Crônica da eleição do horror (3)

Dia 3 – Quarta-feira, 10 de outubro

Sai a camiseta, entra o terno

 Poderia ser engraçado o imenso esforço que a campanha de Fernando Haddad está fazendo para se distanciar das marcas do PT e de seu guru, seu babalorixá, seu Messias.

Seria de fato muito engraçado – se não fosse grotesco, ridículo, nojento.

Tiraram o vermelho!

O Haddadzinho paz e amor agora é verde e amarelo!

Jaques Wagner vai negociar uma “frente democrática” pró-Haddad com Ciro, Marina e FHC, informa O Globo na manchete, que remete à coluna de Bernardo Mello Franco, o porta-voz oficial do PT junto à grande imprensa burguesa, reacionária, neoliberal. Na coluna, o recém-eleito senador faz acenos diretos a Fernando Henrique Cardoso, que agora não é mais reacionário e neoliberal, e até “deu uma bela contribuição ao Brasil”.

Diz Jaques Wagner na coluna:

“A construção do país é tijolo por tijolo, ninguém faz nada sozinho. O Fernando deu uma bela contribuição ao Brasil. Nós aprendemos a responsabilidade fiscal com ele. É uma coincidência negativa da História que, em vez de ficarem juntos, PT e PSDB tenham polarizado um com o outro. Foram as melhores forças que surgiram no período democrático.”

Uau! A luta para obter votos conduz a milagres!

Um grão-comissário do PT fazendo elogios a FHC, ao PSDB!

A propaganda petista jogando fora o tradicional vermelho, símbolo do partido desde sua fundação, 30 e tantos longos anos atrás.

E não tiraram apenas o vermelho. Tiraram o próprio guru, o Padim Padre Cícero, o Deus! Tiraram Lula da foto!

Matéria de Catia Seabra e Marina Dias na Folha trouxe as duas fotos, o antes e o depois.

Da mesma maneira com que Stálin mandava retirar das fotos históricas os velhos companheiros caídos em desgraça e tornados inimigos, o PT stalinizou a foto oficial da campanha e tirou dela o próprio Stálin, perdão, Lula!

Mas se não é fantástico, se não é o show da vida!

 

“O PT mudou de roupa do domingo para a segunda-feira. Saíram as camisetas ‘Lula livre’ que Fernando Haddad vestiu no primeiro turno nas visitas a Curitiba ou nos caminhões de som pelo Nordeste e pela periferia e entrou o terno alinhado do candidato no Jornal Nacional”, escreveu Vera Magalhães no Estadão.

No Jornal Nacional de segunda-feira, Haddad prometeu tirar do programa de governo a convocação de uma Assembléia Constituinte exclusiva; agora, as possíveis reformas serão feitas por emendas, prometeu ele, diante das câmaras da Rede Globo.

Haverá quem acredite.

É verdade que, na mesma segunda-feira, primeiro dia após o segundo turno, Haddad foi pedir a bênção do Padim Padre Cícero na prisão em Curitiba.

Mas no Jornal Nacional o candidato jurou respeitar a Constituição. Fez promessas.

Haverá quem acredite.

Afinal, se tiraram da propaganda o vermelho e até mesmo o babalorixá mór…

É. Seria engraçado – se não se não fosse grotesco, ridículo, nojento.

Não adianta tirar uma camiseta e botar um belo terno. O lobo continua sendo exatamente o mesmo. O PT continua sendo exatamente o mesmo. O plano de governo da chapa Fernando Haddad-Manuela d’Ávila, que ninguém leu, mas está registrado lá no TSE,  escancara, até mesmo para quem é cego e se recusa a ver, o projeto autoritário que o partido pretende implantar no país, caso seja eleito. É o tema de excelente artigo de Fernão Lara Mesquita publicado no Estadão desta quarta, cuja íntegra vai mais abaixo.

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No mais, #EleNão.

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Nem um, nem outro

Há muito pouco, hoje em dia, para se aplaudir no PSDB. Pois eu aplaudo a decisão tomada ontem, terça, pela Executiva Nacional do partido, de não apoiar qualquer um dos dois candidatos no segundo turno, e liberar seus filiados para que cada um vote como bem entender.

Gostei da frase com que, segundo O Globo, Geraldo Alckmin explicou a decisão: “Os nossos candidatos estão todo liberados. Quem quiser pode apoiar o Bolsonaro, quem quiser não apóia ninguém, se alguém quiser apoiar o PT, nós liberamos”.

