Tiradentes é, provavelmente, um dos únicos lugares do Brasil que não piorou, não degringolou, não se horrorificou ao longo do meu tempo de vida.
Ao contrário, muito ao contrário, Tiradentes melhorou ao longo das últimas décadas.
O que é um absoluto fenômeno, coisa única, o total remar contra a maré.
Conheço apenas dois outros lugares do país que não sucumbiram à degradação ampla, geral e irrestrita: a Praia do Forte, na Bahia, e o conjunto Visconde de Mauá-Maringá-Maromba, naquele lugar onde se encontram Minas, São Paulo e o Estado do Rio.
Nas vezes em que voltei a Mauá (algumas poucas, infelizmente), e nas que voltei à Praia do Forte (muitas, embora menos do que gostaria), fiquei surpreso, feliz, ao constatar que continuavam iguais, o que é uma dádiva, uma maravilha.
Tiradentes não apenas continuou igual. Continuou igual – mas melhorou, e muito. Coisa rara, excepcional, única.
Tiradentes dá de goleada em Paraty. Só que fica mais longe da Rede Globo
Paraty, tão badalada, tão incensada, tão flipada, parece uma imensa bobagem, diante de Tiradentes. O casario colonial de Paraty ocupa umas quatro quadras, seis no máximo. Tiradentes tem pelo menos cinco vezes o tamanho do casario colonial intocável de Paraty – com a imensa vantagem de estar diante de uma montanha esplendorosa, majestática, a Serra de São José. Infeliz, ou felizmente, está mais longe da sede de O Globo e da Rede Globo. É 200 milhões de vezes menos badalado que Paraty. Pensando bem, é felizmente. É vantagem. Sem dúvida.
Tiradentes, me peguei pensando várias vezes, dá de dez mil a zero em Paraty. No mínimo. Paraty não chega aos pés de Tiradentes.
Mas digo isso porque vivo há mais de 40 anos em São Paulo, sou mais paulistano hoje que mineiro. Nenhum mineiro diria coisa assim. Cantar grandeza é coisa de fluminense, carioca, nunca de mineiro. Com todo respeito – como diria o sergipano mais carioca do mundo, o feio e ótimo Ancelmo Gois.
Nossas grandes cidades – que pena
Acho que preciso justificar minhas assertivas tão peremptórias, tão violentas a respeito da piora, da degringolação de quase absolutamente tudo no país, nos anos que me deram para viver. Será que preciso mesmo? Para mim, é o óbvio, é axioma, mas vamos lá.
Conheci o Rio de Janeiro em 1961. Uma das mais belas cidades do mundo, uma maravilha, um estupor. Em 1988, ou 1989, não sei bem, estive lá com minha filha, então uma garotinha de 13 ou 14 anos – e um motorista de táxi me desaconselhou a caminhar por uma rua que me era muito conhecida porque havia sério risco de sermos assaltados. Foi uma experiência chocante: o cidadão local metia medo nos turistas, nas pessoas de fora. Hoje, apesar das melhoras dos últimos meses, os traficantes mandam mais no Rio de Janeiro do que o governador e o prefeito.
Belo Horizonte era uma cidade agradável na época da minha infância, nos anos 1950, 1960. Garotos, e depois adolescentes, andávamos até o fim da cidade, no sopé da Serra do Curral, e brincávamos lá numa boa, e subíamos até o Piquinho, e andávamos no topo da serra olhando a cidade lá embaixo, que então beirava um milhão de habitantes.
Boa parte da Serra do Curral foi devastada pelas mineradoras nos anos 1970. Drummond escreveu uma crônica sobre o ataque às montanhas que deram o nome à cidade. Ainda bem (para ele) que Drummond não viveu para ver, para ficar sabendo da destruição absoluta da Serra do Curral, com aqueles grotescos edifícios construídos no topo do que antigamente formava o belo horizonte.
A visão que se tem de Belo Horizonte, de qualquer lugar mais alto, é apavorante: um amontoado de prédios imensos encarapitados no que 40 anos atrás eram morros, montanhas verdes. O trânsito de Belo Horizonte é um total horror, muito pior do que o de São Paulo. A cidade inchou em quatro décadas para chegar a ridículos, impensáveis 3 milhões de habitantes. Tem todos os horrores das grandes metrópoles, sem nenhum dos benefícios delas.
