Avançar para trás

Regras eleitorais perfeitas são raríssimas ou simplesmente utópicas. Isso vale para todas as partes do mundo. No Brasil, elas são perversas: parecem servir apenas para perpetuar oligarquias, inibir a participação popular e a renovação.

Cada vez que se mexe nas normas, consegue-se piorá-las.

O exemplo mais recente disso é a fixação de limites para autofinanciamento de campanhas, generoso benefício dado pelo TSE aos candidatos mais ricos. A questão ainda deverá passar por um novo escrutínio na própria Corte, que tem até o dia 5 de março para publicar as regras de 2018, e no STF, em resposta às ações impetradas pelo PSB e Rede.

Juntam-se à essa estranheza o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, criação do Congresso que estreia este ano com R$ 1,7 bilhão, e o Fundo Partidário, já existente e agora autorizado pelo TSE para compor o caixa dos candidatos. Somados, os dois fundos vão propiciar uma farra de R$ 2,58 bilhões, dinheiro de todos os brasileiros que pagam impostos.

Com eles, o eleitor estará bancando, indiscriminadamente, campanhas de todos os candidatos, inclusive daqueles aos quais se opõe. Nos fundos, direitistas ferrenhos pagam por petistas ou pelo PSOL, a esquerda e o centro financiam Jair Bolsonaro.

Defensores do mecanismo chamam isso de democracia, embora fique anos-luz de distância dela.

Não há nada de democrático na decisão de distribuir recursos com critérios de proporcionalidade definidos pelos parlamentares durante seus mandatos, com usufruto direto do sistema que criaram. Mais: no modelo nacional, não há qualquer vinculo com o número de filiados da legenda.

Partidos políticos, organizações de direito privado e seus candidatos deveriam ser custeados de forma voluntária, por aqueles que comungam ideários.

No máximo, com participação pública vinculada não apenas ao tamanho da representação parlamentar, mas às contribuições individuais de seus militantes. É o que se vê, por exemplo, na Alemanha, que nos anos eleitorais coloca 30 centavos para cada euro doado permanentemente por filiados.

Há outros modelos. Na França, o financiamento público cobre gastos já realizados, após apresentação de notas e, ainda assim, em volumes muito inferiores aos que o Brasil adotou. No total, o estado francês gastou R$ 314 milhões no último pleito, oito vezes menos do que a previsão de financiamento brasileiro.

Por aqui, o eleitor, contribuinte compulsório dos fundos públicos, não teve a chance de aprovar ou reprovar as novas regras. A ele nada foi facultado, nem mesmo o voto, que, contra a sua vontade, continua obrigatório.

É vitima da inadimplência dos políticos, que se esmeram em avançar para trás.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, na Veja, em 25/2/2018. 

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