E, claro, aplaudo também a decisão de Alckmin de, na reunião da cúpula do partido, chamar João Doria de traidor. É sempre bom dar nome aos bois.

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A voz do povo

Qual dos dois projetos, se chegar ao Palácio do Planalto, não sai mais? O do adorador da ditadura de 1964 ou o dos adoradores das ditaduras de Cuba, Venezuela, Coréia do Norte?

A Vox Populi, Vox Dei está dividida.

“A gente vota no Haddad. Se fizer besteira, a gente vai na Paulista e tira ele. O outro, se a gente for na Paulista, apanha”.

Ruth Helena Bellinghini ouviu essa frase de uma mulher que ela descreveu no Facebook como “uma senhora estilo Louis Vuitton no saguão de hospital cinco estrelas de São Paulo”.

Outro dia, meu amigo Rafael Noronha disse no Facebook:

“Bolsonaro a gente tira em 4 anos. Se a organização criminosa tomar o poder novamente, eles não saem de lá nunca mais.”

Dá um medo do cão.

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O plano de Lula para o Lulil
Fernão Lara Mesquita, Estadão, 10/10/2018.

Programa de governo é como termo de uso de aplicativo. Ninguém lê. Mas esse “O Brasil feliz de novo” é uma declaração à praça que não pode passar em branco. Embora políticos, intelectuais, artistas e até a maior parte dos jornalistas se mostrem firmemente decididos a não acreditar no que ele diz, Lula nunca escondeu o que quer ser quando crescer. Depois da esfrega do 1.º turno ele ordenou ao candidato laranja que se faça de bonzinho e renegue tudo, mas a coisa já está registrada no TSE como o programa oficial do governo … de quem mesmo? É a terceira vez que eles tentam cravar esse punhal nas costas da democracia brasileira. A primeira foi na véspera do Natal de 2009, no apagar das luzes do governo Lula, quando ela foi batizada de “Plano Nacional de Direitos Humanos”; depois em 2014, na véspera da Copa e de um recesso extraordinariamente longo do Congresso quando Dilma o rebatizou de “Decreto 8.243”. Não vão desistir nunca. Essa é a receita oficial de golpe do Foro de São Paulo que fez o seu début mundial com Hugo Chávez “tomando o poder” na Venezuela com ele, à la José Dirceu.

“O Brasil feliz de novo” não especifica se manterá o Congresso aberto, mas é certo que ele deixaria de ter qualquer função, pois tudo passaria a ser decidido por “plebiscitos convocados pelo presidente da República” e decididos por “novos mecanismos deliberativos” a cargo de “movimentos sociais” e “representantes da sociedade civil organizada”. “Todos os poderes da União e do Ministério Publico”, assim como os do Judiciário, estariam submetidos a esse tipo de “controle social”. Todos os instrumentos da Lava Jato (delações premiadas, prisão na 2.ª instância, etc.) seriam revogados e o “controle da mídia” se faria “com a atuação da Anatel e da Polícia Federal para impedir perseguições”. Todas as “reformas do golpe” aprovadas pelo Congresso seriam revogadas. Haveria um “novo pacto federativo” em que literalmente todas as entidades municipais e estaduais passariam a ser subordinadas a entidades nacionais. Todos os insumos, indústrias e estruturas básicas seriam estatais, ficando para o “empreendedorismo” apenas o que é “micro”. O “grande agronegócio” passaria por reforma agrária. A política externa seria “altiva e ativa” significando privilegiar, inclusive com financiamentos, países da América Latina, do Caribe, da África e do Oriente Médio.

“A juventude” seria objeto de “direitos universais, geracionais e singulares que buscarão permanentemente a autonomia”. Quer dizer, da escolha dos banheiros na primeira escola dos seus filhos à reeducação dos professores, da água da bica ao petróleo, dos povos das florestas aos povos das metrópoles, da polícia única prendendo menos às penitenciárias soltando mais, do esporte à programação de shows, da contenção de encostas aos furacões do Caribe (!), para tudo e para cada coisa, para todos os brasileiros e para cada um, e não só para eles (a lista acima é literal, mas está longe de ser completa), haverá um “plano nacional”, acoplado a um “sistema único” e a um “novo marco regulatório” aprovado por gente que não elegemos que terá por referência “transversal” “o privilégio dos povos da floresta, dos quilombolas, dos negros e das negras, e o combate à LGTBIfobia”, em nome dos quais toda violência moral ou institucional será justificada.

