Agindo exatamente ao contrário do seu xará bíblico, o ungido que viria para nos salvar de todos os males, amém, o Messias tupiniquim, ao que parece, prefere ver o circo pegar fogo, e no lugar do amai-vos uns aos outros, adaptou o ensinamento aos seus moldes.
O decreto assinado por ele no último dia 12, sexta-feira, flexibilizando ainda mais a compra e o uso de armas foi a bomba da semana nas redes sociais e na mídia. Tá todo mundo se perguntando por que ele quer flexibilizar ainda mais a compra de armas, passando das quatro permitidas – o que já era muito – para seis por cabeça. (Que tipo de cabeça pode ter uma pessoa de bem que quer ter seis armas de fogo em casa?)
E todos acham que aí tem! Na opinião dos internautas e dos analistas políticos, ou o presidente louco por armas (se preferirem podem suprimir o “por armas”) está querendo espalhar seu fetiche para a população, ou está querendo beneficiar financeiramente alguém próximo que esteja envolvido na fabricação dos tais “brinquedinhos”.
Há até quem diga que as milícias com as quais Bolsonaro mantém um relacionamento afetivo estariam agradecidas pelo decreto, mas essa hipótese parece pouco provável, já que elas têm lá seus próprios meios de adquirir um arsenal. Não dá pra imaginar o falecido Adriano da Nóbrega passando numa loja antes de partir para seu esconderijo lá no interior da Bahia, pedindo ao balconista: me vê aí seis armas de fogo e cinco mil balinhas. Embrulha tudo pra viagem, talquei?
O decreto altera também a posse de armas. Daqui em diante, qualquer um vai poder levar duas delas, uma em cada bolso, quando for passear com o cachorrinho e sair dando uns pipocos por aí, amparados pela lei.
Outra decisão do presidente vai agradar em cheio a molecada entre 14 e 18 anos, que gosta de praticar tiros nas instituições destinadas ao esporte. Antes eles só podiam atirar com a arma dos pais; já com o novo decreto vão poder atirar com a arma emprestada pelo amiguinho. Olha que beleza!
E atenção colecionadores, atiradores e caçadores (CACs)! Bolsonaro deu uma mãozinha pra vocês também. Não vão mais ter de passar pela avaliação de um psicólogo cadastrado na Polícia Federal para provar que vocês têm aptidão psicológica pra apertar o gatilho. Qualquer psicólogo que tenha registro no Conselho Regional de Psicologia vai poder atestar que vocês são normais (?).
Sobre os imunizantes que já estão faltando no país, nenhum decreto para acelerar compras foi assinado. Por ora o ministro da Saúde Eduardo Pazuello se limita a soltar previsões à la Mãe Dinah sobre as datas de entrega do material, enquanto seu chefe sai por aí dizendo que tem um cheque de 20 bilhões para a compra de vacinas contra a Covid-19, e que só não compra porque elas estão “em falta no mercado”.
(Deve ter ido com seu cheque procurar vacina no Mercadão da Cantareira em São Paulo, ou no Mercado Modelo de Salvador.)
A sorte do presidente é que aquele pitbull preso na última terça-feira por atacar o STF, o deputado federal Daniel Silveira, é um bolsonarista roxo (não podia ser diferente). Se não fosse, não aceitaria essa desculpa esfarrapada de que não tem vacina para comprar e faria picadinho dos (i)responsáveis que continuam deixando o povo morrer por pura negligência.
Mais vacinas e menos armas senhores, pedimos nós, os pitbulls do bem!
Esta crônica foi originalmente publicada em O Boletim, em 19/2/2021.