A segunda denúncia do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, contra o presidente Michel Temer e seus asseclas traça uma história factível, que nem mesmo surpreende por ser quase totalmente conhecida pelos sucessivos vazamentos de delações. A novidade ficou por conta do alinhavo, atribuindo-se a Temer a chefia de uma quadrilha. E aqui o grave pode ser gravíssimo: se isso for verdade – e até há indícios de que seja – Janot pode ter posto tudo a perder. Por vaidade e pressa. As duas coisas ou coisa pior.
Nas 235 páginas da peça, Janot enrosca 34 políticos a partir de depoimentos de 35 delatores, alguns deles, como o ex-senador Delcídio do Amaral e o polêmico Joesley Batista, desacreditados pelo Ministério Público Federal, e outras seis testemunhas. O afobamento foi de tal monta que nem se corrigiu o status de Lúcio Funaro, que aparece na denúncia sem ser identificado como colaborador.
Ainda que se saiba que corruptos não emitem recibos, e, portanto, na maior parte das vezes as provas não são convencionais, há delator demais para investigação de menos. Um problemão para o Supremo Tribunal Federal, que já expressou o entendimento de que as colaborações devem iluminar as investigações e até corroborar com elas, mas não substituí-las. Muito menos serem usadas como comprovação do crime.
Em suma, mesmo que a costura feita pelo PGR espelhe o ocorrido, tem-se o risco de o enredo de nada servir, já que a maior parte das provas elencadas é o dito de quem negociou redução de penas, alguns deles em dívida com a segunda parte do trato: municiar a PGR com documentos que justifiquem a premiação. Essa tem sido a dificuldade, por exemplo, para que Antonio Palocci, mesmo dizendo horrores sobre o ex-presidente Lula, feche sua delação com o MPF de Curitiba, muito mais zeloso nesse quesito.