Marina e a arte de criar histórias

É absolutamente fascinante acompanhar o jeito com que Marina cria as histórias para as nossas brincadeiras – assim como é absolutamente fascinante ver que ela brinca com a gente de maneira remota, via tela, do mesmo jeito de antes da pandemia, nós três juntos, lado a lado.

Já faz anos que a brincadeira preferida dela é criar histórias em que somos personagens – ela, a vovó, o vovô. Imagino que ela goste muito de brincar assim também com a Mamãe, com o Papai, com a Cau.

Criar histórias em que somos personagens. Em geral, histórias em torno de personagens dos desenhos que ela está curtindo no momento. Durante bem mais de ano ela foi Elsa, a vovó foi Anna e eu fui o Kristoff do Frozen, em histórias que ela ia criando na hora, em geral com base em situações existentes mesmo no Frozen, com variações, inovações, tramas propostas por ela.

Teve a longa fase inspirada em Como Treinar seu Dragão – ela era Astrid, o Érolti era o Soluço, a vovó, a Heather e o vovô, o Perna-de-Peixe.

Depois, já durante a pandemia, começou a fase Mundo Winx, também longa, que ainda está rolando. Marina escolheu para ela, desde sempre, a Flora, tendo o namorado Érolti, o ursão de pelúcia danado de simpático, como o Hélia, a vovó como a Bloom, o vovô como o Sky. Quando brinca de Winx com a Mamãe – ficamos sabendo no sábado atrasado, 8/8, quando tivemos nosso segundo encontro presencial desde o início da quarentena, na Praça Benedito Calixto –, a Mamãe é a Musa.

Ela vai criando histórias, situações. Em geral, repito, com base em situações existentes nos filmes, nas séries, com base nas características dos personagens – mas com ampla liberdade de criação de tramas.

Mary e entramos com tudo na brincadeira, é claro. Criamos nossos diálogos, dentro dos parâmetros dados ali pela criadora-roteirista-diretora-atriz principal. Às vezes ela nos dá instruções sobre o que fazer; às vezes vai deixando correr solto, a gente falando e agindo como os personagens.

São belos momentos de criação coletiva.

Volta e meia damos sugestões de por onde seguir com a trama – e aí varia. Há vezes em que ela acolhe a sugestão de ótimo grado: – “Boa!” Às vezes recusa de bate-pronto.

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As aventuras em que somos, nós três, personagens de desenhos animados são uma parte da brincadeira dela de criar histórias. Há ainda uma outra área, em que os personagens são as bonequinhas dela – as, como ela diz, suas 1.499 filhas e filhos.

Nas últimas muitas semanas, tem adorado brincar de Barbie. O “brincar de Barbie” de Marina tem grande semelhança com o brincar de Frozen, brincar de Astrid e Soluço, brincar de Winx: ela vai criando histórias sobre as bonequinhas e suas atividades. Claro que cada uma tem seu nome – cada um dos 1.499 bonequinhos de todos os tipos dela tem seu nome. Ah, que coisa fantástica a memória das crianças.

A diferença em relação às historinhas com os personagens de desenhos é que, quando ela brinca de Barbie, nós – Mary e eu – não interpretamos papéis. Às vezes dialogamos um tanto com os personagens, mas somos basicamente espectadores – e somos nós mesmos, vovô e vovó.

Às vezes a mesma historinha prossegue por alguns dias. Há o clube das Barbies, as escolas das Barbies. Todas gostam muito de ginástica – praticam ginástica artística, se esmeram em saltos mortais. E dançam, são excelentes em algumas posições e formas de dança, como o espacate, que a vovó brinca que é abacate. Algumas são donas de petshops. Algumas são donas de salões de beleza. Salões de beleza são parte fundamental das histórias das Barbies.

Marina cria as histórias, os diálogos, fala os diálogos, ora como uma personagem, ora como outra. Faz também a trilha e os efeitos sonoros – é o maior barato ouvir a trilha e os efeitos.

Marina tem uma quantidade razoável de Barbies. Ela mesma não sabe exatamente quantas são, mas é coisa de umas 20. Crianças, ou chelseas, como elas se chamam, são apenas 3; e meninos… Diacho, esse é o grande problema. Meninos são só 2, atualmente. Ela está para ganhar de presente mais um garoto, mas ainda não sabe disso.

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Já faz vários dias que as histórias giram em torno da família formada por Pat, o marido Ken e a filhinha Sofia.

A Pat estudou três anos numa escola de moda e beleza – ela usou a expressão “escola de looks”, quando nos contou isso, na sexta da semana passada, dia 7/8. Ficou tão boa na coisa que resolveu ter um salão de beleza – e a vovó fez uma placa colorida linda com a inscrição “Pati Espaço de Beleza”. (Ahn… Sim, há controvérsias sobre a grafia do nome da moça…)

O salão – nos informou no sábado, 8/8 – já abriu, e a primeira cliente foi a Fernanda. Em seguida ela atendeu a Catarina. As duas são grandes amigas da Pat; Catarina é casada com o Carlos.

(Carlos e Ken. Ken e Carlos. Como são os únicos meninos disponíveis, de vez em quando um deles interpreta dois papéis diferentes.)

Na brincadeira de sábado, passaram-se uns três meses – ela informou – e então a Pat resolveu tirar férias. Embora tivesse aberto o salão fazia tão pouco tempo, estava muito cansada, e precisando passar um tempo com a família. Deixou o salão por conta de uma funcionária.

A família Pat, Ken e Sofia é super amiga da família Catarina, Carlos e Helena. A Catarina é tipo a melhor amiga da Pat – e as filhas das duas são também, por sua vez, as melhores amigas uma da outra.

