Pela Porta dos Fundos!

Ia começar o texto falando da rachadinha do Flávio, mas sei que esse assunto incomoda muita gente que acredita que uma rachadinha a mais, uma rachadinha a menos neste país é coisa pra se deixar pra lá.

Acham que essa prática de repassar salários dos fiéis servidores para a conta do patrão, no caso do então deputado Flávio Bolsonaro, é café pequeno perto do que os governos anteriores de Lula e Dilma fizeram.

Até é! Só que é talqualmente desonesto. Mas como a turma do passa pano que acompanha o relator, quer dizer, o presidente, acha que essas investigações são “problemas pequenos”, então vou mudar de assunto.

Vou falar de outra coisa que está incomodando muita gente a ponto de deixarem o bom senso de lado, e apelarem para atitudes mais ditatoriais em relação a certos assuntos.

A polêmica em questão é sobre o filme A Primeira Tentação de Cristo, encenado pelo grupo cômico Porta dos Fundos. A sátira mostra uma espécie de triângulo amoroso entre Deus, Maria e José, e um Jesus Cristo gay.

A estupefação dos cristãos diante disso fez com que Alex Brindejoncy (?) encabeçasse uma petição, que ele chamou de Especial de Natal Porta dos Fundos, para conseguir assinaturas contra o grupo e contra a Netflix que está exibindo o filme. Já conseguiu mais de dois milhões de assinaturas.

Até aí tudo bem que mais de dois milhões de pessoas queiram manifestar seu repúdio ao filme. O problema é que não é só isso. A petição tem o intuito de querer PROIBIR sua veiculação.

E aí a coisa pega. Não gostar ou achar que sua crença sofreu um abalo sísmico é uma coisa. Proibir é outra.

Não estamos discutindo aqui se o filme é bom ou ruim, se é de bom gosto ou de mau gosto, se é certo ou se é errado. Quem deve decidir isso é cada cidadão que, por enquanto, ainda pode usufruir da liberdade de expressão e tem ao alcance da sua mão o botãozinho do livre arbítrio encontrado no controle remoto – lá ele se chama “desliga”. Ninguém é obrigado a assistir ao que não quer. Em contrapartida, ninguém tem o direito de impedir que outros assistam ao que querem assistir. Simples assim.

Me lembro que, quando um pastor da Igreja Universal do Reino de Deus chutou em público a imagem da Nossa Senhora de Aparecida, teve uma chiadeira geral por parte dos católicos, mas não me lembro de terem feito uma petição para proibir a circulação do pastor. (Parece que ele saiu de circulação por conta própria. Teria até deixado o país depois do episódio e virado padre. Mas os boatos não se confirmaram.)

Então, se existe uma opção, pra que apelar para ações tão drásticas? Pra que tentar sair pela porta dos fundos, se podemos sair pela porta da frente?

Duro é quando não se tem opção! Quando se está dentro de um supermercado nesta época do ano, com metade das compras ainda por fazer, e começa a tocar ENTÃO É NATAL, ANO NOVO TAMBÉM…

É dose! E olha que eu gosto da Simone.

Esta crônica foi originalmente publicada em O Boletim, em 20/12/2019. 

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