Mussolini taxava patrioticamente os filmes americanos, mas não se importava e até queria que, a duas liras cada bilhete, os italianos sonhassem ser Gary Cooper e se rissem com Chaplin. Replicou a organização dos estúdios americanos na Cinecittà.
O amor de Mussolini era retribuído. Os patrões de Hollywood abominavam o anti-semitismo de Adolf Hitler, mas Mussolini chegava-lhes quase asséptico. Entenderam-se e fizeram acordos. Numa linha first we take Berlin, then we take Manhattan, Mussolini, após campeoníssima visita a Berlim, mandou o filho, Vittorio, a Nova Iorque, festejar o 21º aniversário. Recebeu-o, Setembro 1937, o produtor Hal Roach e assinaram um acordo de distribuição e produção. Roach era a frente visível, mas a MGM, de Louis B. Mayer, estava, cláusula a cláusula, de acordo com tudo.
Esqueceram-se dos actores. O jovem Mussolini, em Hollywood, roçou-se, festivo, por Walt Disney, o censor Will Hays, o vil W.R. Hearst que Welles imortalizaria em Citizen Kane e um só actor, o inefável Gary Cooper. Mas James Cagney, Fredric March e Louise Rainer, que dirigiam o sindicato, engajaram todos os outros actores e já se sabe que quando uma coisa engaja é o diabo. A cada aparição de Mussolini nas newsreels dos cinemas, os los angelinos apupavam; houve manifs à porta dos estúdios; a revista Variety trazia, página inteira, frases do jovem Mussolini vangloriando-se de bombardear os indefesos etíopes, na invasão italiana; rádio e jornais lembravam que o irmão de Vittorio estava, nesse momento, ao lado de Franco a fazer o mesmo, bombardeando os republicanos espanhóis.
Vittorio bateu em retirada e Mayer pôs a política à frente da economia: denunciou o acordo. Em Roma, Vittorio largou a amarga réplica final: “Hollywood está mais cheio de judeus do que Telavive. O dinheiro que ganham com os filmes em Itália, dão-no aos vermelhos em Espanha.” Finito o romance facho-hollywoodiano.
Este artigo foi originalmente publicado no jornal português O Expresso.
Manuel S. Fonseca escreve de acordo com a velha ortografia.