Depois dos últimos acontecimentos, sou obrigado a admitir que a Polícia Federal não quer mesmo que eu fique de férias. Outra vez tenho que interrompê-las para não perder o que pode ser o capítulo final da novela golpista, lançada com a reeleição da Dilma, em 2014, e consumada com seu impeachment, dois anos depois.
Vivemos um momento histórico. Pela primeira vez desde o Descobrimento um ex-presidente da República está a um passo de cruzar o portal. Refiro-me não aos arcos esotéricos do misticismo, mas às portas de aço e ferro da Papuda — uma das coisas reais e concretas deste mundo de ilusões.
Pela primeira vez em nossa história, suas celas abrigarão um ex-presidente e respectivos comparsas. No mínimo por 24 anos em regime fechado. Mas como nosso sistema de encarceramento é muito benigno, após seis anos poderão sair durante o dia, voltando à noite ao regaço do novo lar.
O castigo é merecido. Durante quatro anos infernizaram a parte saudável da população com ameaças de prisão dos inimigos e com golpes de estado, dia após dia. E das ameaças partiram para atos concretos de intimidação, iniciados com o foguetório lançado para incendiar o prédio do STF em 2020. O palavrório golpista do então presidente deu lugar a atos explícitos de ataques físicos às instituições por seus asseclas. Não poderiam passar impunes. Nem os atos nem tampouco as ameaças supostamente protegidas pelo escudo da liberdade de expressão.
A Polícia Federal ainda vai debruçar-se sobre o produto da pescaria de ontem, 8 de fevereiro, a exatos 13 meses da farra golpista do ano passado. Os cabalistas da direita poderão dizer que teve o dedo do PT na escolha da data, por não admitirem que o dedão do Xandão possa ser ainda mais pesado.
E de fato será. Um amigo pescador me diz que tem mais peixe para pegar. O mais novo cabeça de bagre é o senador Mourão, que deve o cargo aos aloprados gaúchos que não param de chamar ETs com as lanternas de seus celulares. Pois não é que o ex-vice — que nada fez durante seu curto reinado, tendo inclusive levado pauladas do chefe e dos seus pares por suas omissões — toma agora as dores do ex-cabeça de chapa?
Ou está querendo herdar o espólio do ex ou foi atingido pelo mal da vaca louca. Aquela mesma que levou seu xará Olímpio a autodenominar-se Vaca Fardada e descer a serra da Mantiqueira em 31 de março de 1964, levando o golpista Castello Branco a antecipar o golpe para o primeiro de abril daquele ano.
Alguém poderia dizer ao senador que os tempos mudaram, que a instigação ao golpe agora é crime e não liberdade de opinião. São tão assanhados esses golpistas que se esquecem dos rigores da lei, mas ao que parece não existem boas almas no bolsonarismo para alertá-lo das consequências do palavrório. O senador quer botar pra quebrar, para delírio da plateia golpista.
Não sei o que fará Pacheco, mas sugiro que o circunspecto presidente do Senado chame o comandante do Batalhão de Operações Psicológicas — que eu soube agora, graças aos federais, que existe e tem sede em Goiás, ali do lado — para trazer o general reformado por Dilma de volta à realidade.
Perdeu, mané! Não amola! Ou vai pra cana também!
Nelson Merlin é jornalista aposentado e assombrado.
9/2/2024