Vivi, trabalhei, andei pela região central de São Paulo no final dos anos 1960 e durante todos os anos 1970. Era uma beleza de Centro de metrópole. O Centro de São Paulo hoje é um lixo – apesar de todos os esforços, e são esforços imensos, dos governos estaduais, municipais, das empresas. Abandonamos o Centro da cidade, deixamos que ele fosse destruído, jogado às traças, aos grafiteiros, aos porcalhões – e a um vazio apavorante nas noites e nos fins de semana.
Quem faz e acontece são as pessoas, não os governos
Era para fazer loas a Tiradentes, e me afastei do foco. Mas talvez não de todo.
Gente boa de São Paulo, do Rio, de Belo Horizonte, fugiu dessas cidades grandes que decaíam e se instalou em Tiradentes. Gente das grandes cidades investiu em Tiradentes.
Tiradentes é hoje, em 2011, igual era quando estive ali pela primeira vez, em 1964 – mas muito melhor.
Tiradentes é também a prova, a demonstração perfeita, de que quem faz, quem faz e acontece, quem empreende, são as pessoas, e não os governos, o Estado.
Em 1964 vi lá casas em péssimo estado; hoje tudo brilha
Quando passei por Tiradentes pela primeira vez, em 1964, foi numa excursão do quarto ano do ginásio do Colégio de Aplicação, com alguns professores, como Vivina, que é de São Tiago, ali pertinho, e, se não me falha a memória, também com Dona Beatriz, de História. Um único dia – saímos de ônibus de Belo Horizonte, fomos a São João del-Rei, passamos por Tiradentes. O que guardei na memória, com a ajuda de umas poucas fotos, foi uma cidade antiga, histórica, mas mal cuidada, com o belo casario em péssimo estado, caindo aos pedaços. Uma cidade pequena, sem nada da imponência de Ouro Preto – e sem os restauros e os cuidados que Ouro Preto já naquela época tinha.
Agora, quase meio século depois, 50 anos em que o Brasil louca, insana, estupidamente, muito mais do que duplicou sua população, inchou suas cidades, entregou-as à favelização e à violência descontrolada, queimou ou dizimou metade do cerrado, destruiu boa parte da Amazônia, Tiradentes brilha.
As casas seculares que vi decadentes, ameaçando ruir, em 1964, estão com suas fachadas intocadas, pintadas de novo. Lá por dentro, devem quase todas ter sido reformadas, adaptadas à era da modernidade. Por fora, são como eram em 1750, 1800.
Não tenho régua para medir coisa alguma, mas Tiradentes me parece que é hoje muito provavelmente o maior conjunto de casario colonial que existe no país. Paraty, repito quantas vezes for necessário, é fichinha, é coisa boba, diante de Tiradentes.
Jovens das grandes cidades foram para lá empreender
Essa ressurreição, esse renascer, esse fenômeno contra o fluxo, contra a maré do horripilante, se deu, insisto, porque gente de São Paulo, Rio, Belo Horizonte, foi para Tiradentes, e empreendeu. Fez e aconteceu.
Nos anos 1970 – enquanto eu, euzinho, estava muito ocupado casando, tendo minha filha, me apaixonando fatalmente e casando de novo, ao mesmo tempo em que trabalhava feito um camelo, um jumento, um imbecil, em um emprego e mais trocentos frilas, para ganhar o pão e perder a vida no ato de ganhá-la –, dezenas, centenas de pessoas da minha geração saíam das maiores cidades do país à procura de alternativas melhores.
Enquanto eu ficava melhorando o texto dos outros, cinzentamente fazendo títulos, olhinhos, legendas, e tendo aumentos de salário, um monte de gente da minha geração, ou um pouquinho mais velha, invadia lugares como Trancoso, Mauá, Tiradentes. Comprava casinhas pobres, caindo aos pedaços, e ia fazendo reformas nelas, estabelecendo bares, restaurantes, pousadas, ateliês, lojinhas disso ou daquilo.
Mauá deu certo. Abençoado lugar. Núcleo de ripongas nos 60, início dos 70, hoje é centro de boa, sofisticada, variada cozinha, boas, excelentes pousadas.
