No circo

No picadeiro armado no portão do Alvorada surge um palhaço animadíssimo, de terno escuro e faixa presidencial, que salta de um carro oficial carregando uma penca de bananas que aguarda o momento de serem atiradas nos apaixonados pelo mito e nos jornalistas que não tinham se dado conta, ainda, que aquele cercadinho era na verdade um picadeiro.

Sinceramente, os jornalistas ali presentes levaram muito tempo para identificar, com seu nome verdadeiro, o cercadinho como picadeiro… Vamos relevar essa lentidão. Afinal eles não foram até ali por livre vontade, foi a pauta que seus chefes lhes passaram. A idéia central era fazer perguntas ao presidente da República e anotar as respostas do chefe da Nação. Do verdadeiro ou do palhaço travestido de presidente? Dos dois, já que ambos são palhaços, ambos adoram dar bananas, ambos sonham com as gargalhadas dos adoradores do mito.

E qual é a missão do palhaço? Fazer rir ou fazer chorar? Na verdade, acho que ninguém sabe. No circo muitas vezes o palhaço não consegue fazer rir. No palco da ópera, às vezes faz chorar, mas no picadeiro do Alvorada não faz nem rir, nem chorar. O que o palhaço que carrega as bananas faz é alertar o reduzido número de presentes sobre quem é o verdadeiro palhaço!

As bananas que o palhaço carrega têm uma perfeita utilidade: matam a fome de quem às vezes está em jejum e confirmam a semelhança entre o mito e o humorista. O mito só ri. Está feliz, nada lhe é mais agradável do que fazer rir e exibir aquele seu sorrisinho tão encaixadinho que seus amantes ficam até um pouco em dúvida: ele estará sorrindo ou assustado, temeroso do que estará por vir? Será que é isso?

Talvez seja. Por via da duvidas, o melhor é levar um alter ego para poder depois dizer que não foi ele, foi o palhaço que deu bananas para a platéia do circo…

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, na Veja, em 6/3/2020.

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