Chutes na alma

No meio da desgraça acontece uma polêmica. Uma não, duas. E sem pé nem cabeça, mas com potencial de atrapalhar ao máximo a ajuda aos que precisam recomeçar a vida do zero. 

O primeiro chute veio do governador do Rio Grande do Sul. Não sei — ninguém sabe — o que deu nele para dizer que está vindo ajuda material demais aos desabrigados e isso vai prejudicar o comércio local, em situação já muito difícil. 

Como é que é?! — perguntaram-se todos. O comércio está debaixo d’água em todo o estado, a indústria também e a agricultura, idem. O comércio não tem nem pra quem vender, com 2,1 milhões de pessoas impactadas diretamente pelas enchentes. E aí vem o governador tratar a ajuda que os gaúchos estão recebendo de outros gaúchos e da população de outros estados como se fosse uma forma de contrabando a prejudicar a economia do Rio Grande? 

O que deu nele?! 

Nem ele sabe. Logo após o espanto geral, parece que a ficha caiu e, felizmente, em vez de tentar uma explicação para o inexplicável, engoliu em seco, pediu desculpas e não falou mais nada. 

Pelo menos não fez como o outro, de triste memória, que durante a pandemia que matava brasileiros e brasileiras de norte a sul, disse que não era coveiro e não tinha nada com isso. E ato contínuo, imitou em vídeo oficial as vítimas morrendo de Covid por falta de ar. Gostou tanto da primeira interpretação, que repetiu a perfomance em outra live. 

O que faria o desalmado se fosse o governador do Rio Grande? Aposto uma caixa d’água que imitaria as vítimas da enchente morrendo afogadas. 

Não quero com isso minimizar a barbaridade que disse o governador Eduardo Leite. E peço desculpas às 700 mil famílias dos mortos pela Covid por recordar o que fez o Ignóbil  no auge da pandemia. Era para ter sido varrido do mapa moral e político brasileiro, mas continua por aí, presidente de honra do PL, pedindo votos aos comparsas e anistia pelos seus crimes — até este sábado coberto de cobreiro nas pernas e obstrução intestinal, deitado numa cama de hospital já fazia mais de 10 dias, mais até do que ficou (8 dias) quando levou a facada de Juiz de Fora.

O segundo chute vem da bancada da bala no Congresso. Foram reunir-se com o ministro da Justiça, que não sei por quê de pronto os recebeu. Disseram estar muito preocupados com o inquérito que o governo federal pediu à AGU e esta ao Judiciário para apurar responsabilidades sobre as mentiras espalhadas na internet contra o governo federal e as Forças Armadas durante a calamidade no Rio Grande. 

Foram, de certa forma, solidarizar-se com os ratos, não com os de quatro mas com os de duas pernas que enchem as redes sociais com suas fezes mentais. Sem nenhum pudor, Suas Excremências vestiram a carapuça e foram dizer ao ministro da Justiça que os inquéritos podem acabar com a oposição! 

Nunca vi uma confissão de culpa tão explícita e descarada. Para eles, vale tudo para incentivar as fake news e melar a ajuda do governo federal aos desabrigados e à reconstrução do Rio Grande. Segundo medições da Fundação Getúlio Vargas, um terço do que circula nas redes sociais sobre as enchentes e a ajuda oficial é fake. Eles não podem perder um “capital” desses. 

Chama atenção o ministro Lewandowski tê-los recebido. Já tivemos ministros que bateriam a porta na cara desse tipo de gente. Bons tempos aqueles. 

No mais, o pangaré Caramelo se recupera bem, seu dono continua sumido e uma égua foi resgatada pela janela do terceiro andar de um prédio em São Leopoldo, na Grande Porto Alegre. Fora levada para lá pelo dono desesperado que não queria vê-la afogar-se. 

Tem gente com amor à vida. À sua, à dos outros, à dos animais, à das florestas. A bancada da bala ama o ódio, a mentira e seu próprio fel. 

Nelson Merlin é jornalista aposentado e com a paciência depois do limite. 

16/5/2024

     

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