Trancoso deu o azar de dar certo demais. O lugar que deixou Regina apaixonada porque era bucólico, mágico, no final dos 70, virou paraíso dos milionários nos anos 2000, espécie de Ilha de Caras da Bahia, e portanto um horror.
Dos lugares para onde foram os jovens empreendedores paulistas, cariocas e mineiros nos anos 70 e 80, Tiradentes foi o que mais deu certo.
7 mil habitantes, um supermercado, dois bancos e 230 pousadas
O casario foi preservado. As igrejas foram preservadas. Tem mais árvores do que qualquer outra cidade turística brasileira. Tem uma coleção de cozinhas premiadas como nenhum outro pequeno local do país – mas tem também diversos lugares acessíveis aos que não têm R$ 300,00 para gastar numa refeição.
Um guia dizia para um grupo de alunos cariocas da quinta série que Tiradentes tem 7 mil habitantes, um supermercado, dois bancos e 230 pousadas. Os números mostram uma loucura, mas Tiradentes não é uma cidade louca. Muito ao contrário. Pelo que vimos, economicamente Tiradentes vai bem, obrigado, graças ao turismo. Em outubro, mês absolutamente fora de temporada, havia pousadas cheias, restaurantes com muita gente. Mais importante ainda: havia muita gente nos locais mais historicamente fundamentais – a Matriz de Santo Antônio, construída a partir de 1710, no alto de uma bela colina, o Chafariz, de 1749 (na foto acima), as ruas do casario mais antigo. Hordas de estudantes de diversos lugares do país. Casais. Grupos.
O trenzinho que liga Tiradentes a São João del-Rei, e funciona às sextas, sábados e domingos – pequena lembrança de que Minas Gerais já teve, no passado, uma grande malha ferroviária –, também é um tremendo sucesso. (A estrada foi inaugurada em 1881, com a presença do imperador Dom Pedro II.) Fizemos a viagem numa sexta, e todos os lugares estavam ocupados. Na estaçãozinha, um aviso indicava que a lotação estava esgotada.
E isso durante a semana – em outubro. Na sexta à noite a cidade já fervilhava de gente. No sábado, dia em que espertamente, remando contra a maré, fomos embora, depois de quase uma semana inteira lá, havia chusmas de visitantes – carros de São Paulo, do Rio, de Minas, de Estados mais distantes.
Enquanto atravessávamos a cidade rumo à estrada, nos espantamos ao ver, caminhando contra a nossa direção, um negão gordo de cabelo grande e boné, e, enquanto os dois falávamos ao mesmo tempo a frase inconclusa: Ué, mas parece o…, vimos que era o próprio, o Bituca, o Mirtão, o carioca de nascimento mais Minas & Geraes do mundo, a voz de cobre, de diamante, de ouro – eu sou do ouro, eu sou vocês, eu sou Minas Gerais.
Mirtão, sujeito esperto, passeia por Tiradentes, a cidade natal de outro herói mineiro.
Sem asfalto, com o calçamento de pedras como há séculos
Os governos fizeram sua parte para ajudar Tiradentes: atrapalharam pouco.
Por um milagre desses que acontecem poucas vezes, o Estado – sei lá em que nível, se União, Estado ou município – determinou que, no centro histórico e a seu redor, não poderia ser construída qualquer edificação que fugisse às características coloniais. Em algum momento, tentou-se asfaltar a estrada mais antiga que liga Tiradentes a São João del-Rei, a maior cidade da região, hoje com cerca de 90 mil habitantes. Algum bem-aventurado órgão de patrimônio proibiu o asfalto. A estrada continua hoje de pé-de-moleque, aquele calçamento com pedras irregulares. Há uma BR asfaltada que liga São João a Tiradentes, mas ela é mais longa e passa longe do centro histórico, felizmente.
Houve, anos atrás, uma tentativa de melhorar, modernizar o calçamento do centro histórico, feito de grandes pedras irregulares, as pedras capistranas. O patrimônio proibiu. Passam carros nas ruas centenárias – mas os pneus sofrem, as bundas dos turistas sofrem, porque o calçamento igual ao original é um pavor para carros. É um maravilhoso convite a que se deixe o carro mais longe, e se ande a pé.
