Melhor para Tarcísio

Auto-anunciado como ungido pelo pai, Flávio Bolsonaro (PL-RJ) conseguiu agitar a sexta-feira com o lançamento de sua candidatura à Presidência da República. Deixou a direita perplexa, irritou aliados de peso como o pastor Silas Malafaia, derrubou a Bolsa, acelerou o dólar, e até antecipou comemorações entre lulistas. O ato extemporâneo do zero um repôs o nome Bolsonaro no jogo e, ainda que à primeira vista não pareça, fez multiplicar as chances do governador de São Paulo Tarcísio de Freitas (Republicanos).

O movimento de Flávio alforria Tarcísio. O governador se livra da pressão dos bolsonaristas-raiz, que têm provocado danos na sua ensaiada aura centrista. E o consolida como o preferido no embate contra Lula, tanto no espectro político quanto do mercado, podendo articular longe dos holofotes. Agora, ele se prepara para ser aclamado.

Nem o reconhecido estrategista Gilberto Kassab – aquele que não é “nem direita, nem esquerda, nem centro” -, hoje secretário de Governo de Tarcísio, conseguiria arquitetar um plano melhor. De certa forma, ele até andava meio macambúzio com a expectativa, tida como certa, de que Bolsonaro apontaria Tarcísio como candidato ainda neste ano. Preferia que o jogo para valer começasse em março. Venceu.

O ex Jair Bolsonaro nunca escondeu que queria ter seu nome na cédula presidencial de 2026. Primeiro, incentivou projetos de anistia que pudessem beneficiá-lo, o que teria motivado as ações anti-Brasil do deputado Eduardo. Auto-exilado nos Estados Unidos desde o Carnaval, o zero três fez campanha pró-sanções de Donald Trump, orgulhando-se publicamente dos êxitos obtidos – a taxação de exportações brasileiras e as punições aos ministros da Suprema Corte. Com o naufrágio da anistia, Bolsonaro parecia preferir jogar com os prazos, empurrando a escolha do nome para a disputa presidencial para o ano que vem.

No período em que podia receber visitas de políticos na prisão domiciliar, conversava e desconversava sobre a disputa. Dava alento aos pretendentes, acariciava Tarcísio, mas nada decidia. Para o bem ou para o mal, manteve-se como foco das atenções.

Levado à cela da Polícia Federal depois de tentar detonar a tornozeleira eletrônica com um ferro de solda, de lá não mais saiu, iniciando o cumprimento da pena de 27 anos e três meses. Visitas, só da família. Do lado de fora, as notícias sobre ele foram minguando. Talvez para não se auto-condenar ao ostracismo, lançou a bomba de sexta-feira.

Há diferentes versões sobre a escolha de Flávio. A primeira dá conta de que a conversa com o pai teria ocorrido na terça-feira, um dia depois de a crise entre os filhos e a ex-primeira-dama Michelle escalar devido a divergências sobre palanques regionais.

Não existem explicações para o hiato de quatro dias entre a unção e o anúncio, que teria sido antecipado por políticos aliados, mesmo com o ex impedido de receber visitas fora do núcleo familiar. Tudo para lá de estranho. Mais: em entrevista exclusiva a este Metrópoles, o senador disse que a candidatura foi um “pensamento” do pai, que, é bom lembrar, alegou confusão mental para justificar a paranóia no caso da tornozeleira. De qualquer forma, a indicação de Flávio foi corroborada pelo restante do clã e pelo presidente do PL, Valdemar Costa Neto. E, bingo! Bolsonaro, via Flávio, recuperou protagonismo e virou notícia de novo.

Depois de duas idas e vindas a São Paulo, Flávio disse que Tarcísio o encorajou. Por óbvio, não seria diferente. Até porque, embora pareça o contrário, a vitória de Tarcísio neste round é incontestável. O senador deve brincar até o Carnaval, rodando o país, criando fatos, juntando likes. Depois da folia, o mais provável é a direita – Centrão e Cia -, que até quer o aval de Bolsonaro mas sem depender dele, solte de vez os grilhões e “clame” pela “solução” Tarcísio.  Pode ser que com a volta ao jogo, o ex consiga emplacar o candidato a vice.

Até no roteiro adverso para Tarcísio, ele se dá bem. Se a improvável candidatura de Flávio vingar, o “leal” governador se contenta com a reeleição, tida como garantida.

Diante disso, em vez de comemorar, lulistas deveriam montar guarda, reforçar o plantel e tentar ampliar apoios – cada vez mais difíceis. Afinal, 2026 não é 2022, quando, no pós-pandemia, Lula arrebanhou moderados em nome da democracia.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 7/12/2025. 

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