Os usos e desusos da última flor do Lácio

“Furna da Onça”, o nome da operação da Polícia Federal que prendeu ontem no Rio sete deputados estaduais, faz referência, segundo a PF, a “uma sala ao lado do plenário da Alerj, onde deputados se reúnem para ter conversas reservadas, destinada às combinações secretas que resultam em decisões individuais antes das votações, momento conhecido como a hora de “a onça beber água’”.

Sete foram presos nessa operação. Três já estavam detidos, o que leva a Alerj a contar com dez parlamentares a menos. Dos 70 que formam o plenário, estão com 60, o que, nas palavras de um parlamentar entrevistado pela GloboNews, envergonha e entristece a Assembléia, mas não impede que os trabalhos continuem para votar matérias muito importantes para o Estado, como, por exemplo, o orçamento para o próximo ano.

O nome da operação da PF é muito bom, não é não? Parece que é uma continuação da operação Cadeia Velha. Combina bem, não combina? A Onça Bebe Água na Cadeia Velha…

Vamos torcer para que o bicho não beba água na Cadeia Nova.

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É muito triste constatar que os brasileiros não acreditam mais nas palavras dos que ocupam postos importantes na administração do país. Se não estiver gravada e filmada então… Aí ninguém acredita mesmo.

Mas pior que não levar a sério o que eles dizem, mesmo se a palavra estiver gravada em vídeo, é o eterno duvidar… Duvidamos de tudo. Quando, por algum motivo de força maior, precisamos citá-los, todos usamos o indefectível “segundo falou” o ministro, ou o deputado, ou o vereador. É uma espécie de garantia esse “segundo falou”.

Será nossa a culpa, ou apenas levamos tantas pauladas no quengo que finalmente aprendemos que duvidar é o melhor caminho?

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O Português não é uma língua que facilite a criação de novas palavras, como o inglês, que é sensacional nesse esporte. Outro dia mesmo aprendi uma nova que adorei: hangry. É somar hunger, fome, como angry, zangado. E como quem está com fome geralmente está zangado, lá veio o hangry.

Nisso perdemos. mas somos extraordinários em criar novos sentidos para palavras muito antigas.

Por exemplo. Agora não se diz aumento salarial para as classes altas, só para quem ganha salário mínimo. Os que não precisam do aumento usam uma expressão muito mais elegante: reposição salarial.

Outro exemplo. Como vocês definiriam o capitão Bolsonaro, presidente-eleito do Brasil?

Eu o definiria como homem severo, de olhar duro. Mas isso sou eu, uma velhota meio assustada. Já o ex-juiz Sergio Moro, de quem sou admiradora e cidadã agradecida, o definiu como “homem bastante sensato e moderado”.

Sensato e moderado, duas palavras antigas que servem a muitos senhores em mais de sete países. São os tais usos e desusos da nossa língua, a última flor do Lácio, tão rica e tão linda e a quem Bilac chamou de inculta….

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, na Veja, em 9/11/2018. 

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