O pecado e a mulher jovem

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Raymond Chandler foi virgem até aos 32 anos. É sabido que o virgem tardio reverencia a mulher mais velha. Chandler entregou o seu puro ceptro a uma mulher de 50 anos. Raymond conhecia tudo da vida, a violência doméstica, a universidade, o poema, a guerra, o trabalho de contabilista, menos uma coisa, a mulher nua.

Adianto-me na história e aviso que, aos 44 anos, Chandler descobrirá a mulher jovem. Escrevo isto não apenas em memória dele, mas também para que se saiba donde vem a galanteria com que, em The Big Sleep, Humphrey Bogart derrete Lauren Bacall, Dorothy Malone e o sensível espectador que sou.

A violência do casamento dos pais atirou Chandler para a castidade. Engenheiro civil, o pai, talvez por também ser bêbado, espancava a mãe, cobrindo-a de nódoas e negras dores. Chandler converteu-se num Galahad, protector da flor feminina. A mãe fugiu e levou com ela, para Londres, os 12 anos de Chandler.

Voltou à América, educadíssimo, e apaixonou-se pela melhor amiga da mãe, Cissy Pascal, madrasta do amigo com quem combateu na I Guerra. Chandler tinha 31 anos, ela 49 e um marido. Era modelo, também pianista, cabelo mais vermelho do que a amada camisola do Glorioso. Posara nua e umas selvagens festas de ópio não lhe eram alheias. E deixo cair aqui o pormenor que explica mais e melhor a personagem de Bogart e toda a mitologia macha do “film noir”, que Raymond Chandler inventou, escrevendo para Billy Wilder o guião de Double Indemnity: Cissy Pascal gostava de passar a ferro e de aspirar a casa toda nua.

Quando pela primeira vez Cissy passou a ferro e aspirou o nosso inocente herói, já ele tinha 32 anos. Ela largou o marido, concertista, deixando-o a tocar piano sozinho, mas não pôde casar com Chandler, porque a extremosa mãe, em fúria, proibiu. Tiveram de esperar que morresse, quatro anos depois.

Mas aqui está o que interessa, o puro Raymond Chandler olhava para Cissy, para os 50 anos do seu sumptuoso corpo, e era como se visse um santuário. Pecou, sete anos depois, ao descobrir, na secretária, a mulher jovem. Reparem, até aí, mal tinha escrito uma linha, e era vice-presidente de uma petrolífera. Encontrada a perna lábil, fresca e macia, sem nunca deixar a sagrada Cissy, foi um mar de infidelidade, álcool, sete romances policiais a roçar a obra-prima, alguns guiões. Digo: ou há pecado ou não há arte.

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Este artigo foi originalmente publicado no semanário português O Expresso.

manuel.s.phonseca@gmail.com

Manuel S. Fonseca escreve de acordo com a antiga ortografia.

Um comentário para “O pecado e a mulher jovem”

  1. Que texto chato, português chato, cheio de redundâncias e palavras arcaicas. Desisti no primeiro parágrafo

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