Ou Lula ou o horror (9)

Nesta última semana antes do segundo turno das eleições presidenciais, o primeiro-ministro de Portugal, António Costa, o presidente do governo da Espanha, Pedro Sánchez e o prefeito de Roma, Roberto Gualtieri declararam apoio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O ex-presidente José Sarney fez o mesmo, e Fernando Henrique Cardoso postou nova declaração a favor de Lula.

A Nature, uma das mais importantes e influentes revistas científicas do mundo, já havia afirmado que “há apenas uma opção na eleição do Brasil – para o país e o mundo. Um segundo mandato para Jair Bolsonaro representaria uma ameaça à ciência, à democracia e o meio-ambiente.”

Nesta quinta-feira, The New York Times, um dos mais importantes jornais do mundo, lançou um vídeo de mais de 6 minutos com uma fortíssima, virulenta, defesa da eleição de Lula. O título do vídeo é “A eleição presidencial do Brasil vai determinar o futuro do planeta”, e nele o jornal afirma que “o dia mais importante para o planeta Terra e para a sua sobrevivência é 30 de outubro.”

O New York Times publicou no Twitter o seguinte: “No domingo, os brasileiros vão às urnas para eleger seu próximo presidente. Mas em jogo está algo muito mais importante do que a liderança da maior economia da América do Sul.” E abaixo vem o link para o vídeo.

O vídeo é espetacular, impressionante, impactante. É incrivelmente bem feito, com imagens chocantes sobre a destruição de grandes partes da floresta Amazônia. Segundo informou o jornal Valor, o vídeo foi produzido por Agnes Walton, jornalista do NY Times, e Alessandra Orofino, co-fundadora da ONG Nossas, que atua na área ambiental no Brasil.

Dirigido, é claro, ao público americano, o vídeo começa explicando o tamanho e a importância da Floresta Amazônica para todo o planeta, para depois mostrar como os quatro anos de Bolsonaro levaram a números recordes de desmatamento. Alguns dados apresentados:

* “Esta floresta tropical é tão vasta – dez vezes o tamanho da França – e toda ela está correndo o risco de virar uma zona morta.”

* “Um quinto da água doce do mundo está na Amazônia, e as fazendas americanas são irrigadas por chuvas que vêm – sim – da Amazônia.”

* “Ela tem 390 bilhões de árvores, quase duas vezes mais que os Estados Unidos. Corte-as, e bilhões de toneladas de CO2 atingirão a atmosfera.”

O vídeo traz uma entrevista com Txai Surií, a ativista que já discursou em eventos internacionais como a COP 26. A moça afirma para o espectador norte-americano: “Um candidato quer salvar a Amazônia. O outro quer queimá-la. (…) Você também precisa da Amazônia para sobreviver. E em breve seu destino será decidido por um desses dois homens.”

E a narradora passa a falar de Lula e Bolsonaro. Mostra que no governo de Lula houve declínio acentuado do desmatamento – e, nos últimos quatro anos, o desmatamento é recorde, com a virtual destruição dos sistemas e organismos de proteção da floresta – Ibama, ICM-Bio…

Mas, diabo, porque estou aqui tentando relatar o que mostra esse vídeo, se ele pode ser visto?

É para ver muitas vezes. Mesmo quem não saiba nada de inglês vai compreender perfeitamente o que o vídeo do New York Times mostra.

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(Não é muito elegante nem educado a gente dizer coisas do tipo “eu avisei”, “eu falei isso antes” – mas não consigo me conter. O excelente editorial da revista Nature dizendo que “um segundo mandato para Jair Bolsonaro representaria uma ameaça à ciência, à democracia e o meio-ambiente” foi na terça-feira, 25/10. Esse fantástico, sensacional vídeo do New York Times surgiu nesta quinta, 27/10. No dia 10/10, no segundo volume desta série “Ou Lula ou o horror”, eu havia escrito: “Mais ainda do que uma ameaça à democracia brasileira, Jair Bolsonaro é uma ameaça ao planeta Terra.”)