A rigor, a rigor, os carros deveriam ser proibidos de entrar no centro histórico, para preservar o casario – e a beleza da paisagem. Mas talvez seja melhor do jeito que está, porque os brasileiros, de uma maneira geral, são tão comodistas, tão aferrados a seus carros, que, se houvesse proibição mais draconiana, poderia simplesmente não haver turistas em Tiradentes – e aí a cidade não se manteria tão agradável e atraente e próspera.
Um meio termo muito difícil de se alcançar
É um meio termo difícil de se atingir, este, entre a preservação e a convivência com o turismo, a modernidade, o aggiornamento. Chegar ao ponto de nem tanto ao mar, nem tanto à terra, não é uma conquista fácil. Quando Regina me arrastou até Trancoso pela primeira vez, na segunda metade dos anos 1970, a estrada até lá era absolutamente precária. Muita gente preferia ir a pé, pela praia, embora a maré em alguns trechos tornasse a caminhada quase impossível. A cada vez que eu voltava lá, melhor era a estrada, e menos preservado era o lugar. Hoje, acho que a única coisa boa que existe em Trancoso é a casa de Lucy Dias.
Abençoadamente, Mauá se refinou sem perder o encanto, o charme. Neste ano de 2011, foi completado o asfaltamento até lá. Não sei se o encanto, o charme da Maringá que visitei com Regina, depois com Fernanda garota, depois com Mary, vão resistir por muito tempo. Pode ser que sim: a vilazinha da Praia do Forte, que conheci quando Fernanda era uma adolescente de uns 14 anos, resistiu perfeitamente ao avanço da Estrada do Coco. Inventaram Sauípe, e a maioria dos turistas bobões pula a Praia do Forte, graças a todos os orixás baianos.
O meio termo é de fato muito difícil de se atingir. Michelle, uma jovem belíssima que trabalha na pousada que Mary escolheu – mulherão ali de seus 30 e poucos anos, experiente, vivida, com passagens por São Paulo, Curitiba, Nova York – comentou que Tiradentes está crescendo demais, muitas novas pousadas aparecendo a cada mês. Deveria haver uma legislação mais severa para impedir o crescimento da cidade, disse ela.
Uma garotinha de 21 anos que trabalha como garçonete em um bar num dos cantos do belíssimo Largo das Forras, o principal da cidade, com quem conversamos uns 20 minutos, atrapalhando a ela e ao bar, tem posição oposta. Nasceu em Tiradentes. Estuda hoje em São João, porque Tiradentes não tem escolas depois da oitava série. Acha Tiradentes um porre, porque não há jovens interessantes disponíveis, a não ser os turistas – e os turistas passam e vão embora. Reclama que não acontece nada na cidade, e que muitos dos meninos da sua idade bebem muito e se drogam. Crack?, perguntei, assustado. Ela se mostrou horrorizada: não, só maconha.
Tudo o que ela quer na vida é aprender uma profissão – e cascar fora, ir para uma cidade grande.
Michelle, a belle, passou por grandes cidades e optou por Tiradentes, 7 mil habitantes. A garotinha jamais saiu do eixo Tiradentes-São João, e tudo o que quer na vida é uma cidade maior.
A vida é assim, definiu Seu Jamil numas férias em Florianópolis. Quem está no Norte quer ir pro Sul, quem está no Sul quer ir pro Norte.
Décadas antes, minha mãe dizia mais ou menos a mesma coisa, usando versos de um poeta parnasiano cujo nome não me lembro. Alguma coisa do tipo A felicidade está onde a pomos, e nunca a pomos onde estamos. Sofisticação literária não era o forte da minha mãe, mas os versos bocós encerram grande verdade dos fatos.
Uma serra esplendorosa, um rio que dá histórias e peixes
Não sou nada aventureiro, e além disso já estou velho, mas há espaço para quem goste de passeios naturebas, atléticos. Deve seguramente haver trilhas que levem até perto da lindíssima Serra de São José. Há também cachoeiras – a do Carteiro e a do Bom Despacho. Esta fica bem perto da estrada de calçamento em pé de moleque que liga Tiradentes a São João Del-Rei, mas, neste mês de outubro, em razão da prolongada seca, a Cachoeira do Bom Despacho tinha apenas um quase invisível filetinho de água.
