Por alguns meses, vamos ter que aprender a pronunciar o nome Cavendish, a ouvir gravações inconvenientes de diálogos inconvenientes entre o contraventor e seus clientes políticos, e ver a troca de bolas de lama entre os defensores do governo e da oposição.
Uma CPI é sempre uma grande catarse midiática e popularesca, porque as pessoas adoram ver a desgraça alheia desfilando diante de seus olhos, principalmente quando em cena estão ex-poderosos que até pouco tempo atrás posavam como pais da pátria ou empresários cheios de poder, grana e influência.
Cada um é algoz de sua vítima predileta: os petistas querem ver lá na cadeira do dragão Demóstenes, Perillo, Leréia e qualquer oposicionista que seja capaz de fornecer um alívio de consciência a quem, desde o mensalão, tem sido obrigado a carregar sozinho a cruz da desonra.
Gostariam de ver na cadeira também o dono da Veja e o repórter que trocou 200 telefonemas com Cachoeira, na esperança de comprovar a existência de uma sinistra conspiração midiática, que naturalmente não existia nos tempos em que eles carregavam a revista debaixo do braço para exibir as denúncias contra os governos Collor e FHC.
Os oposicionistas, numericamente esmagados na composição da Comissão por força da quase insignificância numérica de suas bancadas, sonham em fazer barulho em torno de Agnelo Queiroz,o governador do DF, e das ligações entre a poderosa empreiteira Delta , campeã das obras do PAC, seu ilustre consultor José Dirceu e outras instâncias do governo.
Embora tenha ficado bastante claro que a criação da CPI não alegrou muito a presidente da República, ciente da veracidade do velho bordão de que um evento desses “sempre se sabe onde começa mas nunca onde termina”, e que quem está no governo nunca tem a ganhar com seus desdobramentos, tomaram-se as devidas cautelas para que o trem não saia dos trilhos.
Um acaso do destino reuniu numa espécie de sub-palácio paulistano do Planalto, o Hospital Sírio-Libanês, o convalescente mentor da CPI, ex-presidente Lula, e o “incomum” soba do Senado, José Sarney, que lá estava para ajustar alguns desarranjos biológicos de menor gravidade.
Lá, segundo o jornal O Globo, os compadres políticos ajustaram os relógios estratégicos para que a CPI não saia do controle da esmagadora maioria governista, e para que ela cumpra sua função precípua de produzir barulho suficiente para ofuscar o provável julgamento do mensalão, se o ministro Lewandowsky resolver desengavetá-lo dentro desse prazo.
O fato é que todos, oposição e governo, comemoraram para as suas torcidas a instalação da CPI – cada um por suas razões.
Quem não tem muita razão para comemorar – e não comemorou – foi a presidente Dilma, que possivelmente conseguiu antever como será difícil evitar que o incômodo pelotão da interesseira base aliada – o poderoso PMDB à frente – passe a ter cada vez mais oportunidade de criar as suas dificuldades para vender as suas facilidades.
Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 20/4/2012.