Não sei se é rir ou dançar. É disso que eu mais gosto e esqueçam lá ler e escrever. Pode ler-se a dançar, como as elegantes pernas de Leslie Caron mostram no An American in Paris e a rir escreveu o argumentista Michael Arlen, em Hollywood.
Arlen, escritor inglês, era muito apreciado em Hollywood, mesmo sem lá ter escrito pevide. Tropeçou no produtor Samuel Goldwyn à entrada de um restaurante. Falaram e Goldwyn, que suava em dólares, aconselhou-o: “Compre um par de cavalos de corrida. Um bom investimento.” E adeus. Arlen ficou atarantado e já outro produtor, o todo poderoso Louis B. Mayer, lhe batia no ombro. “Estava a falar com Goldwyn…” ia a dizer Arlen. “Quanto é que ele lhe ofereceu?”, quis saber Mayer. O bailarino sexto sentido de Arlen falou por ele: “Não o suficiente!” Mayer estava imbatível: “Aceita quinze mil dólares por 30 semanas?” Aceitou, claro. E não me venham dizer que o dinheiro não cai do céu a dançar.
Bailarino era também o pugilista Muhammad Ali. Via filmes – mesmo de boxe, como os Rocky do sofrido Stallone – e era fã do Superman. Rebelde, sentindo-se um Christopher Reeve, não punha o cinto nos aviões. Uma hospedeira sorridente veio pedir-lhe que o apertasse. Ele, com sedutora gentileza, respondeu-lhe: “O super-homem não precisa de apertar o cinto.” Mais sorridente ainda, a hospedeira aplicou-lhe um gancho: “Mr. Ali, o super-homem não precisa de andar de avião.” Muhammad Ali, K.O., apertou o cinto.
Se tivesse havido uma Hollywood portuguesa, o nosso maior talento repentista teria sido Armando Cortez, jurou-me o Raul Solnado num dos jantares do grupo que tínhamos. E o Raul contou uma dessas explosões de dança e riso, de resto em posição heterodoxa. O Armando ia atrasadíssimo para um encontro no falecido café Monte Carlo, ali na Fontes Pereira de Melo e uma senhora pede-lhe ajuda: “Desculpe, não me diz onde é o Banco Nacional Ultramarino?” A despachar, o Armando, atira-lhe: “Minha senhora, é no 69.” A senhora não se deu por achada e insiste: “E o 69 é para cima ou para baixo?” “Ó valha-me Deus, minha senhora – explica-lhe o Armando –, é um para cima e outro para baixo!”
Dança uma perninha de Fred Astaire numa resposta destas.
Este artigo foi originalmente publicado no semanário português O Expresso.
Manuel S. Fonseca escreve de acordo com a antiga ortografia.