A seca em Minas este ano foi muito brava. Fazia mais de três meses que não chovia uma gota em toda a região central do Estado, tanto que a vegetação em vários parques, como o Rola Moça e da Serra do Cipó, foi devastada por incêndios. Mary e eu levamos sorte a Belo Horizonte e a Tiradentes: enquanto estávamos lá, choveu nas duas cidades pela primeira vez após cerca de cem dias de secura absoluta.
O longo período sem chuvas, no entanto, não tirou a beleza do Rio das Mortes, que passa pela cidade. Ele vem da Serra da Mantiqueira, a Leste, rumo a Oeste, para desaguar no Rio Grande, um dos dois rios que formam o narigão de Minas, o Triângulo, e também o Paranazão. Rio histórico, palco de batalhas na Guerra dos Emboadas (1707-1709), ele serpenteia as terras de velhas fazendas entre a estrada rodoviária, aquela pavimentada com pedras, e a ferroviária, no trecho entre Tiradentes e São João.
Passamos sobre o Rio das Mortes todos os dias, duas ou mais vezes ao dia, porque ele fica entre a pousada Lis Bleu e o centro histórico. Por ser mineiro, sou fascinado por trens e rios, e a cada vez que passávamos pelo das Mortes tirava fotos. Fiz várias delas, todas iguaizinhas. Não, não. Houve um fim de tarde, logo depois da primeira chuva, em que o sol quase poente fez as árvores às margens do rio ganharem uma coloração de filme produzido por David O. Selznick. Essas fotos ficaram diferentes das demais.
Além de história, o Rio das Mortes deve dar peixe. Sempre havia por lá, na ponte, no final da tarde, uns mineirinhos com seus anzóis.
Gente que foi, viu e empreendeu
Sei de algumas pessoas que remaram na maré da cidade grande para Tiradentes, e ajudaram a transformar a cidade histórica decadente que vi em 1964 na tetéia que ela é hoje. Mauro Marcelo foi uma dessas pessoas – talvez um dos pioneiros. Mauro é mineiro, foi de Belo Horizonte para o Jornal da Tarde, que já foi um reduto de mineiros. Do JT foi para o Guia 4 Rodas. Assim como Saul Galvão, de bebedor de cachaça e cerveja Mauro virou connoisseur de vinhos. Abriu restaurante em Tiradentes.
Diretamente de Belzonte, sem passagem por São Paulo, foram para Tiradentes os irmãos gêmeos Luís Fernando e Luís Eduardo, amigos de adolescência de Mary. São os donos do restaurante Theatro da Vila, tido e havido como a melhor cozinha de todas as boas cozinhas da cidade – o tal lugar onde – segundo nos disse o Leonardo, o paulista dono da Lis Bleu, a maravilhosa pousada em que ficamos –, não se come por menos de R$ 300,00, bebidas excluídas.
Antônio Mascchio, o memorável, mitológico Antônio Mascchio, abriu um restaurante em Tiradentes, nos anos 1980, depois que fechou o não menos memorável Pirandello, no Baixo Augusta, no tempo em que ainda não havia a expressão Baixo Augusta.
A onda iniciada no final dos anos 1970 continua até hoje. Leonardo, o garotão que com sua bela mulher Tatiana, paulista como ele, abriu o Lis Bleu no início deste ano, 2011, investiu uma grana preta ali – assim como tantos outros paulistas, cariocas e belo-horizontinos haviam feito antes. Saímos de lá com a certeza de que o investimento não foi em vão. O Lis Bleu vai dar certo, e eles vão ganhar um bom dinheiro. Merecem.
O verso de Drummond é belo – mas equivocado
Durante anos, Mary e eu brincamos de pensar numa fuga do jornalismo, e de São Paulo, rumo a ter uma pousadinha na Bahia. Foi só sonho, brincadeira, escapismo. Não tenho talento nenhum de empreendedor. Se tivesse tentado, provavelmente teria bebido o bar, como meu amigo Pedro França fez com a caprichadíssima pizzaria que construiu no lugar mais agradável da agradável Sambaqui, em Florianópolis.
Não chego propriamente a invejar as pessoas das grandes cidades que empreenderam, que fizeram as belezas que são hoje Mauá, a Praia do Forte, Tiradentes. Tenho admiração, e um profundo respeito, mas não tenho inveja. Essas pessoas trabalham demais.
