A Venezuela tem a poção mágica das “democracias” bolivarianas. A principal delas é ganhar eleições mesmo com menos votos do que os adversários.
Na última eleição parlamentar, em 2010, o PSUV, partido chavista-madurista-petroleiro-bolivariano, teve 48,13% dos votos e com eles fez uma bancada de 96 deputados. As oposições, com 51,7% dos votos conseguiram eleger 71 deputados.
Conhecemos esses milagres autocráticos desde os tempos da ditadura militar brasileira. Naqueles tempos, os truques do governo para garantir maiorias com menos votos eram metaforicamente chamados de “casuísmos”. Não dava pra eleger? Eles nomeavam.
Os bolivarianos, mais criativos, inventaram uma espécie de média harmônica para dar mais peso aos votos a favor do governo do que aos votos contra. Assim, com menos votos conseguem-se mais deputados. Manteve-se assim a farsa sob a aparência de “democracia”.
O repertório de truques para as eleições parlamentares deste ano, marcadas para o mês de dezembro, perdeu bastante da sutileza e do glacê democrático com que os chavistas cobriam o seu bolo autoritário.
O governo da Venezuela arrancou os véus diáfanos de sua fantasia e começou por colocar na cadeia alguns de seus principais adversários, líderes oposicionistas notáveis, e proibiu a participação de outros nas eleições. Todos “conspiradores”, evidentemente, como é capaz de atestar sem nenhum constrangimento a Justiça venezuelana, aparelhada e controlada pelo governo até a raiz dos cabelos.
Quem lembra da “democracia relativa” do general Geisel sabe muito bem o que pode significar a “ditadura relativa” de Nicolás Maduro.
O único país da América Latina que cresce menos do que o Brasil, e que enfrenta uma brutal crise de desabastecimento, além de uma inflação de 150% ao ano que o governo tenta esconder, a Venezuela sofre ainda os efeitos provocados pela queda do preço do petróleo – sua única fonte de renda.
Quanto mais a miséria material avança sobre o povo venezuelano, mais o governo de Maduro chafurda na miséria moral de uma ditadura sem disfarces.
A última grande desfaçatez do governo venezuelano foi a de decidir quais são os “observadores independentes” que o chavismo vai tolerar para fazer um acompanhamento da lisura das eleições de dezembro.
Primeira condição é a de que os “observadores independentes” não tenham independência nenhuma. Só serão aceitos se forem da Unasul – União de Nações Sul-americanas – e se a fiscalização for feita em zonas eleitorais escolhidas pelo governo.
Ainda assim há restrições: o Tribunal Superior Eleitoral indicou o ex-ministro Nelson Jobim como chefe da missão de observação da Unasul. O nome foi aprovado pela Presidência da República e pelo Itamaraty. Mas o governo de Maduro vetou o nome.
Em razão do veto, o TSE decidiu não participar da missão de observação da Unasul, o Brasil recolheu seus zagueiros e nem Dilma Rousseff nem o chanceler Mauro Vieira deram um pio de protesto.
Mais uma vez a diplomacia brasileira se curva às taras dos populistas bolivarianos do subcontinente, abre mão de sua independência e de sua dignidade e silencia diante de mais esse passo de Maduro em direção à ditadura sem disfarces.
Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 23/10/2015.
Coitados dos venezuelanos, tal como os brasileiros presos aos “casuísmos”. Se Dilma fosse Vaia ou pensasse como, invadiriamos a Venezuela chefiados por Jobim, de capacete azul,para salvar os pobres bolivarianos.
Melhor deixar os venezuelanos cuidarem do próprio angu, o nosso tem caroço demais.
Quando o Sr. Vaia fala de “ganhar a eleição com menos votos” e “glacê democrático”, a gente acha que ele se refere aos Estados Unidos da América do Norte, com ênfase na Era Bush e na Lei “Patriot Act”. Mas ele fala de uma ex-democracia chavista (com o Chávez) que agora é ditadura (com o Maduro).
O fato de o Maduro ser ditador não quer dizer que o Chávez o fosse.