Todo esse discurso delirantemente sinistro começa com a frase “Lula é uma ideia e agora um programa”, e repete 150 vezes que, nesse Lulil que já não seria Brasil, ele cuidaria pessoalmente de tudo.

E, no entanto, o País atravessou o 1.º turno inteiro assombrado pela ameaça à democracia encerrada na candidatura Bolsonaro sem que ninguém interrogasse o candidato laranja sobre essa preciosidade. Mas como o Brasil é bem melhor que suas elites, a decisão do 1.º turno deu-se totalmente à revelia dos debates. Eles simplesmente deixaram de interessar porque todo mundo – menos o intuitivo Jair Bolsonaro – fingia que a natureza do regime é uma questão resolvida, quando absolutamente não é.

Planos de gestão da economia e da administração pública, mesmo os sérios, são luxos para quem já tem o principal resolvido, e aqui, como no resto do planeta, é meio grau mais para a direita ou meio grau mais para a esquerda ou você cai no caos, como nós caímos. Por isso nem os mais patéticos entre os candidatos patéticos que tomaram nosso tempo nos debates conseguiram inventar coisa muito diferente nessa matéria.

Na falta de melhor tudo passou, então, a girar em torno da corrupção. Mas também o combate à corrupção está corrompido. Todo mundo sabe que existe uma diferença e todo mundo sabe que diferença é essa, mas é impossível traduzi-la numa tipificação jurídica. É por isso que nas democracias dignas do nome só quem elege tem o poder de deseleger e, então, entregar o ladrão à Justiça comum, que é igual para todos. Se for só juiz – e ainda por cima intocável – a controlar essa porteira, mais bandido municiando a imprensa para atingir outro bandido em disputas pelo controle de “bocas”, vira o Brasil…

O 2.º turno permitirá que o País se interrogue sobre onde é que vai parar o governo que promete começar revogando todo o Poder Judiciário que prende ladrão que resta, soltando Lula da cadeia, para ficarmos só com aquele que só solta, criado por ele, e que já vive anulando “monocraticamente” votações do Congresso Nacional inteiro.

Como faremos para que cada Poder da República volte aos seus limites? Que limites são esses, que nós já nem lembramos? Quem poderá restabelecê-los depois do estrago feito pelo lulismo? E como fazer isso com o próximo governo instalando-se à sombra do vulcão de um déficit explosivo por baixo da espada do crime de responsabilidade e sob a sede de vingança da seita que pediu impeachment de todos os governos desde a redemocratização, menos o seu próprio?

Tirar o lulismo do caminho é a condição para essa conversa começar. Mas o Brasil que sangra vai precisar da união de todo o campo democrático – o da esquerda inclusive – para sair dessa enrascada.

10/10/2018

Dia 2 – Bolsonaro e Haddad ou mentem ou se desmentem.

3 Comentários para “Crônica da eleição do horror (3)”

  1. Eu vou votar nulo pela primeira vez para presidente, o PT vai me obrigar a isso. Pois mais do que pelo #elenão, eu sou pelo #eleSnão. Nada nem ninguém vai me fazer votar no PT. Jamais.

  2. Fiquei uns segundos olhando pra foto do Haddad com a Manuela, e pela primeira vez notei que os dois são super boa pinta. Pena que por dentro sejam super mal intencionados, ao contrário do que pregam. Que tristeza.

    E essa jogada de marketing do PT, mudando de roupa, de cor de bandeira e etc? Palhaçada, hein?! Será que mudaram também aquele slogan horrível, de tremendo mau gosto, dizendo que “Haddad é Lula”?

    Cara, eles não pensam. Se a pessoa é antipetista, por consequência não gosta do molusco; e eles acharam que conseguiriam votos assim? Eu jamais vou votar em alguém que representa o chefe da quadrilha. Peloamorrr!

    Sabe o que li esses dias no Twitter? Uma jovem dizendo que ninguém vê o voto do outro. E que se a pessoa votar 13, mesmo a contragosto, ninguém vai saber. Ahh, isso é argumento pra tentar convencer alguém que não quer votar neles? Que manobra a pessoa fez no pensamento para escrever algo assim?

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