E não me lembro há quantos anos Drummond escreveu que Minas não há mais. Belo verso, tão forte, tão perene quanto os profetas de Aleijadinho em Congonhas, ou a riqueza da Matriz de Tiradentes – a segunda igreja mais rica em ouro do país, perdendo apenas para a de São Francisco, na Cidade Alta de Salvador.
Acho que o verso é dos anos 1940.
De qualquer forma, Tiradentes é a prova viva de que o verso do poeta maior, embora belo, é equivocado.
Minas há, sim. Está lá – muito viva, e passando bem, e linda.
Tiradentes, São Paulo e Juquehy, outubro de 2011.
Mais Minas: Os profetas de Aleijadinho, uma maravilha absurda, impressionante, emocionante.
Ah, Ségio,
com e sem saudosismo, foi ótimo te ler, lembrar e relembrar atos e fatos aparentemente esquecidos. Pô, como nós já fizemos coisas interessantes, não? Juro que não me lembrava do passeio a São João/Tiradentes, em 64. Mais uma vez, tive certeza de que valeu a pena dar aulas no Aplicação e conviver com vocês, adolescentes adoráveis e inesquecíveis. (Sim, essa raça existe!)
Já que sua memória tá pior que a minha, a outra professora foi, sim, a Beatriz, que vocês idolatravam, com razão. (Epa! Olha o ciúme!)
Tiradentes tá linda, sim, feliz e milagrosamente. Quem sabe, qualquer hora dessas, ainda nos esbarramos por lá?
Beijo
Vivina
PS. O poeta da sua mãe? Vicente de Carvalho. O soneto? “Velho Tema”.
Bj
Servaz, um protesto. Você não precisava mesmo ter gasto R$ 300 em uma refeição, mas não comeu nem uma comidinha mineira, maneira, que no fim é o que interessa? Por que não nos contou? O restaurante de R$ 300 me soa como Guarujá. Não tinha um tutuzinho, um torresminho, feito por uma senhorinha da terra? Queremos almoçar e jantar nas matérias feitas em lugar que se come bem. Tenho dito!
Ô diacho! O texto já estava imenso, Valdir, e então não contei do almojantar de comida mineira. Mas ele estará em breve aqui, num texto que terá (já tem, na verdade) o polêmico título de “Voltei à cachaça”.
Espere só.
Ah: e não gastamos R$ 300,00 em refeição nenhuma. Não fomos ao tal restaurante carésimo.
Grande abraço.
Sérgio
PS: Mas, afinal, gostou do texto?
O apice da civilização mineira já passou; vc olha minas no primeiro censo..2 milhões; sp na altura tinha menos da metade; hoje em dia sp tem mais que o dobro..minas ficou pra traz..estagnou, decaiu; cresceu menos que o brasil nos ultimos 100 anos (só cresceu mais que o ne nas ultimas decadas); todos os grandes de minas como os mansur, eike e cia migram pra enriquecer vizinhos alheios igual aos nordestinos e capixabas (e agora tambem os sulinos)..o brasil cresceu em media 2000%; minas cresceu metade disso desde o primeiro censo..minas em pioneirismo de grandeza civilizacional só perdeu pro ne (e por uns 2 séculos)..mas o quase-pioneirismo e efemero apice veio com rapida decadencia e estagnação tambem; o curioso é que os vizinhos que se beneficiaram com a estagnação de minas, eliminando assim um grande concorrente desde 30-32 e cia, ja ha decadas tambem decaem qualitativamente..ou seja, de pouco adiantou sabotar minas ou o ne..o que são eles hoje?dependem de uma gl
obosta ou de uma record pra ficar se auto-enganando o tempo todo..insulfando o proprio ego sem nenhuma base..a historia dessa metade leste lusofona do sul da america é uma coisa abjecta e decadente..”optamos” (a meia duzia optou e impôs ao resto) pela quantidade e não pela qualidade igual ao que fez o atlantico norte e o resultado de toda essa porcaria das pseudo-ciencias que guiam o ex-oeste vemos ha 50 anos seguidos..viemos parar nesse naufragio civilizacional irrecuperavel..