Catarina e Carlos, inclusive, deixaram a Helena na casa dos amigos, para passar alguns meses lá, enquanto a casa deles estava passando por uma grande reforma.

(Eis aí as famílias das histórias dos últimos dias. Marina reuniu a turma para ver desenho com ela.)

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Um dos encantos dessa coisa de brincar de criar história é a existência dessas duas situações tão distintas, tão diferentes umas das outras. Nas brincadeiras de Frozen, dos Dragões, de Winx, é tudo fantasia pura, situações absolutamente fantásticas, mundos alternativos, fadas, dragões, lutas contra os personagens do Mal, guerras, e tal. Nas brincadeiras de Barbie, é quase tudo muito dia-a-dia, tudo parecido com a vida das pessoas, pé no chão. As pessoas trabalham, cuidam de casa, tomam banho, fazem café da manhã, almoçam, dormem…

Bem, é quase tudo dia-a-dia, com bastante ênfase aí no “quase”. Porque, afinal, é o Mundo Barbie – e no Mundo Barbie, Marina sempre nos explica, as coisas são muito diferentes.

Por exemplo: no Mundo Barbie não há coronavírus, não há quarentena.

Na segunda-feira, 10/8, Marina nos anunciou que está na lei do Mundo Barbie: mesmo nas férias há sempre muitas coisas urgentes para se fazer.

(Essa lei foi criada porque, depois de dizer que a Pat estava de férias, ela nos disse que a Pat estava cheia de coisas urgentes para fazer.)

Há várias coisas diferentes no Mundo Barbie. Por exemplo: no Mundo Barbie nunca há falta d’água, e então há algumas pessoas que tomam quatro, às vezes até dez banhos por dia.

Às vezes, no dia-a-dia tão normal do Mundo Barbie surgem situações mágicas, fantásticas, bem diferentes das do nosso mundo.

Por exemplo: essas jovens mães aí, Pat, Catarina, Fernanda… elas têm a capacidade de se transformar em sereias!

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Há duas explicações lógicas para isso. Nos últimos dias, depois de várias semanas vendo só desenhos das Winx, Marina andou assistindo a um desenho de que nós nunca tínhamos ouvido falar, sobre meninas sereias. No desenho, há três garotas – Emma, Cléo e Rickie – que ora são pessoas normais, ora são sereias.

O fato de sereias estarem na cabeça de Marina nestes últimos dias é uma explicação lógica para sereias participarem das histórias das Barbies. A segunda é que ela tem duas Barbies que são sereias…

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Nesta quinta-feira, 13, aconteceu um sensacional momento em que estava tudo muito pão-pão, queijo-queijo, muito cotidiano, vida em família – e de repente a história rasgou-se para o mundo mágico.

O maior barato.

Era Natal, e Pat, o marido Ken, a filhinha Sofia, mais a amiguinha dela Helena, hospedada ali havia semanas, estavam recebendo em sua gigantesca casa os grandes amigos, os pais da Helena, Catarina e Carlos, e também a Fernanda e a filha dela, Alice.

O marido de Fernanda não tinha podido ir; embora fosse Natal, ele tinha um trabalho urgente para fazer. (Uma explicação bastante lógica dada pela criadora das histórias – ela precisava de uma desculpa para a ausência do rapaz, já que sua coleção só tem dois moços…)

Enquanto os adultos conversavam no maior dos vários salões da casa, as três crianças foram para a Ala da Diversão.

Foram servidos bolinhos sabor de felicidade.

(Ahá… Bolinhos sabor de felicidade, meu!)

No dia de Natal, chegou a cachorrinha Piper, que a Sofia havia pedido a Papai Noel. Uma cachorrinha mágica.

As crianças foram para a piscina; Sofia e Helena ensinavam a Alice, que é a mais nova das três, a nadar. Lá pelas tantas, a Alice foi dar um passeio para dentro da piscina com a Piper. E aí…

Tcham-tcham-tcham-tcham!

A Piper levou a Alice para um túnel que levava da piscina para o mar!
Ao saber que a garota tinha sumido na piscina, Pat, Fernanda e a pequena Helena se transformou em sereia, e lá foram as três à procura da Alice, no fundo do mar. A Sofia não foi junto – preferiu ficar em casa, com os adultos.

E como a Alice, que é uma criança, e não tem o dom de virar sereia, estava se virando no fundo do mar, carregada pela cachorrinha mágica Piper?

Simples: estava usando uma tigela respiratória! A narradora-criadora-roteirista-diretora pegou um capacetinho de plástico e disse que aquilo era uma tigela respiratória, equipada com bolhas de ar respiratório.

O trio Pat, Alice e Sofia, transformadas em sereia, acabaram descobrindo uma pista para chegar até onde estavam a Alice e a cachorrinha Piper: enxergaram, no fundo do mar, cocozinhos deixados pela Piper. Seguiram os cocozinhos – e encontraram a garota!

Nadaram todas rapidamente de volta para a piscina, desviraram sereia, e ficou tudo bem.

E aí Marina nos anunciou que iria interromper essa história da família Pat, Ken e Soraia e amigos, para começar uma outra.

– “Vai ser a história das sereias. A Cristal (pegou a bonequinha Barbie sereia e a expôs para nós) ainda não sabe, mas ela vai ser a rainha do fundo do mar.”

A história da Cristal, interrompida pela Mamãe chamando a narradora-criadora-roteirista-diretora para almoçar, continuaria na telenetada do dia seguinte.

14/8/2020

2 Comentários para “Marina e a arte de criar histórias”

  1. Esses bolinhos sabor felicidade já são impressionantes (nem na publicidade de produtos alimentícios vi isso). Agora, as bolhas de ar respiratório são demais! Meus beijinhos para a linda.

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