De um lado, um mercado terrorista; do outro, um Congresso chantagista; e num terceiro lado desse triângulo nada amoroso tem um ajuste fiscal a fazer, herdado de um presidente que gastou dinheiro público a rodo para se reeleger e deixou a conta para o governo seguinte.
Mercado e Congresso querem tirar o seu da reta. Não aceitam isenção de IR para a classe média; não aceitam taxação sobre dividendos; não aceitam taxação extra, ainda que mixuruca, sobre salários acima de 50 mil reais; não aceitam redução dos supersalários do setor público; não aceitam taxação plena das grandes fortunas, prevista na Constituição e nunca regulamentada porque as elites (no mercado e no Congresso) não deixam.
Mercado e Congresso não querem pagar um tostão da conta do ajuste. Adivinhe quem eles querem que pague?
A indústria e o agro mamam nas tetas do governo há décadas. Nem a metade das renúncias fiscais reverte em ganhos para o Tesouro, que foi generoso na concessão dos favores, acreditando, ingenuamente, que reverteriam em empregos, renda para os trabalhadores e arrecadação para o governo.
A diferença entre o que entrou e o que (não) saiu recheou os bolsos dos próprios beneficiários, e isso não é de hoje, embora só se fale dos 17 setores aquinhoados pela Dilma — depois injustamente derrubada por um golpe parlamentar a troco de míseros 2 bi de reais meramente contábeis, transferidos do saldo da conta safra do Banco do Brasil para fechar o orçamento federal. O governo anterior gastou 700 bilhões de reais (350 vezes o rombo da Dilma) de dinheiro público em 2021/2022 para se reeleger e a dupla Mercado&Congresso não achou nada demais.
O cabo de guerra entre mercado e Congresso, de um lado, e o governo de coalizão do PT está custando uma alta desbragada do dólar que refletirá nos preços pagos pela população para comer, vestir, usar os serviços públicos (luz, água, telefone, combustíveis etc) e continuar tocando a vida, já que a esperança de tempos melhores é a última que morre.
O que o mercado quer? Grana! O que o Congresso quer? Grana! O que o governo quer? Quer que o pobre coma, que o pobre more, que o pobre consuma, que o pobre tenha escola para os filhos e saúde para a família.
O mercado e o Congresso não querem nada disso. Querem salário mínimo arrochado (como na ditadura), num país que já paga o mais parco salário mínimo das Américas! Querem BPC massacrado e Bolsa Família idem (mas não se atrevem a dizer). Querem jogar o SUS para baixo da ponte, como fez o soldado da PM do Tarcísio com o motociclista. Querem aposentadoria abaixo da inflação e do salário mínimo (isso também não se atrevem a dizer, só no particular).
Querem que o pobre pague a conta.
Querem que o pobre morra!
Nelson Merlin é jornalista aposentado e pelas tampas.
20/12/2024