Lorotas

Aprenderam a lição? Receber pagamento em dinheiro vivo e guardar em casa é igual a rabinho do rato fora do buraco no rodapé da sala. Eu vi muito filme de Tom&Jerry na minha infância. A mim não enganam. Se tem um rabinho ali, é porque tem um ratinho lá dentro. 

     No caso, um ratão peludo de bom tamanho.

     Mas não vou condenar previamente os dois bolsonaristas pegos pelo rabo na ratoeira colocada pela Polícia Federal. Sou do estado democrático de direito, que eles chamam de “estado de perseguição”. Mas não perdem por esperar: se a investigação concluir que se explicaram bonitinho e foi tudo lícito, vida que segue. Vão sair mais fortes, mais bonitos na foto e de peito mais cheio do que antes. E a Polícia Federal brasileira, respeitada no mundo inteiro, desmoralizada para sempre. 

     Se não, Papuda neles! 

     Por enquanto, as respostas que deram apontam para os portões do famoso presídio. 

     Um disse, com a cara mais limpa, que não teve tempo de ir ao banco depositar a dinheirama. Coitado! Mas tá bem, a vida de político não é fácil, muito trabalho, um corre-corre danado, né? Só que ele teve tempo de empilhar a grana toda bem escondida no fundo de um armário. 

     Foram maços de dinheiro enrolados com tiras de contador. Não eram tiras de bancos. Havia notas soltas, também. Isto indica que outros tijolos de dinheiro foram abertos conforme as necessidades, né? Portanto, apesar da vida atribulada teve tempo de gastar. Mas não de levar a dinheirama para o banco. Muito trabalho… né? 

     A Polícia contou 430 mil reais, entre maços enrolados com tiras e as notas soltas. Quanto mais haveria, originalmente? Mistéééééério! Mas o indivíduo, conhecido por ser líder do PL na Câmara e falar barbaridades em defesa dos ideais bolsonaristas, se os há, diz aos jornalistas que foi dinheiro da venda de uma casa, ora bolas! 

     Sabemos que jornalistas têm ouvidos de penico. Ouvem tudo o que o infeliz diz e escrevem tudinho como ele disse. No caso, nem foi preciso escrever nada. O homem falou nos microfones que a imprensa empunhava para cima dele. E os cinegrafistas da mesma imprensa rodavam suas câmeras que não mentem jamais. Ele falou ao vivo e a cores que eram da venda de uma casa. 

     Mas os ouvidos da Polícia Federal não são penico. Se disse, tem que provar. Cadê a escritura de compra e venda? Não tem? Cadê o registro da transferência no cartório? Não tem? Cadê as assinaturas da imobiliária? Ah, não teve imobiliária? Então, quem intermediou? Ah, não teve intermediário? Foi direto com o comprador, então? Ah, foi com o advogado dele. Então passe aqui nome, telefone e endereço que vamos lá falar com ele. Ah, ele mora no exterior e estava aqui de passagem? Não sabe o telefone? Ah, ele não gosta de telefone e fez tudo presencial? Então me diga onde foi feito o negócio? Tem testemunha? Não teve? Então me diga se eu tenho cara de palhaço? 

     E por aí seguiria o interrogatório do indivíduo, que nos velhos e bons tempos da ditadura militar levaria uma bordoada em cada orelha para entregar o milho de uma vez. Os delinquentes e seus adevogados sempre reclamam que o interrogatório é uma forma de coação. Apertam o cara até ele entregar o leite. Não, queridos, isto é inquérito e todas as perguntas têm que ter suas devidas respostas. Costurando essas respostas com as perguntas é que os investigadores fazem seus relatórios, os chefes assinam e mandam para o Ministério Público. Se não sabem, é assim, viu? 

     O outro investigado nas tramoias, colega do mesmo partido na Câmara dos Deputados, foi por outro caminho. Xingou a Polícia, disse que era tudo armação, perseguição política etc. Fez-se de vítima. Por que não disse que quem não deve não teme, vai provar que tudo é límpido como água da fonte e a Polícia pode contar com ele para elucidar os fatos, etc e tal.  Não, nada disso. Foi logo chutando os baldes. Vagabundo burro faz assim. 

     Espero que o primeiro conte por que aceitou dinheiro da mala em pagamento de sua casa. E o segundo, que prove com tíquetes e notas fiscais o que fazia com os 27 milhões de reais que os dois desviaram das quotas de gabinete parlamentar nos últimos anos. 

Nelson Merlin é jornalista aposentado e cada vez mais curioso em saber de onde vem a capacidade de certos seres de contar lorotas e convencer milhões que acreditem nelas. 

20/12/2025

     

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