões de mulheres e há décadas o país empurra com a barriga. Continue lendo “Salve Rosa!”
Outros atentados à democracia
Pode-se até discordar da dosimetria das penas, mas a condenação dos primeiros réus do 8 de janeiro foi precisa e didática. Prevaleceu o entendimento de que a democracia é valor supremo do país, não havendo, portanto, espaço para atentar contra ela. Ainda assim, nós na garganta impedem que se comemore. Firme na reação ao golpismo, o tripé institucional – Justiça, Executivo e Legislativo – tem falhado feio, minando a democracia que diz defender. Continue lendo “Outros atentados à democracia”
A vil moeda de Lula
Alguns chamam de pragmatismo ou realpolitik. Outros pegam até mais leve, tratando a prática como se o toma lá dá cá fosse um balé necessário à governabilidade. Balela. Ceder ministérios e até criá-los para satisfazer a sanha de políticos inescrupulosos na vã esperança de obter maioria parlamentar é compra de votos. Simples assim. Tão deletéria quanto os escandalosos mensalão, utilizado à larga no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ou orçamento secreto, sacramentado pelo ex Jair Bolsonaro. Continue lendo “A vil moeda de Lula”
Independência sem morte
Não há convocação para uma nova “festa da Selma”, senha utilizada nos grupos bolsonaristas para o 8 de janeiro, nem se tem notícia de caravanas seguindo para Brasília. Mas a movimentação entre os apoiadores do ex se intensifica com a proximidade do 7 de setembro. Ainda que divididos entre a ativação popular, com a assinatura “será gigantesco”, e o “fique em casa”, tentativa de esvaziar as comemorações da Independência, todo cuidado é pouco. Até porque essa turma já demonstrou a capacidade que tem de incendiar o país. Continue lendo “Independência sem morte”
Lula e a toga conservadora
A grita da esquerda em geral e de petistas em particular à postura do ministro Cristiano Zanin nas primeiras votações no Supremo – foi contra descriminalizar o uso pessoal da maconha e a equiparar homotransfobia a injúria racial -, não é apenas inócua, mas descabida, visto que as posições dele não deveriam causar qualquer surpresa. Inebriados com a indicação que o presidente Lula fez de seu advogado, progressistas nem deram bola para o pensamento retrógrado de Zanin, que ao ser sabatinado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado não escondeu seu perfil tradicionalista, anti-drogas e anti-aborto. Agora, com o leite derramado, nem o choro salva. Continue lendo “Lula e a toga conservadora”