A comemoração dos 30 anos do Partido da Social Democracia Brasileira se dá em ambiente completamente diferente de quando comemorou um quarto de século.
À época, o partido realizou um ato público na Câmara Federal em clima de alto astral, com suas principais lideranças reverenciando sua história como sendo a legenda que mudou a face do Brasil com o Plano Real. O futuro parecia sorrir para os tucanos. Seu presidenciável, o hoje enroladíssimo Aécio Neves, oferecia enorme expectativa de poder.
Cinco anos após, o trigésimo aniversário do PSDB virou um evento quase clandestino em um salão de hotel de Brasília. É como se os tucanos não tivessem o que comemorar face o seu divórcio com as ruas e a situação aflitiva de seu atual presidenciável, o ex-governador paulista Geraldo Alckmin.
Quando veio à luz do dia, em 25 de junho de 1988, o PSDB se dispunha a ser uma alternativa para o “povo brasileiro chocado com o espetáculo do fisiologismo político e da corrupção impune; descrente de partidos políticos que não correspondem ao voto de confiança recebido do eleitorado”.
Em seu manifesto de fundação anunciava que “o novo partido nasce longe das benesses oficiais, mas perto do pulsar das ruas”. Três décadas depois a legenda perdeu boa parte de sua conexão com a sociedade e vê suas principais lideranças atingidas por denúncias de práticas nada republicanas. Diga-se, práticas expressamente repudiadas no ato solene de sua fundação.
Não se pode fazer uma justa apreciação dos 30 anos da social-democracia brasileira levando-se em conta apenas o atual momento. Inegavelmente o PSDB, que teve na sua fundação homens públicos como Mario Covas, Fernando Henrique Cardoso, Franco Montoro, José Richa, José Serra e tantos outros, deu enormes contribuições ao país quando se erigiu ao poder.
Citemos algumas: a estabilização da moeda com o fim da espiral inflacionária, o saneamento do sistema financeiro, as privatizações que democratizaram o acesso à telefonia, a introdução dos fundamentos macroeconômicos, a lei da Responsabilidade Fiscal, a criação das agências reguladoras. No plano social, o governo FHC iniciou as políticas de transferências de renda, promoveu um amplo acesso ao ensino fundamental, criou um programa de combate a Aids reconhecido mundialmente.
Mas ao votar para a planície o PSDB não soube defender seu legado e perdeu identidade. Na disputa presidencial de 2002 assumiu um discurso de candidatura de ruptura com o governo FHC. Em 2006 renegou as privatizações. Na oposição, votou contra a CPMF e esbraveja contra a reeleição, o mandato de 4 anos e até a urna eletrônica, tudo instituído quando era governo.
Queimou ainda seu ativo ético. Umas mais, outras menos, algumas de suas principais lideranças foram atingidas por denúncias de corrupção, o que explica, em grande medida, a difícil situação eleitoral da legenda e de seu presidenciável. Ideologicamente se desfigurou ao escancarar suas portas para políticos sem o menor verniz social-democrata.
Isso não quer dizer que o PSDB tenha perdido um sentido histórico ou esteja condenado a desaparecer. Mas sem um aggiornamento capaz de resgatar os valores que estão lá na sua origem, será impossível renascer das cinzas.
O trigésimo aniversário deveria servir para uma reflexão madura e profunda, passo decisivo na sua reinvenção. Do contrário continuará a ser um a mais no balaio dos mesmos.
Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, na Veja, em 27/6/2018.