Flagrado com a boca mergulhada na botija, o líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), nem mesmo corou ao dizer que os R$ 470 mil em espécie achados pela Polícia Federal em seu flat brasiliense eram de um imóvel que vendeu em algum lugar de Minas Gerais. Sem se lembrar da localização ou do dia da transação, ele caprichou na desfaçatez: não teria depositado o valor “por um lapso”. Ao “esquecer” quase meio milhão de reais dentro de um saco de lixo no armário do quarto, ele enriquece a despudorada criatividade dos políticos quando o dinheiro vivo salta de malas e cuecas.
Corrupção não é novidade no Brasil. Vem da época do Império, galopou na Crise do Encilhamento no início da República. Ainda que em alguns momentos recentes, como após o Mensalão ou a Lava-Jato, a roubalheira até pareça diminuir, políticos estão sempre a lembrar que ela segue firme e forte. Na maioria das vezes, impune.
Líder dos Anões do Orçamento, esquema de desvio de verbas orçamentárias desbaratado em 1993, o deputado alagoano João Alves jurou de pés juntos ter ganho mais de 200 vezes na loteria. “Deus me ajudou e eu ganhei dinheiro.” Renunciou antes de ser cassado – virou folclore e fez escola. O deputado paranaense Fernando Giacobo, que já foi do PPS e hoje engrossa as fileiras do PL, também é um sortudo que diz ter acertado 12 vezes na loteria, explicando assim o crescimento do seu patrimônio.
Guarda-roupa é esconderijo reincidente. Na Operação Prato Feito, realizada em 2018, foi entre cabides e gavetas do ex-prefeito de Mongaguá Artur Parada (PSDB) que a PF encontrou R$ 4,6 milhões e US$ 216 mil em espécie. As diligências também alcançaram o ex-prefeito de Mauá, Atila Jacomussi (PSB), que escondia R$ 80 mil na dispensa, dentro de panelas.
Embora pouco eficaz, a roupa íntima masculina parece ser o esconderijo preferido. Nada menos de US$ 100 mil recheavam a cueca de José Adalberto Vieira da Silva, assessor do irmão do presidente do PT à época, José Genoíno, José Nobre Guimarães (CE), hoje líder do PT na Câmara. A ocorrência, em 2005, nada teve como consequência.
Em 2019, a cueca do ex-prefeito tucano de Uiraúna, João Bosco, guardava R$ 25 mil, descobertos pela PF ao escarafunchar obras superfaturadas no sertão paraibano (Operação Pés de Barro). No ano seguinte foi a vez de o senador Chico Rodrigues (DEM-RR) ser pego com dinheiro nas nádegas. A PF apurava desvio de verbas destinadas ao combate da pandemia, que bateram em R$ 20 milhões. As evidências envolvendo o senador, rei das emendas secretas no período do ex Jair Bolsonaro, dormiram nas gavetas do ex-Procurador-Geral da República, Augusto Aras.
Investigado também por desviar verbas de emendas, o deputado Josimar Maranhãozinho foi filmado pela PF carregando caixas com maços de dinheiro. Nada menos do que R$ 250 mil. Disse que usava o “recurso em espécie” para “pagar parte do débito de aquisição de equipamentos”. Isso foi em 2021. Hoje, ele continua exercendo o mandato e é presidente do PL do Maranhão.
O rol só cresce. Recentemente, a PF achou inexplicáveis R$ 90 mil em espécie no carro do ex-presidente da Assembleia do Rio, Rodrigo Bacellar (União Brasil), que, atraído à Superintendência Regional para um encontro formal, saiu de lá preso. Encarceramento preventivo rapidamente suspenso pelo plenário do parlamento fluminense. Até agora, ninguém sabe os motivos pelos quais ele carregava a bufunfa dentro do bólido.
Geddel Vieira Lima, ex-ministro do presidente Michel Temer, foi um dos poucos que cumpriu pena por esconder dinheiro vivo. Na verdade, uma dinheirama – R$ 51 milhões em malas de viagem dentro de um apartamento vazio, em Salvador. Ele e o irmão, o então deputado federal Lúcio Vieira Lima, foram condenados em outubro de 2019 pelo Supremo Tribunal Federal pelos crimes de lavagem de dinheiro e associação criminosa. Já estão soltos e, de quando em vez, Geddel pode ser visto em reuniões políticas.
Licitações fajutas, desvios de contratos, proteção a milionários amigos, a exemplo dos donos da Americanas ou do Master, obras fantasmas ou intermináveis, emendas parlamentares secretas, com dinheiro a rodo sem qualquer rastreamento. Certos de que a punição não virá ou, se vier, será curta, nem o céu é limite para a rapinagem – acinte justificado com o descaramento de sempre.
Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 21/12/2025.
