Vocês estão pensando que eu vou falar dos estonteantes quase R$ dois bilhões que o governo gastou com seu carrinho de supermercado? Nããã! Não vou falar, não!
Além de o assunto já ter sido comentado a semana toda nas redes sociais, daria muito trabalho tentar explicar todos aqueles itens adquiridos.
Para falar dos R$ 15 milhões gastos com leite condensado, por exemplo, eu teria de entrevistar um profissional da área da Saúde Mental para que explicasse essa idolatria ao produto. Um psicanalista, caso consultasse o paciente, provavelmente chegaria à conclusão de que isso se deve a algum trauma de infância. (Tudo é!). Talvez descobrisse que o cliente sentia inveja ao ver o menino da casa ao lado chupando uma Moça direto do buraquinho feito na lata. (Aliás, dois buraquinhos: um pra sair o ar, outro pra sair o doce e denso leite. Quem nunca?)
Como eu poderia comentar os R$ 2.203.681,89 gastos com chicletes? Teria de pedir ajuda a alguém porque não consigo imaginar como esse item foi parar na cesta (nada) básica do governo. Fiquei ruminando aqui mas não descobri quem deveria entrevistar para me passar essa informação. Então não vou comentar.
Analisando essa lista de compras acabei aprendendo algumas coisas. Aprendi, por exemplo que existe uma planta trepadeira da qual nunca tinha ouvido falar, rica em ferro e vitamina C, chamada Bertalha, extremamente benéfica à saúde dos consumidores, e que sai pela bagatela de R$ 1.280.282,70 ao ano. (Bem barato para uma trepadeira.)
Continuando a leitura da lista, percebo que não estou apta para comentar todos os itens encontrados lá, mas sobre alguns eu arriscaria um palpite.
Eles não se importaram em gastar R$ 6 milhões e meio com molho de pimenta. Por quê? Ora, porque pimenta no koo dos outros é refresco.
O que me causou estranheza, no entanto, foi o valor relativamente baixo (R$ 1.042.974,42 pago pela alfafa. Será que seu pessoal está fazendo dieta?
Como disse lá no começo que não ia comentar sobre esse assunto, vou passar para outro.
Nesta última quarta-feira, dia 27/01, o presidente Jair Bolsonaro se reuniu com o baixo clero do mundo artístico na churrascaria Planalto em Brasília. Segundo o que foi informado, o objetivo era discutir soluções para os setores de eventos, turismo e gastronomia, que foram afetados pela pandemia. Mas o que acabou sendo mostrado aos olhos do público que assistiu ao vídeo vazado do evento foi um show de baixarias do presidente da República, que aproveitou o momento em que o gado estava confinado à sua volta para buscar respaldo contra os ataques que vem sofrendo, especialmente depois de divulgada essa lista de compras. Com o microfone na mão, mandou bala: “Quando vejo a imprensa me atacar dizendo que comprei dois milhões e meio de latas de leite condensado, VAI PRA QUE O PARIU. Imprensa de MERDA essa aí. É PRA ENFIAR NO RABO DE VOCÊS, AÍ”.
Com isso, o stand-up president recebeu efusivos aplausos da torcida, em especial do cantor Amado Batista, que, sentado entre Bolsonaro e Ernesto Araújo, se refestelava com a alfafa servida no prato.
Também não vou comentar porque a reprodução do discurso já fala por si.
Só o que me resta é lamentar que tudo isso esteja acontecendo no meu país, e pior, num momento em que vítimas da pandemia, direta ou indiretamente, estão vendo seus pratos na mesa cada dia mais vazios.
Esta crônica foi originalmente publicada em O Boletim, em 29/1/2021.
Vera, devo te dizer: “stand up president” é uma beleza de sacada! Parabéns!
Sérgio
Excelente, Vera!