Hasta la vista!

Tantas mensagens mandaram para o espaço com as poderosas lanternas de seus telefones celulares que finalmente foram atendidas. As tias do zap, como se intitulam, comemoraram eufóricas em Buenos Aires, domingo passado, vindas diretamente do Paraná e outras partes, a posse do alienígena ultrarradical de direita Javier Milei, novíssimo presidente da República Argentina. 

Estão fora de si de alegria e felicidade. Tanto que querem a partir de agora curtir suas aposentadorias na terra dos hermanos. Vão se mudar para lá. 

Não quero estragar a festa, mas o extraterrestre recém eleito prometeu que, se já era ruim antes, vai ficar muito pior agora! 

Nunca vi um presidente em seu discurso de posse prometer o pior para seu povo. Os eleitores aplaudiram. As tias brasileñas adoraram. 

Están todos locos? 

Ralei quase 50 anos no jornalismo de trincheira, peguei os anos de chumbo no auge da ditadura dos generais e os anos mais respiráveis da redemocratização —, quando a tortura se mudou dos quartéis para as delegacias de polícia e mudou seus alvos de brancos rebeldes para jovens negros e pobres. Nunca vi nem ouvi da direita a promessa de tempos piores. Nem o inominável de 2018 em sua campanha sórdida chegou a tanto. 

A Argentina dos alfajores e dulces de leche inigualáveis, assim como suas carnes e o beefstake de chorizo, agora nos apresenta a mula sem cabeça versão porteña.

Não precisamos pensar muito para ver onde isso vai dar. O último exemplar que não era nem parecido com esse de agora durou dois anos. Fernando de la Rua foi para o olho da rua no começo dos anos 2000 num helicóptero que decolou da Casa Rosada levando o então presidente para seu exílio pessoal — talvez algum lugar dos Andes ou da Patagônia. Sumiu, e nunca mais deu as caras. 

O que de la Rua fez? Só uma pequena porção do que Milei jurou de pés juntos que vai fazer agora. Corte total dos subsídios, incluindo energia e transporte público; desestatização total da economia, incluindo YPF e Aerolineas Argentinas; fim total das pensões e aposentadorias e sua substituição por um sistema de (in)seguridade privado; fim total da educação pública; redução drástica das verbas da saúde pública y otras cositas más, incluindo uma desvalorização brutal do peso. 

Não sei se dou, democraticamente, boa sorte ao novo presidente. Como dar boa sorte para um semovente que corre desatinado para o abismo? 

Também não sei se desejo boa sorte aos hermanos. Como lhes desejar tal coisa tão boa se se agarraram às calças do destrambelhado e correm juntos para o mergulho final nos Saltos de Iguasu? 

Seja como for, e me desculpem qualquer coisa, hasta la vista, Carajos! 

NR 1 — Carajo não é palavrão na Argentina. Corresponde ao nosso caramba, ou, se quisermos ser mais ousados, ao nosso inofensivo Cacilda, que o inesquecível Mussum rebatizou de Cacildis. 

NR 2 — Devo este comentário ao repórter Adriano Wilkson, do UOL, que achou as tias do zap em Buenos Aires e me propiciou deliciosas gargalhadas quando li sua matéria. 

NR 3 — este artigo foi escrito antes de Milei reunir-se com o representante chinês logo de cara, suponho que para rogar por sua intermediação junto a Xi Jinping para que conceda um swap cambial à Argentina, no valor de 6,5 bi de dólares. Se já era vermelho, Papai Noel agora é de olhinhos puxados e comunista de carteirinha. Mas cheio de dinheiro, que importa? 

Nelson Merlin é jornalista aposentado, agradecido e estupefato. 

14/12/2023

Comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *