O bom combate

Algo me impressiona no Inominável. É sua capacidade de enterrar-se sozinho, sem necessidade de perguntas, quando se põe a falar do plano golpista, que ele chama de cogitações. O pântano que ele mesmo criou é seu atoleiro e não aparece ninguém para impedi-lo de afundar cada vez mais na fossa movediça em que tenta nadar de braçada. 

Seus comparsas estão se virando nos trinta para votar um projeto inconstitucional de anistia aos aloprados de 8/1, para beneficiá-lo, e ele já disse acreditar piamente na vitória da empreitada. Só que, para incluí-lo, terão que atribuir-lhe algum crime para dele ser anistiado. 

Simples assim. Mas agora é que a porca torce o rabo. Qual seria o crime, se não estava aqui no 8/1 de 2023? Dirão que ele incitou a turba a fazer aquilo antes de se mandar para a Disney? Dirão que a prova disso foram as arruaças que aconteceram em Brasília durante o acampamento no QG do Exército e ele não deu um pio para contrariar o que faziam? Dirão que quem cala, consente? Dirão, ainda, que é direito do presidente que não se reelege tramar um golpe de estado porque ficou aborrecido com a derrota? 

Não sei o que vão alegar, mas pelo que estão tentando vão empurrá-lo ainda mais para dentro da vala da qual nem dez juntas de bois do gado à disposição conseguirão resgatá-lo. Vão acabar se juntando a ele no fundo da fossa. 

Quem pode salvá-los é quem está sendo pressionado por eles a pôr o projeto em votação em regime de urgência: o presidente da Câmara, também um integrante do gado, mas com um tino político que surpreende a todos. Ele está vendo que o pessoal corre em manada para o abismo, faltam-lhes nada menos que 98 votos para obterem a maioria, mas mesmo assim vão em frente. 

E mesmo se, para espanto geral, arrebatarem os votos que faltam, o raio do projeto terá de passar por outras nove comissões na Casa (porque a urgência o Hugo Motta não vai dar). E após isto terá de enfrentar a dura pedreira do Supremo Tribunal Federal. E como se fosse pouco, ainda teria de passar pela sanção presidencial. Isto é, pelo crivo do presidente que eles tentaram derrubar — e, antes disto, outros doidos tentaram matar com uma dose de veneno, juntamente com seu vice, sabe-se lá em que banquete, reservando balas de fuzis apenas ao juiz que chamam de cabeça de ovo, o mais odiado de todos que têm pela frente. 

Esse bando de doidos, para mal dos pecados, é trumpista e bate no peito para dar razão ao tarifaço dos EUA contra nosso próprio país e todos os demais vistos como exploradores da tal América, que até ontem foi a exploradora vil e contumaz, e agora, num piscar de olhos, virou a maior vítima do malvado mundo capitalista. 

Com que cara vão ficar os usuários de bonezinhos vermelhos, lá e cá, com a sigla MAGA na testa, quando os EUA entrarem na pior recessão desde o crack da bolsa de 1929? Como ficará a cara do governador de SP? A cara do Inominável, que em sua última entrevista defendeu o tarifaço trumpista, sem saber ainda do que se tratava?

O tarifaço de Trump anunciado ontem leva os EUA e o mundo à beira do abismo, com recessão e inflação por toda parte. É um tipo de chantagem que nunca se viu nos tempos modernos. Custa crer que tenha defensores aqui dentro. 

Todo esse pessoal quer o caos para dentro dele encontrar seu lugar. E mamar mais um tanto nas tetas do Estado brasileiro. Nunca fizeram nada pelo desenvolvimento econômico e social do país. Não têm nenhum projeto de tal teor para mostrar de seu. Só politicagem e tretas para se arrumarem, seja com peculatos explícitos, seja com projetos faraônicos irrealizáveis para subtrair o dinheiro público aos seus bolsos.

Seja, ainda, com emendas parlamentares feitas de encomenda para desviar dinheiro público, hoje nas alturas dos R$ 50 bilhões ao ano — um quinto do que o governo tem no orçamento para investir planejadamente em infraestrutura e obras necessárias ao nosso desenvolvimento. 

Tudo inconstitucional, porque o Legislativo não tem na Constituição original de 1988 nenhum dispositivo que lhe permita assumir funções do Executivo. O máximo que poderia é fazer sugestões, às claras e competentes, para destacar obras e investimentos, em saúde, educação, habitação ou transporte, por exemplo, que os governos nos três níveis estivessem deixando de ver ou valorizar. 

Até o momento só um personagem dos três Poderes comparece para pôr  o dedo na ferida dessa bandalheira. O ministro Flávio Dino cumpre papel que logo mais suplantará o de Alexandre de Moraes na recondução do país à democracia implantada pela Constituição Cidadã. 

Oxalá chegue o dia dessa depuração, pois o assalto aos cofres públicos não pode passar impune, enquanto assistimos ao julgamento da cúpula golpista que, felizmente, fracassou no seu intento. E o mesmo ainda não se pode dizer da nova leva de anões do orçamento, que corre leve e solta pelos corredores do Congresso Nacional, cada vez mais faminta e ousada, e só agora encontra uma barreira de peso,  estatura e disposição para o bom combate. 

Que viva Dino! 

Nelson Merlin é jornalista aposentado e ainda boquiaberto com o que se vê no Brasil e no mundo. 

3/4/2025

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