É só fumaça

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Bardamerda pró fascista. Se fosse vivo, e o saudoso almirante lhe cedesse os direitos da inocente frase, o patrão Harry Warner, um dos irmãos fundadores da Warner Bros, teria como se defender do jovem crítico politizado.

O jovem crítico politizado, português ou francês, até nova-iorquino, com os seus 45 anos adolescentes, transpira ódio ao gajo do dinheiro. Apanhou a palavra “fascista” a sair da boca de Godard e tomou conhecimento de que a indústria – Hollywood, claro – se humilhou perante o desprezável enjoo senatorial que foi Joseph McCarthy, medíocre anticomunista da Guerra Fria.

Mas deixemos em paz o jovem crítico. Vamos ao essencial. Harry era o gajo do dinheiro. Sergeant York e Confessions of a Nazi Spy saíram-lhe do bolso, como do bolso lhe sairia Casablanca.

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E ainda não disse que estamos em 1941 e que Harry Warner foi chamado a Washington. A uma Comissão do Senado. O mundo andava em guerra, menos a América, e dois senadores vigiavam a neutralidade de Hollywood. Acusavam de propaganda bélica a Warner Bros. Os filmes açulavam a neutralíssima populaça americana. O espectador via uma fita da Warner e saía da sala a querer morder a perna do nazi. Porventura uma nádega.

Foi em Março de 1941. Warner levantou-se e disse à Comissão: “Eu abomino o nazismo.” Foi a primeira coisa que disse. Como não ouviram bem, repetiu: “Eu abomino e detesto cada um dos princípios e práticas do nazismo. Para mim, o nazismo tipifica o oposto do género de vida que todo o homem, mulher ou criança decentes querem viver.” Disse, curto e grosso, que Hitler era uma ameaça para católicos, protestantes e judeus e que o triunfo do nazismo seria uma catástrofe para a América e para o mundo.

Harry Warner, o gajo do dinheiro, empurrou a América para guerra, ainda andava o comunista de braço dado com o nazi, no estentóreo Pacto de que é raro falar-se. Harry via as coisas com a simplicidade do filho de sapateiro que era: sim, em Sergeant York Gary Cooper tintava de glória o herói de guerra; sim, Confessions of a Nazi Spy denunciava uma conspiração clandestina em Nova Iorque. Se isso era propaganda, confessava-se culpado.

O gajo do dinheiro foi o primeiro a mostrar num filme que o nazi era infame. E provou o que o jovem crítico não viu: uma Comissão pode ser só fumaça.

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Este artigo foi originalmente publicado no semanário português O Expresso.

manuel.s.phonseca@gmail.com

Manuel S. Fonseca escreve de acordo com a antiga ortografia.

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