Quem será o nosso Silvio Berlusconi?

Foi a primeira pergunta que me veio à mente depois de saber que Renan Calheiros quer votar com urgência um projeto de lei sobre abuso de autoridade que jaz nas gavetas do Senado Federal desde 2011, mas que hoje adquiriu urgência urgentíssima!

Copio de O Globo: “O projeto enquadra autoridades como delegados, promotores,  juízes,  desembargadores e ministros de tribunais superiores. O texto atualiza a lei de 1965”.

Se esse projeto de lei for votado, francamente, nós brasileiros mereceremos o título de campeões da parvoíce. Será que não aprendemos nada com o que se passou na Itália, quando aquele país conseguiu limpar suas arcas, quebrar as correntes da corrupção que o afligia, mostrar ao povo as maldades de que era vítima, mas não pode impedir que seu Parlamento votasse leis que repudiavam todo o trabalho do Ministério Público em favor da permanência do erro, do roubo, das fraudes, dos laranjas, das mãos sujas?

Diz o presidente do nosso Senado que nada disso tem a ver com a Operação Lava-Jato, que atende, isso sim, um grande empenho de alguns ministros do Supremo Tribunal Federal, citando inclusive Gilmar Mendes como um deles, e de muitos advogados.

Pode ser. Tudo pode ser. Pode até parecer mas não ser. Mas que parece muito com as leis que foram votadas no Parlamento italiano e que acabaram por anular as conquistas do Mani Pulite, parece. O que teve um resultado perverso: o poder foi parar nas mãos de Silvio Berlusconi.

“Ninguém vai interferir no curso da Lava-Jato. Essa investigação ela (sic) está caminhando, já quebrou sigilo de muita gente, tem muita gente presa e, a esta altura, há uma pressão muito grande da sociedade, no sentido de que essas coisas todas se esclareçam”, declarou Renan. (Essa pressão inexiste na planície. Aqui o que queremos é Toda A Força À Operação Lava-Jato).

Entre outras coisas, o projeto fala que é crime de abuso de autoridade submeter o preso ao uso de algemas. Isso já foi resolvido: só vejo presos com as mãos para trás, mas sem algemas. O respeito que eles não demonstraram pelo Brasil, nós demonstramos por eles!

Outro item: ‘cumprir um mandado com autorização judicial na casa do investigado de forma vexatória’.  O que será que isso quer dizer? Deveria a PF enviar um e-mail pedindo ao distinto que permitisse que sua casa fosse visitada e nela se fizessem buscas de documentos comprobatórios de suas atividades lícitas ou ilícitas?  Sem esquecer de marcar dia e hora e de pedir Por Favor?

Será que isso não tem nada a ver com a busca e apreensão na residência do ex-ministro Paulo Bernardo que, por ser casado com uma senadora, vive em um apartamento funcional de uma detentora de foro privilegiado? Será que é preciso frisar que quem tem o privilégio desse foro especial é a senadora e não o seu apartamento?

E os grampos telefônicos avisados a priori surtiriam algum efeito? Custo a crer. E você, acredita em fadas e duendes?

Esse projeto de lei é um verdadeiro espanto! O Brasil tem uma quantidade brutal de problemas, nenhum deles mereceu a etiqueta de urgente. O que incomodou mais foi o uso, já de há muito desprezado, da força da Autoridade, do respeito às Leis e ao Poder que sabe exercer seu poder.

Se essa lei for ‘atualizada’, nós, que já estamos mal de vida, ficaremos cada vez mais arrebentados.

E aí, não vai haver quem impeça um Berlusconi de se aboletar no Planalto!

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 1º/7/2016. 

3 Comentários para “Quem será o nosso Silvio Berlusconi?”

  1. Caiu a ficha.
    Os apoiadores do golpe agora revelam seu medo de Temer, Cunha, Renan, Aécio e Serra.

    Existe uma esperança em agosto de 2016 com a volta de Dilma, manutenção da LavaJato, plebiscito, reforma política, e eleições limpas em 2018.

    Vamos participar.

  2. O balanço da semana traz uma lição interessante para entender como a mídia tradicional carrega a opinião do público para lá e para cá, conforme suas conveniências.

