Está bom ou regular?

O país está tão polarizado que fica difícil responder a uma pergunta simples: “Como o senhor/a senhora classifica a administração do presidente Lula? Ótima, boa, regular, ruim ou péssima?”

O Ipec, sucessor do velho e bom Ibope, fez a pergunta a duas mil pessoas em 127 cidades do país entre 1º e 5 de junho, e 37% responderam ótimo e bom, contra 28% que disseram ruim ou péssimo; 32% cravaram regular.

Quando vi a notícia no Globo da sexta-feira, 9/6, fiquei pensando: se eu tivesse sido um dos dois mil pesquisados, como teria respondido?

O que eu de fato acho é que, após cinco meses, o governo Lula merece um “regular”. Mas, diabo, será que na hora, diante do pesquisador, eu não pensaria um pouco, avaliaria que seria melhor contribuir com um “bom”, para não ajudar, de certa forma, o lado de lá, o lado do Mal em Si?

No ônibus para não enfrentar a subida de ladeira perdiziana a pé, coloquei a questão no Facebook. No celular não escrevo com a agilidade do teclado a que estou acostumado, e evidentemente não saiu ali uma boa, ampla, séria análise do governo Lula, e sim uma rápida simplificação. Bem, aí vai ela:

“Fiquei pensando o que eu responderia se fosse entrevistado por um pesquisador do Ipec.

Será que eu diria ‘bom’, pensando em dar um voto de confiança?

Ou cascaria logo o ‘regular’?

Estatizante, anti-mercado, anti-empresas privadas, só com idéias obsoletas para a economia. Mas positivo em direitos humanos, meio-ambiente.

Um horror na política externa. Mas empenhado no social.

Isso é bom ou regular?”

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Dois comentários – ambos feitos por pessoas que conheço bem, e são bastante cultas, muito bem informadas – escancaram como nós estamos divididos, após anos e anos de nós x eles, Fla x Flu:

* “Voto no bom. Excelente nunca existirá. Mas, vale a pena. Só não ter um idiota como Bolsonaro no governo vale mil. Só não ter aquele clima de golpe vale mil. Só por ter alguém que tem projetos para o país, como na vacinação extensiva e cuidar da população indígena, vale dez mil. Nunca na minha vida imaginei viver um pesadelo como esse governo Bolsonaro.”

* “Essa é uma das nossas tragédias. Ter de avaliar bem a mediocridade de um porque o outro era um pesadelo.”

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Na mesma sexta-feira pós feriado de Corpus Christi em que O Globo divulgou a nova pesquisa Ipec, Elena Landau publicou um esplêndido artigo no Estado de S. Paulo, com aquela lucidez que caracteriza o pensamento dessa mulher admirável; Mas foi só hoje, sábado, que o li.

Elena Landau respondeu de forma categórica à minha dúvida.

E esculpiu uma daquelas frases que dão inveja na gente. Como diz o Milton Nascimento sobre os versos de Paul McCartney a respeito do racismo: “Como não fui eu que fiz?”

Lula, resumiu Elena, “não só está de volta ao passado, como se recusa a entender o futuro”.

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Os brincos de Sonia Guajajara

Por Elena Landau, O Estado de S. Paulo, 9/6/2023

Não esperava muito do governo Lula 3. Sua eleição importava para livrar o País de Bolsonaro. Mais quatro anos de destruição nas agendas climática, de direitos humanos e educacional teriam efeito irreversível. Tinha esperança de mudanças radicais.

Qual o quê.

Saiu Orban, entrou Maduro, e Putin ficou no mesmo lugar. Lula partiu para o abraço a ditadores sem enrubescer. Esse governo não liga muito para inserção internacional, pelo menos não com o Ocidente. É a infantil e ultrapassada agenda Amorim e seu antiamericanismo no comando. Uma desculpa esfarrapada — a obsessão com conteúdo doméstico — é usada para barrar o acordo União Europeia-Mercosul.

Se não tem democracia na agenda internacional, também não veio a economia verde. Os dois mais importantes pilares para a reinserção do País no mundo foram esquecidos. A mesma caneta que veta trechos da lei que colocava a Mata Atlântica em risco, ou lança um pacote para a Amazônia, assina mais incentivos a meios de transporte, individuais ou coletivos, poluentes. Lula ainda não entendeu que o mundo mudou, que economia verde é muito mais que preservar florestas. Não só está de volta ao passado, como se recusa a entender o futuro.

Na contramão do mundo, que investe na eletrificação e descarbonização, da tecnologia à educação, anuncia mais subsídios a carros “populares” pela módica quantia de R$ 60 mil. Anos fora da política devem ter feito ele esquecer quem são os pobres neste País. E junto vem, de novo, os tais componentes nacionais. Vamos continuar a montar carroças. Nostálgico, repete a desastrosa política de informática brasileira, agora na busca de autossuficiência em microprocessadores. Taiwan que se cuide.

O País parece estar fadado a um crescimento medíocre de baixa produtividade. Abertura comercial está fora da agenda; adeus ao acesso a insumos de qualidade e tecnologia mais avançada. Não se fala em capacitação de mão de obra, nem mesmo para ajustar o mercado de trabalho aos novos tempos pós-pandemia. Camilo Santana, ninguém sabe, ninguém viu. Imaginem então os impactos do avanço da IA sobre nós.

Há muita gente ainda tolerante a tantos equívocos. Faço um teste a cada passo em falso desses e pergunto: “E se fosse Bolsonaro?”. O que não serve para um, não pode ser aceito para outro. Vale da indecorosa indicação de Zanin ao novo avião para atender aos caprichos do primeiro casal ao custo de R$ 500 milhões. É o pobre no orçamento.

Me apego aos brincos de Sonia Guajajara. São lindos, simbólicos de nossa cultura, e refletem a força dessa mulher. Que inspirem o STF.

10/6/2023

 

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