Para encerrar uma semana de muitas viagens e aeroportos, chego no fim da noite em casa, tomo um banho renovador e entro debaixo das cobertas para umas horas de descanso. Na manhã que se avizinha, terei de pular bem cedo da cama, pois uma van já me espera para outra jornada, dessa vez por rodovias de Minas. As meninas do Amaranto e Geraldo Vianna me aguardam para pegarmos o rumo de Muriaé, na zona da Mata, onde apresentaríamos o espetáculo “Três Estações” , delicado passeio vocal, musical e poético em torno de três gerações de artistas.
O caminho é longo e belo, cheio de curvas, mas de asfalto bem cuidado. Onde existem desgastes do piso, máquinas trabalham para repará-los. As montanhas enchem o horizonte de nossas visões e entre elas se vê uma centena de fazendas que produzem os alimentos dos brasileiros. Entrar no coração de nossa terra nos faz relembrar cheiros da infância, sentimentos que julgávamos perdidos no passado, retratos de uma gente simples e trabalhadora.
Para que o tempo passe, conversamos. Uma história puxa outra. As meninas falam de seus medos, dos acontecimentos caseiros que as marcaram e de como superaram os desafios da existência. Três irmãs que cantam e vivem em harmonia, ligadas à música e às famílias que estão construindo.
Geraldo, nascido em Nova Serrana, antigo Cercado de Pitangui, conta que foi menino agitado, do jeito de seu filho. Olhando para ele, com seu temperamento tranquilo, custo a acreditar que um dia ele possa ter sido o moleque inquieto que diz ter sido. O assunto música, como não poderia deixar de ser, está sempre presente, mas agora o tema é cinema. Os grandes filmes vistos e revistos, os diretores, os atores. E o estudo de roteiro feito com o saudoso e querido José Tavares Barros.
E cerveja, que Geraldo bebe diariamente, com moderação. Sem esquecer dos queijos e suas variedades. Quando alguém diz a um mineiro essa palavra, o paladar se abre e ele sente o perfume e o gosto de seu alimento predileto.
Me veio a lembrança de um fato ocorrido comigo, antes dos meus cinco anos, em Caldas, cidade em que nasci. Pensei em contar mas me calei, não sei por que razão. Um dia deram por minha falta e procuraram em todos os cômodos da casa, na rua, convocaram os vizinhos para a busca. Passado um tempo, alguém resolveu abrir o armário da copa. Lá estava eu, branco feito leite. Aberta a porta, eu teria escancarado a boca e minha garganta despejado meio queijo no chão. Coisa de menino mineiro esganado. Quase morri de queijo.
Os caminhos que percorremos nos levaram a passar por cidades de compositores mineiros famosos. Ponte Nova, de Nelson Ângelo, João Bosco e Tunai. Ubá, de Ari Barroso. Mirai, de Ataulfo Alves.
Com fome de comida, cerveja e música chegamos, enfim, a nosso destino, Muriaé. E a noite foi maravilhosa.
Esta crônica foi originalmente publicada no Estado de Minas. Outubro de 2010