É você?, pergunta, desconfiada, admirada, irritada.
Sim.
Nossa! Tanto tempo.
Poucas palavras, mas o tom da voz era o mesmo. Pouco mais forte, afinal, 40 anos depois. Senti a rejeição, o desprezo a irritação, tudo em menor escala.
Mas, o que aconteceu para você me ligar? Antigos problemas
Nada. Nada mesmo, foi apenas para agradecer a visita que você me fez na noite passada.
Ãh – que visita?
Parei.
Não descobrira até então a forma delicada de lhe contar que boa parte da noite a memória aflorou imagens da pós-adolescência, marcada por aqueles cabelos negros, lisos e longos esparramados sobre fronhas muito brancas; os olhos negros cerrados, o sorriso de prazer no rosto a mostrar covinhas nos cantos dos lábios.
Sim, foi um sonho onde você me apareceu com 21 anos.
Ah! ! ! você e sua imaginação.
Do outro lado, desapareceram os dois vincos entre as sobrancelhas e abriu-se o sorriso que antes me encantou.
Que sonho foi esse, conta.
Não devo.
Ahhh !!!!!
Liguei para ouvir sua voz e para confirmar sua permanência em minha memória.
Tá, obrigada.
Desligou.
Nada sei mais dela.
(*) José Guido Fré é jornalista.