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O apoio do primeiro-ministro de Portugal, António Costa, veio a público na segunda-feira, 24/10 – e ele, naturalmente, citou a questão ambiental. Em vídeo, Costa, que pertence ao Partido Socialista, o do grande Mário Soares, diz o seguinte:

“O mundo precisa de um Brasil forte, um Brasil que participe das grandes causas da humanidade, do combate à desigualdade, da luta pela saúde e que enfrente as alterações climáticas. (…)_ O mundo e o Brasil precisam de Lula da Silva presidente.” E finalizou dizendo que sentia “saudades da amizade e da proximidade entre Brasil e Portugal”.

Uma óbvia referência aos episódios em que Jair Bolsonaro demonstrou ao mundo sua absoluta falta de educação, ao menosprezar e mal tratar o presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Souza, em duas visitas dele ao Brasil.

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O chefe do governo da Espanha, Pedro Sánchez, divulgou nas redes sociais um vídeo em que declara seu apoio à candidatura do petista à Presidência do Brasil. Sánchez lembrou que o Brasil é a maior economia da América Latina e sua voz é “imprescindível diante dos grandes desafios globais que nos unem”.  a vitória de Lula – diz ele – seria a vitória “dos progressistas do mundo inteiro”.

O apoio a Lula do prefeito de Roma, Roberto Gualtieri, veio também em um vídeo, postado pelas redes sociais do ex-presidente na terça-feira, 25/10:

“Meu caro amigo Lula. Em Roma estamos torcendo para que você volte a guiar esse grande país amado por todos os italianos. Com sua volta para a Presidência, o povo brasileiro retomará o caminho da justiça social, do desenvolvimento, do resgate que tanto merece.”

Prefeito da capital italiana desde outubro de 2021, Roberto Gualtieri é filiado ao Partido Democrata e já foi eurodeputado e ministro da Economia e Finanças da Itália.

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O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso divulgou um vídeo nesta quinta-feira, 27, em que volta a pedir o voto em Lula:

“Meus amigos e minhas amigas, você que melhorou de vida com o real, e acredita no Brasil, nestas eleições, não tem dúvida: vote no 13, vote no Lula. Ele vai melhorar mais ainda a sua vida.”

O ex-presidente José Sarney publicou uma carta aberta de apoio a Lula em seu site, na segunda-feira, 24/10/2022. Nunca tive admiração ou grande simpatia pelo veterano político maranhense, mas é preciso admitir que ele sabe escrever. E sua carta de apoio a Lula o engrandece:

“Quando, em janeiro de 1985, Tancredo Neves e eu fomos eleitos por um grande acordo da sociedade, tínhamos muito claro um compromisso: a transição para a democracia. A partir da eleição é que, no espaço cedido pela Fundação Getúlio Vargas, começou-se a detalhar números e tarefas. Antes de janeiro a tarefa não apenas era impossível por não dispormos dos dados reais sobre o funcionamento do governo, mas sobretudo porque a dimensão do que se decidiria na eleição era política e institucional, num nível superior de decisão: estava em jogo o Estado Democrático de Direito, o futuro da Nação.

“Estamos, neste momento, numa situação que tem desafios semelhantes. Disfunções dos Poderes aconteceram de tempos em tempos, mas raras vezes se viu o ataque sistemático do Executivo contra o Judiciário. Ora, guardião da Constituição, o Supremo Tribunal Federal se transformou, ao longo das gerações, no ponto de equilíbrio do nosso sistema político. O desacato de Floriano Peixoto, nos primeiros dias da República; a intervenção de Getúlio Vargas, acompanhando os Estados concentracionários europeus; o regime militar, manipulando sua composição para controlá-lo, foram momentos breves, registros inglórios de tempos sombrios. A partir da transição democrática, a Corte Suprema consolidou-se como o mais importante símbolo do Estado brasileiro, por caber-lhe sobretudo a defesa daquilo que nossa Constituição tem de melhor: a garantia dos direitos — individuais, coletivos, difusos, sociais.

“O atual contrato “secreto” entre o Executivo e o Legislativo, fixado em valores agigantados diante dos parcos recursos do Orçamento da República, é campo privilegiado para os interesses escusos. A minoria, esmagada de uma forma que não se via desde o princípio do Império — lembro que nos períodos de exceção não há maioria ou minoria —, tem como única defesa apelar para que o Judiciário faça o que não é sua função e interfira no funcionamento do Congresso Nacional.

