As voltas que a política dá

O Centrão, que vinha sendo disputado pelas principais candidaturas, à exceção de Marina Silva, desequilibrou a balança favoravelmente ao tucano, em termos de tempo televisivo, palanques regionais e capilaridade pelo país afora. Convenhamos, não é pouca coisa. Sobretudo porque Alckmin se coloca bem na televisão – exemplo disto foi sua recente ida ao programa Roda Viva da TV Cultura.

Há muita dor de cotovelo e hipocrisia nas críticas ao tucano por ter se composto com esse bloco. Ciro estava disposto a vender a alma ao diabo para tê-lo em seu palanque. O PR de Valdemar Costa Neto foi namorado por Lula e Jair Bolsonaro. O caudilho também queria o PP.

Uma por uma, verdades absolutas vão sendo derrubadas. O consenso de que Alckmin não oferecia expectativa de poder acaba de cair por terra.

Não foi pelos belos olhos do tucano que Valdemar Costa Neto fez um giro de 180 graus em sua política de alianças e levou de roldão os outros partidos do Centrão. O patrono do PR não é dado a apostar em cavalo perdedor.

Outro axioma também vai de água abaixo. Dava-se como favas contadas o fim da polarização PT x PSDB. Pode não ser bem assim. De um lado, os tucanos se fortaleceram, enquanto Bolsonaro está mais isolado do que Robson Crusoé numa ilha deserta. De outro, Lula de alguma forma estará na urna eletrônica. Ou ele ou um preposto. Não se subestime seu potencial de transferência de votos.

Enfim, as peças se moveram no tabuleiro e o maior prejudicado foi Ciro, talvez o melhor cabo eleitoral de Geraldo para conquistar o apoio dos partidos do chamado centro democrático. O presidenciável do PDT sai chamuscado pela direita e pela esquerda. Moldou seu discurso conforme o aliado de plantão, se desfigurou e deixou de ser confiável aos dois lados. Seu destempero verbal lembra a música de Baby Consuelo “O mal é o que sai da boca do homem”.

A possibilidade é que desidrate quando ficar claro quem será o substituto de Lula. Teoricamente a resposta da esquerda ao movimento de Geraldo seria fazer algo semelhante em seu campo. Essa possibilidade esbarra na figura de Ciro, a quem Lula e o PT consideram o maior obstáculo para uma “frente de esquerda”.

Correndo por fora, Marina aposta na “aliança com a sociedade”. Sua estratégia só dará certo se a repulsa hoje expressa nos altos índices de abstenção e voto nulo apontados pelas pesquisas se deslocarem para ela. Como conseguir isso com apenas oito segundos de tempo de TV e sem palanques regionais é algo que a ciência política ainda não conseguiu explicar. Para seu azar, a velha política está mais forte do que nunca e o espaço para renovação é tênue. As regras do jogo impedem isso.

A política por aqui continua sendo coisa para profissionais. E ainda pode dar muitas voltas até a eleição.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, na Veja, em 25/7/2018. 

 

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