Que John Fitzgerald Kennedy não me venha perguntar o que é que eu posso fazer por Scarlett Johansson. Sempre me perguntei o que é que Scarlett Johansson poderia fazer por mim e Jonathan Glazer deu-me agora a resposta.
O filme chama-se Under the Skin e só não se passa nas ruas perdidas de Lisboa porque as ruas perdidas de Lisboa não são frias e desoladas como as ruas perdidas de Glasgow. Nas ruas de Glasgow, há uma carrinha, uma Ford Transit, que mais parece o carro do Armando, um bocadinho a pé, um bocadinho andando. Ao volante dessa carrinha tão fria e desolada como esse mau pedaço de Escócia, está Scarlett Johansson. Ela é uma insólita mancha de beleza na paisagem realista e feia. Veste um falso casaco de peles, uma cabeleira negra. Sem pressas, atenta, de vez em quando a passar o bâton rouge pelos lábios, vai procurando homens. Quer homens sozinhos e pede-lhes direcções. Se fosse em Lisboa, eu quereria ser o primeiro a dizer-lhe como chegar à A5 de Telheiras ou como é que ela da Pontinha iria apanhar a CRIL.
Scarlett fala muito devagar e sorri, formosa, discreta e segura e os homens ficam mais descalços do que Lianor pela verdura. Quando dão conta estão sentados ao seu lado, no lugar do morto. Ela é uma predadora e tem uma casa para onde os leva, décor que descreveria como um pequeno e feio prodígio. Disse feio e devia ter dito indizível. Jonathan Glazer filmou Under the Skin combinando o mais sórdido realismo com um luxo de Egon Schiele, miséria material coberta a erotismo de veludo. Um pé no sórdido, outro pé no veludo, os homens vão. E entram, está claro. Acontece-lhes o que, talvez, todos gostássemos que nos acontecesse. E enganam-se, se pensam que estou a sugerir que são comidos, seja lá o que isso queira dizer.
Under the Skin é um filme que recusa a psicologia. Filma actos puros, dispensando a tradicional acção-reacção. Duas ou três palavras muito de vez em quando, um perturbante deslumbramento visual e a mais cinematográfica banda sonora dos últimos, vá lá, vinte anos. Tudo dominado por um poderoso corpo feminino, uma mulher, uma das mais belas mulheres à face da Terra. Talvez por isso não seja bem uma mulher. Sei é que, depois de Under the Skin, nenhum homem voltará a aceitar a boleia de uma fêmea que louve-a Deus. Sobretudo se ela conduzir uma Ford Transit.
Este artigo foi originalmente publicado no semanário português O Expresso.
Manuel S. Fonseca escreve de acordteo com a antiga ortografia.
Under no Skin no Brasil teve tradução literal, Sob a Pele.
Manuel faz por nós. Transitou da antiga para a atual Hollywood. Nos apresenta a alienígena das geleiras dinamarquesas, poderosa, bela, dispensa falas e representação. Projeta a nova tendência das telas atuais, pornos de poucas falas muitos atos.
Scarlett é a Sacha Grey requintada.
Valeu Manuel.
Tenho de ir já ver a Sacha Grey. Valeu Miltinho.