“Um aspecto tenebroso dos movimentos políticos é sua globalização. Desde a Antiguidade as estruturas das nações assumem formas paralelas. Um exemplo é a proximidade das figuras de Trump, Orbán, Putin, Bolsonaro. Uma de suas marcas é a proliferação das fake news. Outras a xenofobia, o racismo, a divisão da sociedade. Assim se hostiliza, agora, os nordestinos, os pobres, como se fossem brasileiros inferiores. Isso atenta contra todos os princípios democráticos e até éticos. É a guerra contra a democracia, o demos, o povo.

“No próximo domingo, o eleitor decidirá se vota pelo fim da democracia ou por sua restauração. Esse voto não é para quatro anos de governo: é um voto para o destino do Brasil. O voto em Bolsonaro é voto contra as instituições, que terá como consequência anos de autocracia, um regime de força, construído na mentira sistemática e no abuso do poder. O voto em Lula — que já tem seu lugar na História do Brasil como quem levou o povo ao poder e como responsável por dois excelentes governos — é voto pela democracia, pela volta ao regime de alternância de poder, pela busca do Estado de Bem-Estar Social. A diferença é clara.

“No mesmo espírito dos que construíram em torno de Tancredo Neves a Aliança Democrática, reunindo um amplo espectro de homens públicos, agora congregamos em torno do Presidente Lula os homens de maior responsabilidade do País para formar uma nova união pela democracia. É a esperança que nos convoca.”

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Não seria possível deixar de registrar aqui nesta série “Ou Lula ou o horror” o editorial que a Folha de S. Paulo publicou no domingo, 23/10. E publicou na primeira página, como faz em algumas poucas ocasiões especialíssimas.

Eis aí:

Ameaça autocrática

Folha de S. Paulo, editorial, 23/10/2022

Nunca foi tão avassaladora a maioria de brasileiros que consideram a democracia a melhor forma de governo, de 79% segundo o Datafolha. Nunca na Nova República um presidente ameaçou a estabilidade constitucional como o atual mandatário.

Jair Bolsonaro (PL) valeu-se do cargo para constranger e ameaçar Poderes independentes, insultar autoridades e propagar uma farsa contra o sistema eleitoral diante de brasileiros e estrangeiros.

Promoveu tratamentos ineficazes de uma doença letal, retardou a aquisição de vacinas, debochou de famílias enlutadas, protegeu os filhos de investigações e atiçou militares contra o poder civil.

Conclamou arruaceiros a cercarem as seções de votação no próximo domingo (30).

A agenda que deveria ser a do futuro —educação, saúde, infraestrutura, inovação, redução da pobreza e das desigualdades— ocupou-se de temas que já deveriam estar superados. A sociedade e as instituições tiveram de gastar energia preciosa para proteger regras básicas da convivência democrática.

Agora, como nos outros oito pleitos presidenciais realizados desde 1989, os votos serão dados livremente, a apuração revelará a vontade majoritária, e o eleito tomará posse e governará com as prerrogativas e as obrigações de chefe de Estado.

Esperar que o próprio candidato à recondução tenha compreendido e acatado os limites do mandato seria pouco realista diante do que se vê desde 2019.

É melhor trabalhar com a hipótese corroborada pela experiência —tornar-se autocrata é o verdadeiro programa de governo de Jair Bolsonaro para um eventual segundo mandato.

A ameaça do arbítrio é nova apenas em aspectos acessórios, como no uso intensivo de redes sociais para disseminar ignorância, culto ao chefe e ordens de ataque. No mais, obedece ao roteiro de conhecidos movimentos subversivos da história.

Não é necessário um golpe militar para liquidar o Estado democrático de Direito. Se não for tenazmente neutralizada, a corrosão cesarista com o tempo dissolve as cartilagens que articulam as liberdades civis e a competição política.

As instituições republicanas deram seguidas demonstrações de solidez ao impedir a deriva autoritária nos últimos quatro anos. Estarão prontas, haja vista a inequívoca convicção democrática da população, para um novo período de bloqueio das investidas tirânicas caso a maioria do eleitorado brasileiro soberanamente decida pela reeleição.

27/10/2022

Este post pertence à série de textos e compilações “Ou Lula ou o horror”.

A série não tem periodicidade fixa.

Civilização ou barbárie. Essa é a escolha que os eleitores terão quew fazer domingo. Simples assim. (8)

“Só há uma opção nas eleições brasileiras – para o país e para o mundo”, diz a revista científica Nature. (7)

 

 

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