    Comecemos pela pesquisa IBOPE sobre a popularidade do vice-presidente em exercício enterino do poder executivo: os chamados jornais de circulação nacional trazem comentários sobre a baixa aprovação do sr. Temer, e comparam com a última avaliação da presidente constitucional, Dilma Rousseff.

    Mas há um elemento que a imprensa conservadora omite: as avaliações da sra. Rousseff foram feitas sob o bombardeio incessante da própria mídia hegemônica, e as consultas foram cuidadosamente planejadas para a coleta de opiniões mostrar a influência do noticiário negativo sobre a sua imagem.

    No caso do vice-presidente em cargo provisório, há, ao contrário, uma indisfarçável tentativa de poupá-lo da enxurrada de acusações que atingem seus parceiros de golpe, o presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, e o presidente sempre oscilante do Senado, Renan Calheiros.

    No entanto, os cuidados da imprensa não conseguem esconder o fato de que a aliança que tomou o poder com o afastamento da presidente representa o que há de pior na política nacional.

    O caso do sr. Cunha já ultrapassou todos os limites do aceitável, e até mesmo o sombrio ministro Gilmar Mendes, figura destoante entre seus pares do Supremo Tribunal Federal pela ambiguidade de suas posições, tem evitado sair em sua defesa.

    Mendes não se furta, porém, de justificar a tentativa do presidente do Senado de desengavetar um projeto de lei de 2009 que, na prática, coloca empecilhos a investigações de políticos, empresários e outras figuras de proa da nossa sociedade.

    Com essa manobra, Renan Calheiros claramente busca legislar em causa própria, uma vez que as recentes revelações garimpadas nas delações premiadas da Operação Lava-Jato apontam para seu nome.

    Também seria beneficiado o presidente da Câmara: Eduardo Cunha está sendo acusado de ser destinatário de 80% dos recursos desviados do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, por meio de um esquema que agia na Caixa Econômica Federal.

    Nem mesmo o mais perfeito entre os midiotas deve acreditar, a esta altura, que o afastamento da presidente Rousseff resolveria a crise política que se instalou logo após a eleição de 2014.

    Mas o grupo no poder não parece preocupado com a questão da governança: a confusão reinante ajuda a passar certa agenda perigosa sem que a sociedade brasileira seja consultada a seu respeito.

    Enquanto a mídia espalha fumaça, o crime organizado se move nos bastidores do Congresso: por exemplo, está para ser votado em comissão especial da Câmara dos Deputados um projeto que libera os jogos de azar, extingue todos os processos judiciais contra bicheiros e agentes da máfia da jogatina e anistia todos os que foram acusados pela operação clandestina de bingos e cassinos.

    O presidente do Senado manifesta interesse em apressar o trâmite desse trambique, mas adivinhe quem tem longa e amistosa relação com os bicheiros? – Ninguém menos que o vice-presidente em exercício. Desde pelo menos 1985, o sr. Temer tem se manifestado a favor da liberação do jogo, e atuou como advogado na defesa dos empresários do azar.

    Seria muito esperar que o midiota faça a ligação de lé com cré?

  3. Acreditar que o jornalismo privado é o espaço de total liberdade e de legítima defesa do interesse público em diferentes momentos históricos assume uma face ditatorial.

    Está colocado, mesmo que de forma implícita, que um tipo de controle é necessário mesmo que também possa vir a se manifestar em atos de censura aos jornalistas.

    A omissão debates caros ao interesse público, pela imprensa privada e de acordo com seus próprios interesses é também uma censura aos jornalistas., calcada no interesse primordial da grande mídia de sempre manter a sua condição objetiva, de um negócio que precisa lucrar.
    As ações que visam o desmonte da EBC (Empresa Brasil de Comunicação) tomadas pelo presidente interino Michel Temer desde que assumiu de forma ilegítima o governo demonstram a fragilidade do jornalismo público no país e reforçam a necessidade que o mesmo seja desvinculado de vez do poder executivo.
    A liberdade ao livre exercício dos jornalistas trata-se de uma bandeira que poucos parecem dispostos a levantar. Jornalismo saudável, instituições públicas ou privadas que funcionem caminham sempre juntas e na mesma direção. Há de se lutar por ambas.

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