O Rei da Goiabada

Não falei que estavam pensando em mandar o homem para o Senado? Mas não é só isso o que querem. O Centrão quer dar ao chefe o título de “senador vitalício”! Não sei se vão conseguir emplacar essa, mas fica claro que o bonde do ex-capitão ou ex-tenente chegou mesmo ao fim da linha.

Eu pensava que ele fosse deixar pra lá a corrida presidencial para se candidatar ao Senado pelo voto, num Estado minúsculo, garantindo, com votação recorde, oito anos de impunidade pela frente. Mas o Centrão, macaco velho, não quer correr o risco. Melhor garantir a cadeira trazendo de volta do túmulo o pacote de abril de 1977, no qual o então ditador Ernesto Geisel criou a figura do senador biônico, com um terço do Senado nomeado pelo Poder Executivo.

Só que agora, ressuscitado, o senador nomeado vira biônico-e-vitalício!!! E é só para 1 (um) senador! Nem Geisel, que tudo podia, ousou voar tão longe! Mas o Centrão se acha muito mais do que o falecido Manda-Chuva – ele se acha o Rei da Goiabada. Lembram-se do Rei da Vela? Pois é, tem também o Rei da Goiabada esperando um autor e um Zé Celso Martinez Corrêa para lotar o teatro.

Andei pesquisando o significado da expressão. Achei uma receita muito boa. Pega umas goiabas do pé, dá uma boa escovada com o esfregão do tanque, põe com casca e tudo no liquidificador com algumas colheradas de açúcar e uma pitada de sal, para quebrar um pouco o adocicado da geleca. Bate bem até virar isso aí, uma geleca. Aí bota pra cozinhar numa panela de barro – tem que ser de barro num fogão a lenha, senão não dá liga. Deixa aquilo lá por algumas horas, talvez o dia todo. Quando cansá disperá, tira do fogo e deixa isfriá. Rala a casca dum limãozinho em cima pra gosto. A receita, com certeza, foi escrita por um mineiro e o que vem de Minas é tudibão, nossinhora. 

O cara que faz tem que comer tudo sozinho no tacho. Os outros ficam só olhando. Daí que veio a expressão. A cena termina baixando um pano rápido, porque o cara não aguenta nem mais um minuto pra ir correndo para o banheiro. E não é para chorar.

Não sei onde é que o Centrão vai arrumar voto no Congresso para aprovar essa receita salvadora e redentora para o ex-tenente ou capitão. Eu acho que nem desenterrando o Geisel isso vai dar certo. Ele vota contra. O alemão era duro na queda e certamente, por estar na eternidade, não mudou seu pensamento sobre o ex-tenente ou capitão, a quem tachou de mau soldado por causa de seus planos para explodir quartéis e esgotos no Rio de Janeiro se não dessem um aumento de salário para a tropa.

Mas não se pode subestimar o Centrão. Desde Robertão Cardoso Alves – lembram-se dele? – esse grupo disforme, fisiológico e inconfiável é o fiel da balança em todos os governos pós-ditadura. É capaz de tudo, até de transformar a geleca da goiabada no conteúdo de uma linguiça de marreco servida com purê de batata doce numa folha de bananeira. Mas essa receita eu conto depois.

Nelson Merlin é jornalista aposentado, desocupado e gourmet .

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